Dancinhas e Challenges – Como a Inteligência Artificial transformará o consumo

Como vencer os gigantes? Invente um jogo em que você é melhor que eles. É exatamente isso que a ByteDance está fazendo com o seu produto mais popular, o TikTok, e agora passa a abrir o seu ecossistema vendendo seu algoritmo de recomendações para outras empresas.

Dancinhas e Challenges - Como a Inteligência Artificial transformará o consumo - Como vencer os gigantes? Invente um jogo em que você é melhor que eles. É exatamente isso que a Bytedance está fazendo com o seu produto mais popular, o TikTok

Dominando o mundo, um vídeo de 30 segundos por vez

Os números da ByteDance e da sua rede social TikTok impressionam. A empresa anunciou recentemente que tem mais de 1 bilhão de usuários globalmente (contra 700 milhões no final de 2020). Antes que gigantes do setor percebessem a real ameaça da empresa, o TikTok acelerava sua penetração nos mercados ocidentais com seus vídeos curtos, challenges, trends e dancinhas.

A empresa ainda não tem capital aberto, portanto o seu valor de mercado é calculado com base no valor pago pelos investidores em rodadas fechadas de captação de recursos. Na última rodada de avaliação da empresa, que aconteceu em março de 2021, ela já valia US$ 250 bilhões, e há rumores que indicam que ela já se aproxima de US$ 425 bilhões de valor para a próxima rodada. Sim, você leu certo: o TikTok já vale mais que a maior varejista do mundo em vendas, o Walmart, com valor de mercado de US$ 400 bilhões em setembro de 2021.

No mercado norte-americano, o TikTok explodiu e conquistou estimados 79 milhões de usuários e já se aproxima dos líderes de mercado Snapchat, com 87 milhões de usuários, e Instagram, com 119 milhões.

Entretanto, entre os usuários mais jovens da geração Z, o Tiktok já ameaça até mesmo o gigante Facebook/Instagram (gráfico abaixo) e provocou uma onda de reações desses aplicativos com o lançamento de funcionalidades que copiam a plataforma chinesa. No Instagram foi lançado o Reels; no YouTube, o Shorts.

A empresa tem investido forte para expandir sua operação na América Latina, especialmente no Brasil. É quase impossível acessar a internet e não ser impactado por um dos anúncios da companhia. O resultado já se apresenta com um crescimento acelerado de usuários no Brasil, que já passam de 39 milhões.

A ByteDance é reconhecida pelo mercado por ser mais do que uma empresa de redes sociais. Ela tenta se posicionar como uma plataforma de tecnologia, Inteligência Artificial e analytics, sendo que um dos grandes motores de crescimento do TikTok é exatamente seu algoritmo de recomendação de vídeos customizada para cada usuário.

Enquanto Facebook/Instagram ancoram a experiência do usuário nos seus amigos ou pessoas do seu interesse, o TikTok mostra ao usuário que usa a plataforma pela primeira vez a plataforma vídeos aleatórios e usa seu algoritmo para modelar o seu comportamento determinando qual perfil de vídeo e qual conteúdo o deixa mais engajado no aplicativo. Dessa forma, a empresa é extremamente eficiente em reconhecer padrões e tendências em seus estágios iniciais. E é aqui que nasce a BytePlus.

O que é a BytePlus

Conforme antecipado pelo Financial Times em julho de 2021, a ByteDance passou a vender sua tecnologia de Inteligência Artificial para empresas de diversos segmentos fora da China, em um claro movimento de expansão das suas fontes de receita e possível preparação para uma futura abertura de capital.

A operação chamada BytePlus foi lançada oficialmente sem alarde em junho e, como anunciado em sua página oficial, promete aos seus clientes B2B acesso à sua inovadora tecnologia de recomendação 1:1, ferramentas de data analytics e de testagem em tempo real, bem como acesso a funcionalidades relacionadas a experiência do usuário, como algoritmos para implantação de efeitos especiais, análise de imagem, tradução e voice over.

Com a promessa de um processo de setup simples, empresas de inúmeros segmentos que não desenvolveram tais competências poderiam ter acesso a uma das ferramentas mais desenvolvidas do mundo em recomendação e análise de comportamento de usuários.

Os casos de uso são diversos e evidenciados pela ByteDance no seu site. Os principais são o uso por varejistas para recomendar produtos e customizar experiências de compra, apoiar agências em insights e ajustar targets de comunicação, dar recomendações individualizadas no setor de hospitalidade e, para empresas de mídia, a predição e personalização de conteúdo para seus consumidores.

O site também anuncia os resultados da aplicação em clientes de diversas indústrias como WeGo (empresa digital de booking de viagens), Goat (varejista norte-americana online no segmento de moda), webuy (startup varejista com sede na Indonésia), Chilibeli (empresa da Indonésia que opera no modelo de group buying), entre outros.

Acessar um algoritmo poderoso como o do TikTok, desenhado para manter os usuários engajados e conectados na plataforma, parece ser um ativo importantíssimo, ainda mais considerando a explosão e crescimento vertiginoso de empresas como a Pinduoduo, que unem compras com entretenimento e descoberta (a Pinduoduo é reconhecida por ter um modelo que une preços baixos da Costco com o entretenimento proporcionado pela Disney – leia mais sobre eles neste artigo aqui). Ou seja: as empresas varejistas e de consumo que não tiverem essa tecnologia (ou não a tiverem integrado) podem perder relevância rapidamente.

Visão de ecossistema e abertura para o mercado

O modelo de negócios dos ecossistemas é integrar para crescer mais rápido por meio das possibilidades de conexão de competências. Dessa forma, os maiores ecossistemas de consumo do mundo continuam se abrindo ao mercado (incluindo concorrentes) e aceleram sua estratégia de entrar no varejo tradicional. Vendendo seu know-how para terceiros, eles passam a ser provedores de soluções, fornecedores de tecnologia e de infraestrutura para o mercado.

A nova operação do TikTok compete diretamente com outros gigantes de tecnologia, como IBM, Google, Microsoft e ecossistemas como Alibaba, Tencent e a Amazon. Hoje, apenas 15% das receitas da Amazon são decorrentes da AWS (operação de venda de serviços na nuvem), mas o serviço contribui com incríveis 60% do resultado da companhia.

No mercado brasileiro não é diferente. O Magazine Luiza anunciou em 2020 que pretende ser o “sistema operacional do varejo brasileiro” e passará a oferecer suas soluções para os varejistas de todo o País. A Via (antiga Via Varejo) também anunciou que oferecerá sua estrutura logística para concorrentes, assim como o Mercado Livre, que fechou parceira com o GPA para vender os produtos da companhia por meio da sua plataforma e rede de distribuição.

Esses movimentos marcam uma nova era do consumo, em que grandes varejistas tradicionais deixarão de ser empresas de compra e venda de mercadoria e se transformarão em empresas de soluções de tecnologia e infraestrutura, reconfigurando, assim, a dinâmica de mercado do consumo e do varejo globalmente.

Eduardo Yamashita é COO da Gouvêa Ecosystem
Imagens: Shutterstock

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