Por Eduardo Gerchman*
Para os consumidores, crises econômicas são como os tombos de bicicleta da infância: quanto maiores, mais cicatrizes deixam. Recessões tidas como curtas, de até dois anos de duração, costumam gerar comportamentos adaptativos nos lares. Substitui-se uma marca por outra, reduzem-se as despesas com alguns supérfluos e…voilá!
Aos primeiros sinais de que os bons ventos estão soprando novamente, os padrões de consumo tradicionais vão sendo reestabelecidos e as cicatrizes da tormenta, sumindo. Já as crises maiores, superiores a vinte e quatro meses, lançam uma camada de pessimismo sobre toda a sociedade e, por isso, são mais difíceis de serem superadas e esquecidas. Acabam por gerar nas famílias hábitos de consumo mais austeros, e as trocas de marcas, produtos ou modelos, que em momentos de desaceleração econômica branda costumam ter data para acabar, tendem a ser incorporadas à rotina, tais quais cicatrizes que carregamos para sempre.
Ainda não sabemos se a crise brasileira atual é do primeiro ou do segundo tipo. Sabemos, somente, que o consumidor já dá sinais claros de que trocou a desconfiança com os rumos da economia, expressa ao longo do ano passado, por uma postura de cautela, em que ajusta o orçamento doméstico e coloca os planos de longo-prazo em stand by. Nesse cenário, merece atenção o conceito de value-for-money, o nosso conhecido “custo-benefício”. Produtos incapazes de justificar preços mais altos através de uma superioridade funcional facilmente perceptível – como durabilidade ou maior rendimento – são os mais sujeitos à rejeição nos lares. Numa hora como a atual, preço e diferenciais concretos são os atributos que acabam por definir a compra, e apelos como “experiência de marca”, “status” etc, acabam em muitos casos ignorados pelo consumidor médio.
Já para os varejistas, crises são como temporais, destes que nos pegam na rua, em uma hora qualquer. Todo mundo se molha, mas quem tem um guarda-chuva maior acaba menos atingido. E alguns resultados recentemente divulgados têm mostrado vários varejistas de peso saindo de roupa quase seca da chuvarada atual. Por quê? Para nós, da GS&WB, três fatores explicam esse desempenho:
O primeiro são os bons fundamentos de gestão. Varejistas permanentemente antenados às preferências dos consumidores, atentos à gestão de estoques e ao corte de custos costumam chegar mais protegidos aos temporais da crise.
O segundo é o alinhamento do negócio a alguma tendência de fundo, ou seja, a algum fator do macroambiente que torna seu produto ou serviço principal indispensável – como o envelhecimento da população, que ajuda a manter em alta o faturamento das farmácias, ou a preocupação com a forma física, que sustenta as redes de material esportivo.
O terceiro e último é a capilaridade. A crise é uma tempestade que atinge todos os bairros de uma cidade, mas nunca com igual intensidade. Dessa forma, uma rede de lojas espalhadas por diferentes regiões e estados funciona como um colchão nos maus momentos – o desempenho em uma praça compensa o da outra.
No mais, seja qual for a melhor imagem que traduz sua situação atual – a da cicatriz, a do temporal ou ambas -, o importante é estar preparado para enfrentar a recessão. E, se possível, fazer como um empresário que, quando perguntado sobre a crise, afirmou categoricamente: “decidi não fazer parte dela”.
*Eduardo Gerchman (eduardo@gsbw.com.br) é sócio-diretor da GS&BW