A pauta ESG, sigla em inglês para “meio ambiente, social e governança”, está cada vez mais latente na sociedade e, consequentemente, gera impactos em diversas áreas de negócios, como o varejo. A forma como o setor está lidando com o assunto foi debatida durante o “Fórum BandNews: ESG no varejo”, evento realizado nesta semana pela rede de rádios em parceria com a Federação do Comércio do Estado de São Paulo (FecomercioSP).
A editora-chefe do portal Mercado&Consumo e colunista da rádio, Aiana Freitas, foi convidada para mediar o debate. Ao seu lado esteve Sheila Magalhães, editora-executiva de jornalismo da BandNews FM.
Apesar de os temas relacionados ao ESG não serem novos, o entendimento deles é recente para o varejo. A CFO da 99 Jobs e integrante dos conselhos do Instituto Inhotim e da WCD-Brazil, Jandaraci Araújo, explicou que eles entraram no foco mesmo nos últimos dez anos.
“É muito importante falar que ESG é uma jornada. Todas as empresas começaram a falar muito mais sobre o tema recentemente. Antes disso nós tínhamos áreas específicas que cuidavam de pilares de forma separada, não necessariamente com uma análise conjunta de todos os pilares como vemos hoje”, completou.
Comportamento do consumidor
A adoção de medidas ESG passa também por querer acompanhar a mudança do comportamento dos consumidores. Hoje, eles se importam com as práticas das marcas que consomem e querem saber, por exemplo, se os produtos vendidos são sustentáveis.
Estudo divulgado durante NRF deste ano, principal evento de varejo do mundo, mostrou que 63% dos entrevistados disseram que sustentabilidade é um tópico essencial para que eles decidam de qual varejista comprar.
“As gerações Y e a Z são as que efetivamente cobram por empresas que tenham propósito e que não apenas ofereçam seus produtos. Elas querem companhias que estejam fazendo a diferença para a sociedade”, destacou Valéria Café, membro do comitê de ESG da FecomercioSP.
Marcel Fukayama, cofundador do Sistema B Brasil, ressaltou que aderir a tais práticas gera impacto com um enorme potencial para atrair investidores. “O mercado de capitais está passando por uma profunda e estrutural reestruturação. A pandemia acentuou essas mudanças. E os compromissos globais, como o Acordo de Paris e a agenda 2030 da ONU, impulsionam o mercado e a mudança”, complementou.
Fukayama ainda alerta que o ESG não é para apenas algumas empresas. Ao contrário: aquelas que não aderirem correm sérios riscos. “Estão condenadas a deixar de existir. A perder valor para a sociedade, para as pessoas, para o planeta e para o mercado”, disse.
Questionada sobre o momento pelo qual o varejo e a indústria da moda do Brasil estão passando, Valéria citou algumas práticas positivas, mas ressaltou que elas ainda não são suficientes. “Na prática, nós temos visto pequenas mudanças, mas não tão grandes quanto a gente deveria”, finalizou Valéria.
O impacto da pandemia
Os executivos foram enfáticos em citar as transformações causadas pela pandemia. “A pandemia escancarou uma desigualdade que já era latente. Estamos falando de um abismo que foi revelado. Isso não ocorreu em 2020, mas se acentuou em 2020”, disse Jandaraci. Para ela, as redes sociais também foram responsáveis pelo impacto dessas pautas durante o período.
“O mundo parou e todas as pessoas entenderam que não é só o papel do governo ou da instituição privada. É todo mundo junto, fazendo um processo de transformação para tornar o ambiente melhor – incluindo o ambiente de negócios”, completou Jandaraci.
Fukayama concordou que o período evidenciou falhas sociais e ambientais. “Durante a pandemia, o mundo viu a cada 26 horas um novo bilionário. Enquanto isso, o Brasil viu 33 milhões de brasileiros passarem fome. Isso tudo evidencia falhas estruturais”, destacou.
O executivo também explicou que, ao mesmo tempo, o período foi um grande convite para o planeta e para a sociedade, lideranças globais, públicas e empresariais se mobilizarem em torno desses desafios.
Liderança e diversidade
Como parte fundamental da sigla ESG, a governança é um dos pilares que precisam mudar e se movimentar para que os demais também possam progredir. “Não dá para gente achar que uma empresa vai mudar se não falarmos em mudar quem está tomando a decisão. Ter mais pessoas com mindsets e backgrounds diferentes – e diversidade, especificamente”, disse Jandaraci.
A executiva ainda destacou o risco de o greenwashing. O termo em inglês se refere à prática de promover discursos, ações e propagandas sobre sustentabilidade, mas pouco fazer na prática. “É o que a gente vê sempre: ‘Vamos avançar na pauta ambiental ou no impacto social’. Mas no primeiro momento de crise, a empresa retorna ao normal porque é o mindset e o modelo dos gestores que estão ali”, explicou Jandaraci.
Jandaraci se definiu como um case “improvável”: ela faz parte do 0,4% de mulheres negras que ocupam posições de liderança em empresas e conselhos. Ela ainda definiu o Brasil como o país da “minorização da maioria”, visto que mulheres e negros são maioria na população, mas estes números não são reproduzidos nos cargos de liderança.
“A história da Jandaraci, é a história de milhares de mulheres no Brasil. O que me diferencia delas é a oportunidade. É efetivamente as empresas entenderem que uma pessoa com essa trajetória pode agregar dentro de uma organização”, finalizou.
Imagem: Marcelo Audinino