A Amazon vendeu no passado 28% do que vendeu o Walmart com suas mais de 11 mil lojas em 27 países com mais de 2,2 milhões de funcionários, uma população maior do que muitos países do mundo. Apesar de ter começado a dar lucro apenas há 2 anos, na última semana de setembro, a Amazon valia US$ 462,5 bilhões (no conceito Market Value), enquanto o Walmart, na mesma data, estava avaliado em US$ 235 bilhões.
Como referência é importante considerar que o Alibaba, uma empresa de apenas 18 anos operando especialmente nos mercados asiáticos, valia neste final de setembro US$ 437,6 bi. Estima-se que Ali Express, braço da Alibaba, já esteja faturando no Brasil mais do que R$ 1 bilhão.
A evolução do Market Value de algumas organizações de varejo nos últimos anos é significativamente relevante para ilustrar o dramático processo de transformação do setor.
Comparando o valor de mercado de algumas empresas em 2006 e a sua posição na última semana de setembro, vemos que Sears caiu de US$ 27,8 bi para US$ 800 milhões, com perda de 97%. A JC Penney, antiga controladora da Renner, caiu de US$ 18,1 bi para US$ 1,2, redução de 93%, perda maior do que a Macy’s que caiu de US$ 24,2 bi para US$ 6,8, perda de 72%. A Target, involuiu de US$ 51,3 bi para US$ 32,7 bi, com perda de 36%.
E nem a outrora incensada Best Buy escapou, pois, de um valor de mercado de US$ 28,4 bi em 2006, caiu na última semana de setembro para US$ 17 bi, com redução de 40%.
É sabido que estamos vivendo uma radical transformação no setor pelo avanço do Digital no ambiente de negócios e no comportamento do consumidor.
Mais importante do que discutir o quanto o e-commerce representa do total das vendas no varejo em determinado mercado, é fundamental reconhecer que o impacto do Digital transcende – em muito – o volume de vendas no e-commerce, à medida que seu poder transformador altera todo o ambiente como o conhecíamos.
Mudam as relações entre marcas, fornecedores, varejistas e, principalmente, os omniconsumidores. Muda a importância dos canais de distribuição e de relacionamento. Fica favorecida a desintermediação com os fornecedores chegando direta e rapidamente no consumidor final.
Muda a comunicação de forma geral, em particular a propaganda, a promoção e programas de relacionamento institucional. Altera-se a hierarquia de relavância e importância das fontes de informação.
Disponibilizam-se instrumentos fundamentais de monitoramento, avaliação e projeção de comportamentos futuros, em caráter preditivo, permitindo, ao mesmo tempo, customização do relacionamento.
Esse cenário disruptivo e reconfigurado só consegue ser percebido em toda sua dimensão, amplitude e profundidade, pelas empresas que estão integral e estruturalmente envolvidas com o Digital, vivendo de forma plena essa outra cultura emergente. Não basta ter e-commerce. É preciso ser culturalmente digital. Tão simples de enunciar, tão complexo para transformar.
A Amazon, ao lado de Alibaba, é uma empresa digital que atua em diversas frentes de negócios, incluindo lojas, serviços, operações financeiras, market place e e-commerce.
Tanto quanto Magazine Luiza que, de uma rede de varejo que operava no digital, se reposicionou para se tornar uma empresa digital que também opera lojas, como explicou o CEO Frederico Trajano em sua apresentação no Latam Retail Show.
É uma simples diferença conceitual que faz toda a diferença na cultura, na organização, na estrutura, na atitude da empresa e seus colaboradores. E, principalmente, nos resultados, como pode ser sinalizado pela evolução do valor da ação ON da empresa que em 2017 valorizou 422,6%.
Enquanto isso, o Walmart, maior varejista global, com vendas em 2016 de US$ 485,9 bi, com relevante crescimento em muitos mercados, mantém as atividades do varejo tradicional e do digital segmentadas, com reportes dissociados, como se atendessem diferentes consumidores, esquecendo que o omniconsumidor – mente, bolso e coração –, é único e usa todos os instrumentos disponíveis para comparar e avaliar tudo, continuadamente.
No passado, podia fazer algum sentido a segmentação, também praticada pelo Pão de Açúcar e Carrefour no Brasil e por muitas outras organizações globais de varejo, com a ideia de que cultura, processos, organização e estrutura do mundo digital tinham particularidades que exigiam sua segmentação para não perder tração e poder evoluir mais rapidamente, sem riscos de conflitos com a estrutura tradicional.
Porém, no processo evolutivo do omniconsumidor essas questões ficaram superadas sendo fundamental contaminar as estruturas tradicionais com a lógica digital, sem o que estará rapidamente defasada com perdas para todo o negócio, e não apenas para o tradicional.
Isso é uma parte das diferenças de percepção do mercado em relação ao posicionamento futuro das corporações globais de varejo e, também, para todas aquelas empresas e organizações que gravitam em torno do ecossistema de distribuição de produtos e serviços.
Isso explica muito, mas não tudo.
A cultura digital cria organizações mais flexíveis, ágeis, pró-ativas e focadas no mercado e no omniconsumidor de forma muito mais natural do que outras que tentam se transformar para se adaptarem à realidade. As organizações digitais, em tempos de economia volátil, criam a nova realidade e não precisam se adaptar a ela.
E isso completa a análise das razões das diferenças que são geradas pelo valor de mercado e seu comportamento futuro, sinalizando o quanto de reflexão estratégica cabe ser feita por todas as empresas neste momento. A diferença entre construir a realidade ou se adaptar a ela em tempos voláteis.