O início de 2024 do foodservice brasileiro e expectativas

O primeiro trimestre de 2024 traz sinais contraditórios para a economia brasileira. Por um lado, serviços e comércio não pegam a tração desejada para um crescimento mais consistente. O alto endividamento das famílias continua a ser uma barreira forte para o consumo. Sinais negativos em relação à política fiscal pressionam as expectativas de juros e de inflação, que são afetadas também pela taxa de câmbio, que é influenciada pelo cenário externo complexo, com guerras, eleições presidenciais e expectativas para a economia dos Estados Unidos.

Por outro lado, o rendimento médio real da população está crescendo, ainda que o acumulado ao longo dos últimos 12 anos seja baixo. O desemprego segue em patamares historicamente baixos, a população ocupada bate recordes no País e a inflação ainda segue controlada.

Em meio a esse cenário, o foodservice apresentou fraco crescimento no primeiro trimestre de 2024. O gasto aumentou 1% em relação ao mesmo período de 2023, atingindo a marca de R$ 49,7 bilhões – o maior patamar para este período do ano desde 2020. Já o tráfego teve queda de 2%, contabilizando 2,5 bilhões de transações, o que reforça o desafio ainda presente de trazer mais consumidores para restaurantes e demais canais do setor.

O ticket médio atingiu R$ 19,92, seu maior nível histórico. Ao lado do tráfego, preços e ticket se colocam como desafios que podem barrar o potencial de crescimento do setor, tendo em vista que as famílias ainda mantêm seu consumo retraído.

Além do ticket médio mais pressionado, a cesta de consumo diminuiu. Ou seja, por conta do aumento dos preços e do ticket, as pessoas estão consumindo menos itens, e pagando mais caro por eles, em média. O foodservice perde competitividade e torna-se menos atrativo para o consumidor. De acordo com a 4ª edição do Tomorrow’s Consumer, estudo proprietário da Mosaiclab, lançado em 2023, 66% dos consumidores reduziram seu consumo no foodservice por corte de gastos no orçamento familiar – possível reflexo dos preços e de decisões do dia a dia.

Existem mais pontos de atenção para operadores e os demais elos da cadeia do setor: o Brasil ainda é um país de baixa renda. De acordo com a Abep (Associação Brasileira das Empresas de Pesquisas), utilizando dados da POF (Pesquisa de Orçamentos Familiares), do IBGE de 2022, 51% da população brasileira fazem parte das classes D e E, cuja renda média domiciliar é de até R$ 2,9 mil. Ao mesmo tempo, essas classes sociais têm uma penetração muito baixa no foodservice. Ou seja, mais da metade da população brasileira consomem muito pouco no setor, reduzindo de forma crítica seu crescimento potencial de consumo.

Em artigo, Cristina Souza, CEO da Gouvêa Foodservice, mostra que há uma rota de evasão do consumo do foodservice para outros setores, como viagens, mercado de apostas, consumo de bens duráveis e não duráveis e pagamento de dívidas. Importante reforçar que o consumidor possui um orçamento único, e faz escolhas ao longo do tempo em relação aos seus gastos.

O início de 2024 trouxe um certo alívio na performance do setor, com queda de tráfego menos intensa do que foi observado ao longo de 2023. E existem expectativas positivas para o crescimento do setor, mas persiste o desafio do fluxo de visitas e há a pressão do ticket médio – um alerta para toda a cadeia de valor, desde a indústria (que fica sujeita às oscilações de preços de commodities e dólar) até os operadores, que precisam repassar os custos no preço final e, ao mesmo tempo, atrair consumidores de volta aos seus canais.

Nota: O Crest é um estudo sindicalizado sobre foodservice, criado e liderado há quase 50 anos pela Circana (antigo The NPD Group) em 12 países, em parceria com a Mosaiclab no Brasil desde 2015. Seu objetivo é entender os hábitos dos diferentes perfis de consumidores em suas visitas a restaurantes, nos diversos segmentos, canais e ocasiões de consumo que compõem o setor.

Eduardo Bueno é head de Pesquisa e Inteligência na Mosaiclab, responsável pela pesquisa Crest no Brasil.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
Imagem: Shutterstock

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