Publicidade e transformação social: se inspire com os exemplos de Cannes

Publicidade e transformação social: se inspire com os exemplos de Cannes

Todos os anos o Festival Cannes Lions, ápice da publicidade e que premia as melhores propagandas do mundo em diferentes categorias, ganha manchetes na imprensa, repercutindo as campanhas mais emocionantes, as mais engraçadas, com melhor storytelling e outros critérios que tocam o público — além de celebrar o lugar privilegiado que o Brasil ocupa no panteão de países mais criativos do mundo, traduzido pelas dezenas de leões trazidos para casa.

Mas é preciso pensar também sobre o que a publicidade diz nas entrelinhas, o quanto ela se conecta com as pautas socioambientais, cada vez mais relevantes e que necessitam de sua força para ganhar um público amplo. Aqui podem caber peças que toquem em questões de diversidade, inclusão, racismo, desigualdade de gênero, mudança climática e tantos outros temas que exigem um debate cada vez mais amplo.

Sempre que anunciam os vencedores do ano, gosto de navegar pela categoria Glass Lion, que completou 10 anos em 2024. Criada em 2015, ela nasceu de uma necessidade urgente de abordar questões de desigualdade de gênero e discriminação. O prêmio é uma resposta à crescente demanda da sociedade por representações mais inclusivas e justas nos meios de comunicação e na publicidade. O objetivo principal é incentivar e reconhecer trabalhos que rompam barreiras e inspirem transformações positivas na sociedade.

Neste ano, o destaque foi a campanha da Unilever para Vaseline, com uma loção hidratante criada especialmente para pessoas em transição de gênero. Com ativos que auxiliam no combate ao ressecamento da pele trazido pela terapia hormonal, o produto foi cocriado com a comunidade transgênero da Tailândia. Esse é um exemplo ilustrativo de como as marcas podem extrapolar a efeméride do junho do orgulho e criar produtos que atendem a comunidade LGBTQIA+ o ano todo, promovendo inclusão duradoura.

O bronze da categoria ficou com uma campanha brasileira, criada para O Boticário, que aborda a questão da licença paternidade obrigatória de cinco dias. O filme acompanha a construção da relação entre um pai e seu bebê recém-nascido durante seus cinco primeiros dias de vida. No sexto dia, ele está de volta ao escritório, em uma ruptura brusca de rotina. A marca demonstra coragem ao tocar em tema que está em discussão no Congresso brasileiro, depois do STF apontar omissão na regulamentação do tema.

À primeira vista, pode parecer que publicidade e transformação social andam em mãos opostas, mas essa impressão precisa ser revista. Essa discussão surgiu no Engage for Good, evento sobre marketing de causa do qual participei em maio. Kelley Robinson, presidente da Campanha de Direitos Humanos (Human Rights Campaign) e pioneira na defesa da igualdade LGBTQ+ e da justiça social, falou sobre a importância de ter grandes marcas como aliadas de causas sociais, ajudando a quebrar tabus em larga escala desde o século passado.

Há muitos bons exemplos de como marcas podem impulsionar transformações sociais profundas e torço para que eles sejam cada vez mais numerosos. Em um mundo pautado por identidades fortes e ativismo crescente, esse é um caminho sem volta para marcas que queiram continuar dialogando com os consumidores e ocupar um lugar de destaque na sociedade.

Roberta Faria é CEO da MOL Impacto.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
Imagem: Shutterstock

Sair da versão mobile