Bets impactam emprego e vendas no comércio e no varejo

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Varejo se movimenta contra bets em Brasília enquanto ainda busca dados conclusivos

O fato aí está e é incontestável. Basta acompanhar a aumento da presença das bets (ou, tecnicamente, AEO – Apostas Esportivas Online) na mídia convencional, na digital, nos patrocínios de times, estádios e competições esportivas para perceber o tamanho desse negócio no Brasil atual e com crescimento explosivo nos últimos anos.

Alguns estudos apontam que o total de apostas já é de R$ 100 bilhões anuais, perto de 1% do PIB com um crescimento de 71% sobre 2020 e com gastos mensais podendo chegar a 20% do orçamento das famílias de baixa renda. E com parte dos benefícios dos programas assistenciais, Bolsa Família/Auxílio Brasil/Auxílio Desemprego, sendo redirecionada para as apostas.

O que pouco tem sido discutido, até por conveniência, é seu impacto no consumo, no comércio e no varejo com queda de vendas e com redução do emprego, pois o total desse valor gasto em apostas é esterilizado sob o ponto de vista de consumo interno, inclusive de alimentos, e migra em parte para o exterior.

Com a regulamentação publicada em dezembro de 2023 haverá aumento de arrecadação, estimada entre 2 e 6 bilhões de reais, algo que para o governo é motivo para a aprovação tácita.

Na mídia convencional ou digital o volume do investimento publicitário é muito bem-vindo e razão para comemoração gerando aumento do custo dos espaços. Em 2024, estima-se que os negócios de apostas online devem representar 3% do investimento publicitário total nas TVs abertas e perto de 20% dos intervalos de eventos e programas esportivos.

Dos clubes da série A no Campeonato Brasileiro de futebol, 75% deles têm seus principais patrocínios dos negócios de apostas.

O Corinthians teve Vai de Bet com investimento de R$ 120 milhões anuais, que seria o maior patrocínio do futebol brasileiro, mas que foi rescindido em junho por conta de situação envolvendo alegados repasses indevidos de valores de comissão pagas. Mas ficou a referência do valor.

O Flamengo tem Pixbet com R$ 85 milhões e o São Paulo com a Superbet com R$ 52 milhões por ano.

Mas também envolve naming rights, como no estádio da Fonte Nova, em Salvador, que foi renomeado para Casa de Apostas Arena Fonte Nova, com investimento de R$ 52 milhões por quatro temporadas.

Além do futebol, o vôlei, de quadra ou praia, o basquete, os eSports e muitos mais. E tudo indica que vai ainda crescer e expandir pela atratividade e ilusão criadas.

Nos primeiros quatro meses de 2024, os brasileiros teriam gasto cerca de R$ 18,5 bilhões em apostas, um aumento de 32% em comparação com o mesmo período do ano anterior.

De acordo com estudo realizado pela Mosaiclab em junho de 2024 envolvendo 4 mil brasileiros com 18 anos ou mais, 22% deles apostam frequentemente em bets, sendo que 4% dos participantes relataram que essas apostas têm impactado de forma significativa seu orçamento, dificultando a compra de outros itens essenciais.

Outra pesquisa realizada pela Futuros Possíveis, com base em 1.600 entrevistas no Brasil, mostra que 36% dos pesquisados afirmam já ter apostado online, 78% aposta com frequência ou ocasionalmente e as apostas habituais são mais mencionadas por entrevistados da região Nordeste. Destaca ainda que para 80% dos pesquisados o gasto é de até R$100 por aposta e existe uma predominância de 58% de usuários de baixa renda.

É fato de que essa realidade não ocorre apenas no Brasil já que seu impacto também atinge outros países.

Nos EUA estima-se que a receita bruta dessas apostas tenha sido de US$ 7 bilhões em 2022, de acordo com a DraftKings, e o total de apostas represente US$ 100 bilhões, ou 0,4% do PIB por lá.

Dentre as principais plataformas no Brasil estão Bet365, Betano, BetFair, 1xBet, Betway e Sportsbet.io, usualmente operando multimarcas e são parte de grupos globais como Entain, Flutter Entertainment e vários outros e que têm suas sedes em Malta, Curaçao, Ilha de Man, Reino Unido e Irlanda, países que têm incentivos fiscais, regulamentação, infraestrutura e ambiente legal para abrigar esses negócios.

E qual o resultado das apostas?

O governo aceita e valoriza pois aumenta a arrecadação; veículos de comunicação aumentam suas receitas publicitárias; atletas do presente e do passado, influencers ganham mais para fazer parte do jogo; entidades esportivas, estádios e clubes faturam mais com os direitos comercializados; sites e plataformas ampliam suas receitas… Mas, afinal, por que preocupações com o crescimento das apostas esportivas online? Simples.

O crescimento endêmico desse mercado está tirando renda, vendas, consumo e emprego. Até mesmo o que é recebido como auxílio governamental do consumo. E, consequentemente, impactando o varejo e o comércio no Brasil.

Sem falar do que retira de dinheiro do país, que acaba indo para o exterior, já que os controladores estão em sua esmagadora maioria por lá.

Existe um processo de esterilização de parte significativa desse volume que roda nessa espiral de apostas e negócios.

E que esse quadro merece uma mais ampla reflexão, com a consciência de que os interesses envolvidos nesse jogo são bem maiores do que temos imaginado.

Nota: No Latam Retail Show, de 17 a 19 de setembro no Center Norte, em São Paulo, haverá especial ênfase, conteúdo e programação dedicados às discussões dos impactos das transformações no mercado, na geografia, na economia, no consumo e no varejo nos diferentes canais, categorias, formatos de lojas e modelos de negócios nos diversos mercados mundiais, com especial ênfase nas estratégias envolvendo preço dinâmico. O evento também terá transmissão virtual de parte do conteúdo para quem não possa participar presencialmente. Os ingressos limitados já estão disponíveis pelo site.

Marcos Gouvêa de Souza é fundador e diretor-geral da Gouvêa Ecosystem e publisher da plataforma Mercado&Consumo.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
Imagem: Shutterstock

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