Os 8 pontos que mudam nos negócios de viagens e turismo DIA (Depois da Inteligência Artificial)

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Os 8 pontos que mudam nos negócios de viagens e turismo DIA - Depois da Inteligência Artificial

Não é possível generalizar e nem simplificar quando pensamos DIA (Depois da Inteligência Artificial) nos negócios em viagens e turismo. As transformações estruturais que se desenham precisam ser consideradas de forma ampla, “glocal” e irreversíveis.

Sempre colocando o consumidor-turista no epicentro de tudo, ao pensarmos nos negócios de viagens e turismo é preciso separar os segmentos corporativo, o massificado e o de luxo.

Quando pensamos em impactos estruturais, é preciso também considerar a dimensão econômica, social e geográfica. É preciso também pensar a cadeia de valor do setor em toda sua extensão, pois os impactos são distintos nos diferentes elos, sendo alguns deles comuns a todos.

No âmbito local, é preciso, ainda, contextualizar a realidade brasileira como destino que não consegue elevar o turismo, de qualquer natureza, à condição de ativo econômico e social com a importância que merece e patina no medíocre desempenho histórico.

Em 2000, o Brasil recebeu 5,3 milhões de turistas, o que evoluiu para algo entre 6,3 e 6,4 milhões entre 2015-2019. Sofreu o impacto da covid entre 2020-2022 e, em 2023, recuperado em parte da crise da covid, recebeu 5,9 milhões.

Neste ano, até setembro, foram 4,9 milhões e as previsões para todo o ano indicam os mesmos níveis do período 2015-19,ou seja, próximo de 6,4 milhões. Porém, perto de 70% desses turistas são de países da América Latina, quase um destino doméstico.

O fluxo global de turistas em 2023 foi de 1,3 bilhão e este ano de 2024 deverá atingir perto de 1,5 bilhão. Ou seja, no caso do Brasil, uma das 10 maiores economias do mundo, representa como destino turístico menos de 0,5% do fluxo global.

Alguns elementos dos impactos DIA nos negócios de turismo e viagem são definitivamente comuns aos diversos segmentos no contexto “glocal” e merecem ser destacados e repensados numa visão mais estratégica.

1. A evolução do turista DIA (Depois da IA) impõe crescentes desafios para toda a cadeia de valor dos negócios de viagens

Mais informado, pesquisando de forma muito fácil e simples, avaliando condições, destinos, ofertas e com muito mais acesso instantâneo e comparável, o turista DIA, seja o massificado, o corporativo ou o de luxo, demanda muito mais com pequenas mudanças comportamentais entre eles.

Para os que precisam entender, atender, satisfazer, personalizar ou superar expectativas desses consumidores-turistas, cresce a necessidade de incorporar também recursos tecnológicos e de IA para tentar equilibrar o jogo.

Dado o crescente comportamento e orientação para valor dos consumidores de forma geral, essa necessidade ocorre no relacionamento direto, pessoal ou por via digital. E a necessidade de incorporação de recursos e ferramentas acontece não apenas no “front”, mas também, e principalmente, na retaguarda para tornar todo o sistema mais racional e menos oneroso.

2. A crescente competitividade desafia a rentabilidade

As mudanças e o empoderamento do turista de forma geral ainda mais orientado para valor e empoderado pelo acesso a instrumentos de avaliação e comparação de oferta, promoções, condições e preços reduz as margens brutas operacionais.

Ao mesmo tempo, os necessários investimentos em tecnologia para se manter competitivo associados com o aumento das despesas, envolvendo principalmente recursos humanos, e com aumento do turnover, pressionam o resultado líquido operacional.

A IA pode e precisa ser usada como instrumento para oferecer mais informação, personalização, experiência, conveniência, agilidade e possibilidades por menores preços e com variedade de condições de pagamentos para os consumidores-turistas. Em todos os potenciais elos do relacionamento.

3. Aceleração da desintermediação valorizada pela IA

No turismo, começou com as companhias aéreas, avançou com locadoras, cruzeiros, hotéis, resorts e foi reconfigurado por modelos como Airbnb.

A desintermediação é, ao mesmo tempo, causa e consequência do processo, pois carrega o componente autopropulsor, já que seu aumento ao mesmo tempo acelera sua evolução como parte do processo de busca de um novo ponto de equilíbrio.

O movimento já estava desenhado e tem se acelerado e ampliado, além de repetir o que tem acontecido com vários setores com um processo crescente de desintermediação no ambiente de negócios.

Com a IA, a desintermediação pode agregar valores adicionais com programas mais avançados de relacionamento e fidelidade, personalização, mais experiências e significativa evolução nos modelos de preços dinâmicos.

4. Consolidação rima com multiplicação e reconfiguração no ambiente de negócios

Todo o cenário descrito acima e potencializado pela IA gera uma perspectiva de consolidação setorial como fator de reequilíbrio competitivo na cadeia de valor com busca de aumento de escala, racionalização e diferenciação.

Isso envolve diretamente o setor de hotelaria, entretenimentos, operadoras, agências cruzeiros, companhias aéreas, locadoras e transporte de forma geral, além da alimentação.

Mas, ao mesmo tempo, temos um fenômeno de expansão de micro ou médio empreendedorismo, em especial nos setores de pousadas, hotéis boutique, restaurantes, destinos, operadoras diferenciadas e hospedagem de forma ampla, que gera uma ampliação de novas, diferenciadas e personalizadas alternativas, acessíveis de forma mais fácil e competitiva pela IA.

5. A retomada pós pandemia enfrenta desafios estruturais crescentes e ainda não resolvidos

O setor de turismo e viagens definitivamente foi um dos mais afetados globalmente pela crise gerada pela covid.

Em 2019, o número global de turistas foi de 1,46 bilhão e, em 2020 e 2021, período mais dramático da crise, a queda foi de 74% com perto de 380 milhões de viajantes.

Mas as consequências foram maiores do que apenas a dramática queda do fluxo turístico e teve forte impacto em negócios que não se recuperaram, fechamento de empresas, perda de profissionais para outros segmentos, queda na oferta de voos e, na tentativa de recuperação acelerada, gerou a inflação interna do setor bem mais alta do que as médias nacionais.

Esse quadro ainda tem efeitos residuais e tem demandado mais investimentos, revisões tecnológicas, sistemas, processos e substituição ou complementação de recursos, incluindo IA, para reequilíbrio estratégico.

6. Gente se tornará fator ainda mais crítico em todo o cenário

Atração, seleção, desenvolvimento, atualização e retenção de profissionais se tornam mais críticos em todos os ambientes de negócios e são agravados nos setores de turismo e viagens pela forte dependência do componente da experiência em toda a atividade.

De um lado, a tecnologia, o digital e a customização oferecidos pela Inteligência Artificial oferecem alternativas para potencializar a componente experiência.  De outro, o nível de expectativas do turista-DIA é maior exatamente pela exposição a mais excitação e inovação de forma crescente.

Tudo se torna mais complexo quando é sabido que hotéis ou restaurantes de destinos diferenciados no mundo são obrigados a restringir ou limitar sua oferta de serviços por absoluta falta de gente nos horários demandados.

A componente gente para prover a diferenciação e inovação torna todo o ciclo que envolve pessoas mais difícil, exigindo mais investimentos na própria tecnologia para empoderar o processo, substituir mão de obra qualificada e mais todo o instrumental para buscar as diferenças. Além de profundas e amplas mudanças em tudo que envolve o comportamento, a capacitação, as competências e as habilidades dos profissionais envolvidos.

A IA combinada com outros instrumentos como Metaverso gera modelos de treinamento mais avançados, personalizados e alternativas para tornar o desenvolvimento e atualização profissional mais inclusivos, imersivos e envolventes para enfrentar parte dos problemas.

7. Mais tecnologia, digital e IA na estratégia, gestão e operação dos negócios será decisiva como fator de equilíbrio em relação à pressão competitiva no cenário emergente

O resultado de tudo que é apontado nos itens acima amplifica em muito a atenção que é e será dedicada à incorporação de mais tecnologia, digital e, em especial, à Inteligência Artificial na revisão das estratégias, modelos de negócios, consolidação, desintermediação, oferta, demanda, operação, gestão e fluxo de investimentos envolvendo os setores de turismo e viagens por todos os seus agentes ao longo da cadeia de valor.

O que cada empresa, negócio, líder ou profissional ligado ao setor fará para se atualizar, envolver, aprender, desenvolver e repensar atividades, negócios e resultados é uma jornada que apenas começou. E não tem tempo nem previsão para acabar.

A componente generativa da Inteligência Artificial a transforma nesse recurso com autopropulsão e vida própria que torna qualquer previsão equivocada de nascença.

8. Reposicionamento na preferência por destinos impactada pelos desafios do presente e do futuro próximo

O aumento do interesse por China, Coréia, Indonésia, Singapura e outros destinos que combinam avanços relevantes em tecnologia, digital e em Inteligência Artificial aplicados aos negócios e à vida de forma geral é um exemplo do que já se observa e tenderá aumentar.

Ao mesmo tempo, determinados destinos como Japão, Tailândia e Nova Zelândia, que combinam estilos de vida inspiradores em contraponto com as transformações tecnológicas disruptivas, também estão redesenhando o cenário global de destinos e tudo ainda é afetado pela reconfiguração dos polos políticos e econômicos globais.

O Brasil nada representa como destino turístico global. E não tem Inteligência Artificial que mude a miopia instaurada.

De forma histórica e estrutural, o Brasil nunca tratou o turismo com visão estratégica e importante economicamente para além dos discursos oficiais. E normalmente feitos por políticos de carreira emprestados para funções de liderança no setor por acerto de cotas partidárias. Talvez, em raros momentos, foi diferente quando a Embratur teve uma gestão orientada de fato para o longo prazo.

Seria de dar vergonha, se não fosse ridículo, o País representar menos que 0,5% do fluxo turístico global.  E, ainda assim, tendo 70% desse fluxo com origem na própria América Latina.

Sem ignorar o tema da localização geográfica em relação aos grandes originadores do fluxo global, o turismo nunca foi tratado e planejado para se tornar um ativo estratégico importante no plano econômico, social e estrutural.

Apesar do incrível ativo representado pelas condições naturais, a diversidade, a miscigenação racial e o que o próprio mundo moderno cria, como o turismo de evento, de experiência, o médico e o de negócios.

Considerando a mudança já em curso na geografia dos fluxos turísticos com o crescimento do potencial de China, Índia e outros países da Ásia e do Pacífico, um projeto estratégico e de longo prazo deveria posicionar o turismo internacional como um dos mais importantes ativos a serem desenvolvidos profissional e empresarialmente, com seus impactos positivos na geração de renda, emprego e divisas.

Tão simples assim, porém desde que tocado com visão integrada público-privada, ambiciosa e criativa. E nessa lógica nem precisa de Inteligência Artificial, mas sim de simples bom senso.

Marcos Gouvêa de Souza é fundador e diretor-geral da Gouvêa Ecosystem e publisher da plataforma Mercado&Consumo.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.

Imagem: Shutterstock

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