A NRF 2025 trouxe reflexões profundas sobre os rumos do varejo e do consumo. Entre tecnologias emergentes, novas dinâmicas de mercado e modelos inovadores, um fator se destacou: a importância das pessoas. O varejo do futuro já chegou e está acontecendo agora. Ele precisa ser construído sobre pilares de conexão, experiência e valor humano. E esses pilares precisam vir de dentro para fora, estando presentes no propósito da empresa e de seus colaboradores, para que sejam transmitidos com veracidade aos clientes.
O cenário atual: incerteza e necessidade de reinvenção
O varejo global enfrenta desafios significativos, desde um crescimento lento até uma competição acirrada entre gigantes como Walmart e Amazon, que está bem próxima em ultrapassar a maior varejista do mundo em faturamento. Isso só mostra que a previsibilidade de longo prazo se tornou complexa, exigindo planejamento mais ágil e adaptável de todas as empresas do mercado.
A transformação não se resume apenas à tecnologia, mas à forma como os negócios estão estruturando seus serviços. Cases como o Walmart GoLocal (mercado de compra sem fricção) e a Amazon Health (serviços de saúde) demonstram que o futuro do varejo está em oferecer soluções e experiências diferenciadas, e não apenas produtos. Mais do que nunca, o varejo precisa ter um olhar no futuro, melhorar serviços logísticos e a eficiência operacional. Mas, para além da estruturação da solução, é preciso ter as pessoas certas e capacitadas para operar o negócio e entregar a melhor experiência ao cliente.
A chave para o sucesso: desenvolver pessoas
Em um mundo em que a tecnologia é um meio, e não um fim, as empresas que melhor capacitarem seus colaboradores sairão na frente. Os aprendizados extraídos da NRF e do Retail Executive Summit apontam para a necessidade de formação contínua, desde a liderança até os colaboradores que estão na linha de frente desse atendimento.
Ter profissionais com perfis de fácil adaptação às mudanças nunca foi tão importante. Esse, por exemplo, tem sido um pilar fundamental no processo de transformação da Best Buy, conforme destacou a CEO, Corie Barry, durante a NRF 2025. A empresa atualmente não está com excelentes resultados financeiros e entrou em uma jornada de transformação e capacitação das pessoas como um dos pilares de transformação da Best Buy.
Nesse processo, alguns aspectos relacionados à liderança, capacitação das pessoas, capacidade de adaptação e experiência por meio da hospitalidade se destacaram:
- Liderança inspiradora: O papel do líder não é apenas garantir processos, mas engajar e motivar. Conforme destacado por Marcos Gouvêa de Souza, ao final do Pós-NRF – Retail Trends 2025, “ninguém segue um líder pessimista”. O líder do futuro precisa equilibrar tecnologia, estratégia e humanização.
- Capacitação rápida e contínua: O tempo de formação dos colaboradores precisa ser reduzido, sem comprometer a qualidade. Casos como o da Granado, que viu a necessidade de ter brasileiros à frente do negócio para ressaltar o propósito e a experiência da marca em solo internacional, mostram que um dos principais fatores para viabilizar a internacionalização das marcas só é possível quando há uma força de trabalho bem treinada.
- Adaptação constante: “Mudança vai acontecer o tempo todo, então só quero os adaptáveis”, disse Jennifer Hyman, CEO da Rent The Runway, durante a NRF deste ano. Empresas devem priorizar talentos que saibam navegar por cenários voláteis e construir novas soluções.
- Hospitalidade como diferencial: O conceito de omotenashi, aplicado no Japão e que significa “cuidar de todo o coração”, reforça a antecipação das necessidades do cliente. A cultura da hospitalidade e do encantamento deve fazer parte de uma rotina presente em todas as áreas de empresas varejistas e chegar até o time de vendas, possibilitando que essa experiência alcance o cliente. Esse foi um dos pontos ressaltados por Cristina Souza, CEO da Gouvêa Foodservice, durante o Retail Executive Summit.
Tendências que moldam o futuro do varejo
Para além das iniciativas que vão viabilizar que a cultura da empresa chegue à última milha, o varejista precisa estar atento a como irá estabelecer seu posicionamento de negócio para entregar a melhor experiência ao seu público. Tendo isso em vista, ressalto quatro grandes tendências apresentadas durante a NRF 2025, que acredito terem maior aderência e receptividade no mercado brasileiro e que vão impactar decisões estratégicas e, consequentemente, o desenvolvimento das pessoas nas empresas.
- Experiências imersivas: O consumidor busca maior interação com produtos e serviços e quer se sentir parte do processo, imerso na experiência de compra em um nível nunca antes experenciado anteriormente. Não tem diversão, entretenimento ou algum prazer nesse processo de compra, não há motivo para sair de casa e a compra tende a ser realizada via plataformas digitais. Cases como o do Aston Martin (marca de carro de James Bond, dos filmes da franquia 007, que tem uma boutique destinada à personalização dos carros nos mínimos detalhes) e da FAO Schwarz (loja de brinquedos com espaços temáticos, imersivos e interativos, que convidam para o brincar e para a experimentação, incentivando a compra) mostram que a personalização e o entretenimento elevam o valor percebido da marca.
- Hiperconveniência e baixa fricção: De acordo com uma pesquisa global realizada pela Accenture, 73% dos consumidores se sentem sobrecarregados com inúmeras opções de compra. Com o excesso de informação e a necessidade de tomada de decisão em todas as áreas de nossas vidas, empresas de varejo precisam pensar em como facilitar fluxos de compra, simplificando o processo e tornando a experiência mais intuitiva. IA e automação precisam ser utilizadas como meios para facilitar, e não complicar, a jornada do cliente.
- Sustentabilidade como imperativo: Em tempos de opiniões polarizadas e julgamentos enviesados e extremistas, muitas marcas decidem reforçar seu compromisso com a sustentabilidade e o consumo consciente. Mudanças climáticas bruscas estão afetando condições básicas de saúde de comunidades em âmbito global, e empresas privadas já entenderam que esse precisa ser um compromisso de todos, e não somente do poder público. O mercado global, de forma geral, caminha para regulações ambientais mais rígidas. Modelos circulares, como o da Rent the Runway (que incentiva a economia circular e a visão da roupa como um investimento; “compro agora para alugar depois”), tornam-se estratégicos tanto para empresas quanto para consumidores. Cecília Rapassi, CEO da Gouvêa Fashion Business, explica que “existem oportunidades de novas receitas a serem exploradas com o modelo da economia circular, mas é preciso investir e ter foco genuíno para desenvolver essas frentes. Os prejuízos causados pelo desequilíbrio climático virão a curto prazo, e as soluções para diminuir o impacto são urgentes.” Esse foi um dos temas ressaltados por Rapassi durante a Retail Trends 2025.
- Wellness e propósito: Marcas como Lululemon reforçam que bem-estar e saúde mental estão no centro das decisões de consumo. Empresas que promovem ambientes de trabalho saudáveis também colhem melhores resultados, afinal, saúde mental será um dos principais problemas de saúde enfrentados pela população global, e as pessoas vão priorizar ambientes mais saudáveis para trabalhar, especialmente em empresas que possuem seu posicionamento atrelado a esse propósito. Isso eventualmente irá atrair também consumidores que buscam se relacionar de forma mais profunda e significativa com as marcas. Mais do que um local para atender a suas necessidades, as pessoas buscam comprar em marcas nas quais se sintam pertencentes e representadas.
O caminho para 2025 e além
O varejo de sucesso será aquele que equilibra tecnologia e humanização, automação e conexão. Lojas serão mais do que pontos de venda, tornando-se hubs logísticos, espaços de comunidade e centros de experiência e relacionamento.
Investir no desenvolvimento de pessoas não é apenas uma necessidade, mas uma estratégia de longo prazo. Em tempos de incerteza, é a força humana que garantirá resiliência e inovação para o futuro.
“Não existe outro caminho. É preciso aprender e trabalhar muito sempre”, ressaltou Vagner Correia, diretor do Iguatemi, ao destacar um de seus aprendizados, ao final do Retail Trends 2025, durante um bate-papo com Marcos Gouvêa de Souza, diretor-geral da Gouvêa Ecosystem, e Wellington Silva, diretor de Tecnologia da Riachuelo.
Para apoiar e promover o desenvolvimento contínuo, preparei um checklist de capacitação para o varejo, com o objetivo de viabilizar a formação de equipes de alta performance no seu negócio.
Roberta Andrade é diretora de Educação Corporativa e sócia da One Friedman e da Gonow1.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo
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