Do carnaval para cá, quando o tema “Que tiro foi esse?” esteve bastante presente, muita coisa tem acontecido. É importante lembrar que já se passou um quarto de um ano que tem muito para ser dos mais marcantes de nossa história recente.
Na economia e no consumo, o país avança em linha com as previsões, amparado pela baixa inflação, uma das menores dos últimos anos, e a tímida recuperação do emprego e da renda, que permite que a massa salarial esteja superior àquela de três anos atrás.
Avança também com a melhoria da confiança do consumidor e mais uma ligeira ampliação do acesso ao crédito para pessoas físicas.
Tudo razoavelmente dentro do previsto e antecipado, mas sinalizando uma enorme mudança em relação ao passado recessivo recente.
Na política interna, um turbilhão de emoções pautadas pelo avanço das apurações, julgamentos, condenações, recursos e contestações que não impedem um avanço jamais antes imaginado da prisão de líderes políticos e empresariais. Uma transformação estrutural e, ao que tudo indica, e esperamos, definitiva.
A própria indefinição, cada vez mais marcante e profunda, das próximas eleições presidenciais no país, sem querer idealizar, parece menos dramática, à medida que o país tem mostrado surpreendente descolamento do econômico-financeiro em relação ao político.
Sem dúvida, os riscos de uma radicalização à esquerda parecem menos dramáticos no momento, restando a preocupação com o movimento oposto à direita, enquanto se multiplicam as alternativas pelo centro moderado, deixando o quadro ainda mais indefinido.
Sobram diagnósticos e faltam propostas e planos de ação. Isso, porém, é menos preocupante, ao menos no curto prazo.
No cenário internacional, uma sucessão de ações pirotécnicas, vindas principalmente do presidente Trump dos Estados Unidos, desafia o bom senso. Mas são facilmente catalogáveis como factóides com forte apelo promocional, ao mesmo tempo que, ideologicamente, focam na proteção do emprego e da economia norte-americana, desprezando quaisquer outras consequências colaterais.
Elas, porém, sinalizam o embrião de uma potencial crise econômica-financeira e política internacional num futuro não muito distante. Ou não.
A resiliência do mercado e das economias globais aos desvarios políticos nas economias mais maduras tem sido muito maior do que se poderia imaginar.
A questão mais crítica para o observador mais atento e menos iludido com os sinais do curto prazo reside na demora de uma guinada transformadora do Brasil que nos torne mais competitivos frente a realidade global.
Continuamos perdendo posições no cenário econômico e social internacional, por conta de nossos equívocos, omissões, complacência e alienação.
Somos uma das dez maiores economias do mundo, porém a 125a numa escala de 190, dos melhores países para fazer negócios, segundo estudo do Banco Mundial.
Já fomos uma das seis maiores economias do mundo, mas nos afastamos cada vez mais desse grupo, quando consideramos indicadores sociais, de educação, saúde, sustentabilidade e segurança.
O Social Progress Index – 2017, que tem como apoiadores diversas instituições internacionais e é conduzido pela Deloitte, sendo baseado em doze indicadores envolvendo diversas áreas ligadas ao tema, coloca o Brasil apenas na 43a posição, atrás de Chile, Costa Rica, Panamá, Argentina e Uruguai na América Latina.
As principais reformas que poderiam transformar nossa realidade estruturalmente permanecem indefinidas.
Na Previdência, não fomos capazes, especialmente por conta dos partidos comprometidos com o atraso, de mobilizar o país, por uma inadiável transformação radical.
No plano político, alguns poucos avanços ante o muito que há por fazer.
Na área trabalhista, exatamente o mesmo. Algum avanço, mas distantes do cenário ideal, apesar da modernização aprovada.
Na burocracia, estamos absolutamente estagnados.
Na segurança, tudo que vemos é o retrocesso e nos ilhamos cada vez mais em busca de um porto seguro.
Na saúde e na educação, os avanços são pálidos, quando não inexistentes.
Quando nos comparamos com o cenário internacional, não é possível nos iludir.
Estamos nos afastando dos países que estão construindo o futuro mais rapidamente, apesar do vigor, flexibilidade e capacidade do setor privado. É realmente difícil competir em desigualdade de condições.
Os mais experientes, ou conformados, poderão lembrar que tudo tem seu tempo. Ou até mesmo invocar o dito português, apropriado por Collor, de que o tempo é senhor da razão.
Lamentavelmente, os fatos falam mais alto e o quadro geral não nos permite ilusão.
Estamos melhores no curto prazo e na visão simplista e imediatista no aconchego de nossa gruta.
Se sairmos para o tempo aberto, mais distante de nossa zona de conforto, vamos perceber que o pouco que temos avançado é de fato muito pouco, comparado com o muito que há por fazer e as transformações mais amplas no cenário global.
Continuamos desiguais e pobres na saúde, na educação e na segurança pública, apesar do vigor do setor privado.
O engajamento pessoal e coletivo para uma transformação mais estrutural e definitiva já não é mais uma opção. É fundamental, quando pensamos no legado que estamos construindo.
E, para ficar no popular, vale invocar o antes tarde do que nunca.
As poucas e pontuais vitórias devem nos servir de estímulo para pensar em outra dimensão, mais ambiciosa e global e, definitivamente, entendermos que podemos, individual e coletivamente, fazermos a diferença.
É uma questão de opção.
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