A pesquisa “O consumidor do amanhã“, conduzida pela Mosaiclab em parceria com a Toluna e apresentada no Global Retail Show, nos trouxe uma série insights interessantes quanto ao consumo das pessoas nos próximos cinco a dez anos. Alguns dados chamaram muito a atenção, como, por exemplo, o desejo de aumentar o consumo de vestuário e de produtos de higiene e cosméticos nos próximos anos. Até então, muito do que se ouvia nas lives e de especialistas durante o isolamento na pandemia era que as pessoas haviam percebido que tinham coisas demais, roupas demais, preocupações demais com a vaidade e que iriam mudar seus hábitos no futuro.
Os dados da pesquisa mostram que o brasileiro tem um desejo latente por consumir vestuário e produtos de higiene e cosméticos. Em uma cesta de 32 categorias pesquisadas, estas duas ficaram no top 5 em potencial futuro de consumo. O que mudou? De onde vem essa demanda reprimida? Será que as pessoas já se esqueceram do momento mais agudo pelo qual passamos?
Em uma conversa informal com um presidente de uma empresa multinacional que produz tecidos para vestuário, comentamos os dados da pesquisa e ele não se mostrou surpreso. Ele nos disse que, em outros tempos similares ao que estamos vivendo, houve o mesmo movimento, principalmente nos períodos de pós-guerra.
Ficamos curiosos e fomos nos informar. Encontramos referências dizendo que a moda, durante a Segunda Guerra Mundial, foi limitada pelo racionamento de determinados tipos de tecidos na Europa. Essa limitação acabou definindo o vestuário feminino durante os conflitos pela utilização de tecidos alternativos e corte em estilo militar.
Após o término da guerra, ocorreu um movimento oposto. Havia uma preocupação latente com a expressão da feminilidade, e isso se refletiu, principalmente, na maneira como as pessoas se vestiam. O período também se destacou pela ascensão da indústria de cosméticos, que estavam em escassez durante a Segunda Guerra, e que tiveram, neste período, o início de seu apogeu na comercialização e publicidade.
Longe de nós querer comparar a pandemia que estamos vivendo com a Segunda Guerra Mundial. Mas o isolamento de boa parte da população fez com que as roupas mais informais fossem mais utilizadas em casa e a preocupação com a estética e produtos de beleza diminuísse, uma vez que não havia a necessidade de sair e se expor nas ruas. O pijama era o nosso uniforme – e quantas foram as lives de camisa social, com shorts e pés descalços? A volta gradual das pessoas para os escritórios, shoppings, restaurantes, enfim, para o convívio social, nos mostra que as pessoas querem e precisam estar bem consigo mesmas e com o ambiente que novamente se mostra para elas.
Muitas marcas desses setores estão sofrendo na retomada, pois apostaram em um cenário mais apocalíptico do que efetivamente está acontecendo. A própria indústria de tecidos para vestuário não previa uma demanda tão grande nesta retomada e a falta de produtos tem, até mesmo, pressionado os preços dos tecidos para cima. Foram poucas as empresas que apostaram em um crescimento no período.
É preciso olhar com carinho para as oportunidades para estas categorias no futuro. Embora haja uma demanda reprimida, os consumidores têm, sim, mudado o seu comportamento e a sua relação com marcas, produtos e serviços que consomem. A mesma pesquisa mostrou que há aqueles consumidores mais tradicionais, que buscam por marcas mais tradicionais e os canais tradicionais de compra. Mas há novas vertentes, há os que não enxergam fronteiras entre o físico e o digital na hora da compra, há os que buscam por tecnologias disruptivas em produtos e serviços e aqueles que buscam produtos que respeitem a natureza, seja em ingredientes e matérias-primas, seja na forma de produção mais sustentável.
Você apostaria suas fichas no consumidor do amanhã?
Ricardo Contrera é sócio-diretor da Mosaiclab.
Imagem: Bigstock