Overemployment: manter dois empregos como a cura para a insatisfação profissional

A sensação de receber dois salários fixos por mês tem sido cada vez mais almejada pelos trabalhadores. Essa procura é traduzida por um novo conceito do mercado de trabalho: o overemployment (pessoas “superempregadas”, na tradução para o português). O movimento resume a tendência de manter dois empregos ao mesmo tempo – e, pasmem, a renda extra não é o único motivo da decisão.

Um trabalhador overemployed não é aquele que procura atividades extras para complementar sua renda do mês. Os seguidores do movimento conciliam dois empregos integrais simultaneamente. Dois chefes, duas agendas, duas responsabilidades, duas cobranças. Tudo ao mesmo tempo.

Como ainda não há como estar em dois lugares ao mesmo tempo, o modelo de trabalho home office é a base do crescimento dessa tendência. Contudo, essa vontade não é nova. Uma pesquisa da Unicamp divulgada em 2007, quando a palavra “quarentena” ainda era desconhecida, revelou que quase metade dos brasileiros fazia hora extra ou tinha dois empregos. O conceito de trabalho híbrido apenas facilitou um interesse antigo.

Para se ter ideia da grandeza do movimento, existe um site chamado overemployed em que as pessoas compartilham dicas de como manter dois empregos. “Bem-vindo à porta secreta da sua liberdade financeira” é a frase que aparece quando o link é acessado.

No TikTok, a tag #overemployed possui mais de seis milhões de visualizações. Por meio de vídeos curtos com uma pitada de humor, os jovens compartilham suas rotinas com mais de uma função. A viralização desses conteúdos online faz com que mais trabalhadores comecem a considerar essa nova rotina.

O aumento da renda, apesar de ser importante, não é a única causa da tendência. A ideia do overemployment liberta o trabalhador da necessidade de se conectar plenamente com os propósitos de uma empresa. Por mais contraditório que pareça, a revista estadunidense Wired divulgou o overemployment como a cura do burnout.

Quando um funcionário tem dois empregos, a percepção das funções a serem cumpridas não passa de uma troca de serviços por dinheiro. Não há grandes significados por trás do trabalho e, consequentemente, também não há grandes quebras de expectativa. Além disso, ao ter a segurança de um emprego reserva, o medo da demissão diminui e a capacidade de dizer “não” aumenta. Os overemployeds têm mais confiança para negar as atividades fora do horário de trabalho.

O fenômeno vai além de um estilo de vida. Os overemployeds seguem uma ideologia na qual o propósito e a conexão com a cultura não são importantes no âmbito profissional. Essa mentalidade é especialmente mais comum no mercado de tecnologia, já que não é novidade de que há mais vagas abertas do que profissionais qualificados para preenchê-las. De acordo com uma pesquisa da Brasscom, em 2021, o Brasil teve 159 mil vagas abertas na área e apenas 53 mil profissionais formados.

Por um lado, o movimento resolve parte do problema da falta de profissionais qualificados. Por outro, reforça a ideia da exclusão da área de TI em relação aos outros setores da empresa. Pensando em cultura, é comum que faltem incentivos que conectem os profissionais de tecnologia com os propósitos da empresa. O overemployment pode até ser a cura para a insatisfação profissional de alguns, mas ainda não resolve todos os problemas do mercado de trabalho.

Nota: Com a palestra sobre “O desafio da alta demanda de profissionais de TI”, a Truppe! estará presente na Campus Party 2022, que acontecerá entre os dias 11 e 15 de novembro, no Anhembi.

Carlos Carvalho é CEO da Truppe!
Imagem: Shutterstock

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