Responsável pelas plataformas de moda premium Shop2gether e OQVestir e pelo marketplace 2Collab, o Grupo Icomm deve fechar o ano de 2021 com receita bruta de R$ 300 milhões e crescimento acima de 30%. Voltadas para o público da classe A, as marcas lançam 500 produtos novos todos os dias. “A maioria é produzida in house, em um centro de produção, na Barra Funda, em São Paulo, onde preparamos e criamos esse conteúdo”, afirma Eduardo Kyrillos, CEO do grupo, em entrevista exclusiva à Mercado&Consumo.
Kyrillos também comentou sobre o crescente movimento de compra consciente, de slow fashion e de produtos duráveis, que foi acelerado com a pandemia. “O consumidor é o mesmo, mas o consumo muda. O consumidor digital consome menos e o nível de consciência é muito alto”, diz.
Apesar de prever um ano difícil, por conta da inflação, dos juros e da turbulência política em ano de eleição, o empresário projeta cenário de crescimento por alguns anos. Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista:
Mercado&Consumo: Você poderia falar de como surgiu a aproximação entre a Shop2gheter e a OQVestir e quais as mudanças que vieram depois dessa união entre as plataformas, em termos de infraestrutura tecnológica, de estrutura, de estratégia e gestão?
Eduardo Kyrillos: Naquele tempo, em 2016, o e-commerce de produtos full price voltado para a mercado premium era um segmento muito pequeno. A expectativa de plano de negócios das duas empresas era maior do que o capital e elas estavam ameaçadas em continuar uma trajetória promissora. Eram praticamente espelho naquele momento. A parceria surgiu daí e a empresa dobrou de tamanho, tornando-se a Icomm, com as despesas no mesmo patamar. No primeiro ano, já tivemos uma redução de prejuízo muito grande. Ambas tinham centro de distribuição ociosos esperando crescimento. Todas as áreas tinham algum tipo de ociosidade, principalmente as produtivas. Procuramos manter a independência de posicionamento e fizemos um trabalho de distanciamento dos canais em relação ao portfólio de produtos e ao target de consumidor. A OQVestir de hoje é um perfil bem diferente do que naquela época, mais jovem. E a Shop2Gether se manteve no posicionamento mais luxo do que era naquele momento. Distanciamos um pouco o posicionamento das marcas para oferecer um diferencial para os clientes.
M&C: Aproximadamente quantas marcas e produtos as plataformas vendem hoje?
Eduardo Kyrillos: Hoje temos três marcas. Lançamos 500 produtos novos, diferentes, todos os dias, somando as três plataformas. A maioria é produzida in house, em um centro de produção, na Barra Funda, em São Paulo, onde preparamos e criamos esse conteúdo. Estamos falando de um universo de cerca de 400 marcas, 450, se incluirmos a 2Collab, que tem cerca de 100 marcas ativas. A 2Collab ainda é um projeto-piloto e faz número em alguns aspectos, mas ainda é um projeto pequeno, de um marketplace de marca independente, que lançamos em 2020.
Lançamos 500 produtos novos, diferentes, todos os dias, somando as três plataformas.
M&C: A 2Collab é direcionada para os pequenos empresários da moda. Como essa experiência tem funcionado?
Eduardo Kyrillos: Como todo projeto inicial, tem suas dificuldades. A 2Collab ainda está no momento de se provar para sair de MVP, ganhar confiança dos investidores e se tornar uma plataforma com mais relevância. Esse não é um mercado fácil porque os pequenos designers não têm estrutura e não é trivial [para eles] administrar um marketplace. São dificuldades de trabalhar com microempresários. Ainda não estamos prontos para oferecer essa alavancagem de crescimento para bombar o negócio. Temos o outro lado da equação, que é a identidade: fizemos uma pesquisa de mercado e percebemos que a 2Collab teve um conhecimento de marca muito rápido pelo que foi investido. O trabalho inicial está cumprido em relação à apresentação desse canal. Temos fila de designers querendo entrar, mas não conseguimos adicionar ainda porque não temos fluxo suficiente. Mas estamos quase prontos para virar para a segunda fase, de escala, onde vamos escalar o tráfego e o portfólio. O futuro ainda é indefinido, pois estamos em ajustes e não temos certeza sobre a segunda e terceira fases e qual vai ser o tamanho disso. Sem dúvida, é um projeto com potencial enorme. São milhares de produtores de moda independente pelo Brasil que não têm visibilidade no mercado mainstream, nos shoppings e nas multimarcas.
M&C: Como funciona a curadoria dos empresários?
Eduardo Kyrillos: Na Icomm, nós temos três comitê de marcas – um para cada plataforma. Na direção desse comitê está a cofundadora da Icomm, a Ana Isabel Carvalho Pinto, da Shop2gheter, que faz essa mediação e toma a decisão em caso de dúvidas. A curadoria é definida nos comitês, onde avaliamos o potencial da marca e se ela está em sintonia com a plataforma e o seu público.
Eduardo Kyrillos: Isso já foi um grande problema, quando comentei sobre 2016. Não vejo isso hoje. A questão de remarcações não é mais uma briga do digital. É geral do varejo. Porém, estamos num cenário de alta de preços e ninguém está dando muito desconto porque está faltando produto. O sourcing está comprometido no pós-pandemia. Essa barreira do off price no online já caiu e somos um exemplo disso, pois estamos numa taxa de crescimento boa. Vendemos outra coisa, que não preço: vendemos facilidade, comodidade, excelência de serviço e muito conteúdo fashion e de moda. Nossa taxa de recorrência é bem mais alta que a do mercado. Temos um net promoter score (NPS) de 84 pontos e um processo de devolução fluído. Esses são pilares nossos por trabalhar com a moda premium. Ter que vender por preço não é uma barreira e a gente consegue ter as competências necessárias para vender outros atributos.
Vendemos outra coisa, que não preço: vendemos facilidade, comodidade, excelência de serviço e muito conteúdo fashion e de moda.
M&C: Em 2020, vocês lançaram um braço próprio de entrega, o Icomm Log, em São Paulo. Esse projeto foi impulsionado pela pandemia ou já estava nos planos do grupo?
Eduardo Kyrillos: Ele já estava nos planos e o Icomm Log começou a funcionar poucos meses antes da pandemia. O projeto foi feito objetivando a excelência no serviço. Estava no nosso plano que ao chegar em determinada escala – e obviamente isso começar por São Paulo -, a gente começaria a usar uma transportadora própria local. Tem sido excelente porque temos o controle total de qualidade sobre os transportadores, last mille e tudo o que acontece. Temos também a devolução simultânea e o que chamamos de entrega luva branca, em poucas horas, para clientes vips. E olha que saímos de Extrema (MG), muitas vezes, com especificidades de cada cliente. Por termos uma transportadora própria, hoje oferecemos opções de entrega diferentes em São Paulo. A cidade de São Paulo representa de 20% a 25% dos pedidos totais.
M&C: Você acha que vamos ter alguma mudança no perfil de consumidor de moda online no pós-pandemia?
Eduardo Kyrillos: Eu não espero uma mudança no perfil do consumidor, mas acho que a pandemia acelerou movimentos que já vinham acontecendo no perfil de consumo. Não tenho dúvidas de que a palavra propósito, que é a identidade de uma marca, é muito mais importante hoje do que antes. O consumidor é o mesmo, mas o consumo muda. O consumidor digital consome menos e o nível de consciência é muito alto. Ele faz uma compra menos impulsiva e mais racional do que uma compra no shopping. Esse movimento de compra consciente, de slow fashion, de produtos duráveis é crescente no online e no presencial, mas a compra online está à frente no tempo e as tendências batem primeiro para a gente.
O movimento de compra consciente, de slow fashion, de produtos duráveis é crescente no online e no presencial, mas na compra online está à frente.
M&C: Qual é o perfil hoje do consumidor da Shop2Gheter e da OQVestir?
Eduardo Kyrillos: Em ambos os sites temos como mercado endereçável a classe A, porém, o tíquete médio da peça vendida no OQVestir é mais baixo. Embora seja um público da mesma classe social, o que diferencia isso são a idade e o comportamento. No Shop2Gheter, temos um perfil de consumidor mais perene, permanente, que quer um material mais nobre e não se importa de investir um pouco mais numa peça com esses atributos. Já a maior parte dos consumidores do OQVestir é solteira e sem filhos.
M&C: Qual é a receita do grupo hoje e a previsão de crescimento para os próximos anos?
Eduardo Kyrillos: Vamos fechar 2021 com uma receita bruta de R$ 300 milhões e nosso target de crescimento gira na casa dos 30% nos próximos anos. O ano de 2021 foi atípico e crescemos acima disso. Acho que 2022 será um ano difícil e provavelmente vamos revisar esse planejamento para baixo, na casa dos 25% por, pelo menos, mais três anos. Nossa base ainda é pequena num mercado de vestuário online. E o conhecimento das nossas marcas ainda é baixo. Por isso, conseguimos ver um cenário de crescimento por alguns anos.
M&C: Esse cenário difícil em 2022, você acredita que será por conta da economia, da pandemia ou das eleições?
Eduardo Kyrillos: Temos uma série de fatores, entre eles aumento de preços, falta de matéria-prima com aumento de preço, que deixa o produto mais caro, o dólar, que potencializa esse problema, e o fator juros que está subindo e vai deixar o crédito reduzido e o dinheiro escasso. Temos uma conjuntura econômica de um quadro recessivo. Se crescer um pouco, a gente já fica feliz.
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