O que vamos ter para o jantar?

Por Marcos Gouvêa de Souza*

Cada vez mais a resposta à pergunta sobre as opções para o jantar irá incluir alternativas de alimentos preparados fora do lar, categoria que tem crescido de forma sistemática sua participação no conjunto das despesas familiares com alimentação e que cria novos desafios e oportunidades para todo o segmento de mini, super e hipermercados.

No período de 2005 a 2014, a participação no Brasil da alimentação fora do lar, aquela que é preparada fora da residência para ser consumida em qualquer lugar, inclusive no próprio lar, evoluiu de 4% do total das despesas das famílias para 5,2%, enquanto as despesas com alimentação no domicílio caiu sua participação de 17,2% para 10,3%.

No ano passado, com base nos dados oficiais disponíveis, estimamos que o volume total de dispêndios com alimentação fora do lar foi perto de R$ 160 bilhões no Brasil e a previsão que no período de 2015 a 2019, dentro do atual cenário, o CAGR (Compound Annual Growth Rate) deverá ser de 8,1%.

As razões para essa forte expansão recente e futura, acima do crescimento geral do varejo e do setor de alimentação como um todo, tem explicação especialmente do lado da demanda e também no da oferta.

No vetor da demanda essa expansão reflete a profunda mudança de hábitos de alimentação como resultado das transformações estruturais de mercado com aumento da participação da mulher na população economicamente ativa, a expansão da renda real das famílias, o crescimento do emprego dos últimos anos, a interiorização desse crescimento, o aumento da urbanização no país e os problemas envolvendo mobilidade urbana.

No lado da oferta, houve uma ampliação marcante das alternativas de conceitos, marcas e propostas no cenário do Foodservice, com todas as redes que operam no País e mais aquelas que recém chegaram, aumentando o número de pontos de vendas e mais a criação de outras alternativas para atender a crescente demanda através do delivery, food trucks e outras. Além da ampliação do número de independentes que atuam no setor que contribuíram fortemente para a expansão dos formatos de atacarejo, que é a fonte prioritária de abastecimento desses operadores.

A conjugação desses fatores explica porque no País, em média, a alimentação fora do lar já representa um terço de todas as despesas com alimentação, e em forte crescimento, quando, há dez anos, era de apenas 24%.

A indústria de alimentação que abastece esse mercado tem hoje, em média, de 20 a 25% de seus negócios no mercado interno dedicados ao Foodservice, como todo o setor de alimentação fora do lar é caracterizado. Para o varejo operando no Brasil, essa realidade é percebida mais como ameaça do que como oportunidade.

Enquanto no mercado internacional operadores como Monoprix, Carrefour, Whole Foods, Wegman’s, Dominicks, Selfridges, Tesco, Galleries Lafaiette, Marks & Spencer, Waitrose, Kauffhof, El Corte Ingles e muitos outros reviram seus modelos de atuação para incluir muito mais alternativas para atender essa mudança de hábitos, no Brasil, timidamente, algumas empresas estão ainda repensando seus negócios para embarcar nessa irreversível tendência.

Um bom exemplo do repensar radical de formato de varejo orientado para essa nova realidade será a abertura da primeira loja do Eataly em São Paulo no próximo dia 19 de Maio, mostrando um formato que se consagrou em diversos países a partir de seu lançamento em Turim, na Itália, em 2007. A loja de Nova Iorque do Eataly é um dos destinos quase que obrigatórios dos turistas brasileiros na cidade, mesclando venda de alimentos, bebidas, livros utensílios para alimentação com a operação de diversas modalidades de restaurantes, bar e casual dining, tudo num mesmo espaço.

De forma ainda mais ambiciosa, alguns conglomerados globais do setor de supermercados, como Auchan e Casino, avançam estrategicamente para se tornarem, inclusive, operadores de restaurantes, exercitando no extremo o desenvolvimento dessa competência e trazendo uma sinalização importante da visão de onde poderá chegar esse processo de transformação.

Aos operadores brasileiros, onde apenas alguns poucos se deram conta das ameaças e oportunidades implícitas, é fundamental entender que esse processo exige muito mais do que repensar a “rosticeria”, como tradicionalmente o setor trata a área de alimentos prontos para consumo, especialmente porque as margens praticadas no Foodservice são significativamente mais elevadas, porém a operação tem uma complexidade muito maior. Como se sabe, especialmente nesse tema, não existe almoço grátis. Nem jantar.

NOTA: Neste mês de maio ocorre em Chicago o principal evento global na área de Foodservice, o NRA Show, e a GS&MD – Gouvêa de Souza, por meio de sua unidade especializada, estará acompanhando o evento, com um programa paralelo de visitas e discussões para melhor aproveitamento da viagem.

*Marcos Gouvêa de Souza (mgsouza@gsmd.com.br) é diretor-geral da GS&MD – Gouvêa de Souza.

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