Apenas 32% dos CEOs veem contribuição efetiva dos conselhos em estratégias e diretrizes claras

Pesquisa da consultoria Maio avalia a relação entre diretores executivos e os conselhos das empresas no Brasil

32% dos CEOs vêm contribuição efetiva dos conselhos em estratégias e diretrizes claras

A relação entre CEOs (diretores executivos em tradução livre) e os conselhos das empresas se transformou nos últimos 15 anos em razão das novas configurações do mercado corporativo, novas práticas do universo financeiro e de agendas globais.

Para mensurar a qualidade do relacionamento entre duas partes fundamentais na gestão das organizações, a Maio, consultoria especializada nas áreas de executive search e avaliações de executivos e conselhos, realizou uma pesquisa para entender esse cenário e recomendar ações de melhoria aos pontos sensíveis. Participaram do estudo 97 CEOs, de companhias de diferentes tamanhos e formatos, que responderam a um questionário online entre os dias 22 de setembro e 9 de outubro deste ano.

Cinco aspectos foram avaliados, mas as respostas à pergunta final, não enumerada, vão ao ponto nevrálgico dessa relação: apenas 32% dos executivos concordam que o conselho da sua empresa “contribui efetivamente com estratégia e diretrizes claras”. Para 48,4%, “o conselho contribui com diferentes temas, mas pode melhorar em algumas áreas” e para 19,6%, o conselho da empresa “tem papel mais fiscalizador do que estratégico”.

O dado reflete o saber percebido entre os conselheiros. Os respondentes destacaram como excelente e satisfatório os conhecimentos sobre finanças (77,3%), sobre o papel fiscalizador do conselho (66%) e sobre o papel da empresa na comunidade e sociedade (62,9%).

“Chama a atenção na pesquisa o fato de que, na percepção dos CEOs, os conselhos são mais orientados para aspectos operacionais, como fiscalização, finanças e governança, do que para aportar conhecimento em estratégia, novas oportunidades de negócios e inovação”, observa Luiz Alberto Marinho, sócio-diretor da Gouvêa Malls. “Isso tem mais relação com o formato das reuniões do que com as competências dos conselheiros. Em outras palavras, na teoria todo mundo quer evoluir. Mas para isso é preciso revisitar processos”, pontua Marinho.

Conhecimento em tecnologia

Em temas relacionados a novos negócios e inovação (crescimento inorgânico e negócios que não fazem parte do portfólio atual), tecnologia (digitalização, IA, tecnologia da informação, infraestrutura, segurança cibernética) e gestão de pessoas (planejamento sucessório, remuneração, avaliação de desempenho, cultura corporativa), os indicadores não foram muito positivos.

Entre os 97 CEOs, 71,2% afirmaram que o nível de conhecimento em tecnologia pelos conselhos precisa ou pode melhorar. Em relação à gestão de pessoas, precisa ou pode melhorar para mais da metade dos respondentes, 53,6% deles. E em negócios e inovações, precisa ou pode melhorar para 52,6% dos diretores executivos.

As áreas de conhecimento mais vulneráveis ou mais bem supridas coincidem com a existência de comitês temáticos ou de grupos de trabalho de tempo indeterminado. O estudo apontou que, apesar de 75,3% das organizações possuírem um comitê de finanças em funcionamento, 68% delas não possuem comitê de sustentabilidade, 49,5% não contam com comitês de estratégia e de riscos e 44,3% não têm comitê de pessoas ou remuneração.

Ainda segundo o levantamento, 49,5% dos executivos responderam que os comitês funcionam bem e tornam a relação entre Diretoria e Conselho mais efetiva e eficiente, havendo oportunidade de melhoria para cobrir essa deficiência.

Entre os aspectos positivos, Fernando Andraus, sócio-fundador da Maio, ressalta a boa relação entre as duas partes. Mais de 80% dos CEOs consideram excelente ou satisfatório: confiança mútua (82,5%), respeito entre as partes quando há divergência (81,4%), o comprometimento do conselho com decisões e temas críticos para o sucesso da empresa (80,4%) e apoio em situações de gestão de crise (85,6%).

A maioria dos CEOs considera, ainda, excelente ou satisfatória a pertinências de informações solicitadas pelo conselho para as reuniões (55,7%) e a organização das demandas (57,7%).

Recomendações

Para Andraus, existem três pontos de melhoria que devem ser considerados. O primeiro deles é a avaliação frequente dos conselhos por meio aplicações que mensurem os itens analisados nesta pesquisa e que o autor do estudo considera os mais relevantes.

Em segundo lugar, ele afirma ser necessário que os conselhos administrativos ou consultivos se atentem ao papel da secretaria do conselho ou de governança. Se exercida adequadamente, a função apoia a presidência do conselho, organiza as reuniões e conecta gestão e conselho com diplomacia e discrição.

A terceira medida e, talvez, uma das mais importantes, é a ampliação ou criação de comitês. “Tem um espaço grande para atrair conhecimento especializado por meio desses comitês e de forma mais leve”, observa Andraus.

De acordo com o executivo da Maio, os comitês ou grupos de trabalho tratam de temas mais relacionados ao futuro das companhias, como pessoas, estratégia, novos negócios e tecnologia, em fóruns que antecedem as reuniões entre CEOs e os conselheiros. “A reunião deliberativa fica muito mais produtiva”, garante.

Revolução em curso

Nos últimos 15 anos, grandes mudanças afetaram as empresas e, em especial, o mundo dos conselhos. Três fatores influenciaram mais intensamente essas transformações.

A primeira delas foi o crescimento de empresas de capital privado (private equity) e de capital aberto que, para receber investimentos, precisavam cumprir critérios de governança, isto é, de boas práticas, em que se preze a ética nas relações com todo o ecossistema do negócio. O conselho, então, virá compor a mesa da diretoria com a finalidade de fiscalizar o cumprimento de tais exigências e garantir a idoneidade da corporação.

Por sua vez, a iniciativa privada no Brasil, cuja característica é sua origem familiar, começou a fazer mudanças na gestão para incorporar os novos padrões e competir por esses  investimentos.

Os bancos também estabeleceram critérios de governança e passaram a exigi-los das companhias para a realização de investimentos, para o estabelecimento de parcerias e para a solicitação de crédito.

Além disso, há herdeiros que nem sempre querem permanecer na empresa, mesmo que detenham o controle acionário. Podem deixar a gestão sob responsabilidade de um CEO de mercado, mas, geralmente, ocupam uma cadeira no conselho e acompanham mais de perto os rumos da corporação.

Para Fernando Andraus, esse contexto que inseriu a figura do conselho administrativo ou consultivo nas empresas está se consolidando. Na opinião dele, ainda é necessário amadurecer o papel desse organismo para além das atribuições financeiras e fiscalizadoras. Os novos tempos exigem novos perfis. Os espaços de melhoria observados no estudo apontam um caminho a ser seguido.

Imagem: Shutterstock

 

 

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