NRF 2025: o luxo em nova perspectiva

Nesta edição da NRF 2025, acompanhei a delegação da Gouvêa Experience em uma jornada de imersão pelo varejo de Nova York, um verdadeiro laboratório de tendências e termômetro de consumo. Entre as mais de dez lojas visitadas, duas se destacaram pelas formas distintas de traduzir o conceito de luxo.

Você já ouviu o termo “alfaiataria do carro”? A Aston Martin, marca inglesa fundada em 1913, assegura essa proposta. Mais conhecida como o carro do James Bond, a marca inaugurou uma flagship store em Nova York, com vitrines impactantes que exibem os carros como joias em uma grande caixa de vidro.

Todo o espaço é altamente sofisticado e projetado para proporcionar ao cliente uma experiência única de criar seu próprio carro. O arsenal de cores, aviamentos, couros e outros detalhes permite personalizar o produto ao extremo. No entanto, nenhuma venda é realizada ali. O carro dos sonhos é projetado em uma tela gigante de 11 metros e, caso o cliente deseje concluir a compra, eleé direcionado a um revendedor oficial.

A produção é quase artesanal e leva cerca de seis meses para ser concluída. Trata-se de uma venda hiperpersonalizada e exclusiva, realizada presencialmente com suporte tecnológico. Apesar de contar com 160 revendedores em 53 países, a Aston Martin produz apenas 6.000 carros por ano. Cada unidade custa entre 400 e 500 mil dólares. Ou seja, é um luxo quase inacessível, mas que, por meio dessa flagship em uma das principais avenidas do mundo, se torna mais próximo de quem queira conhecer de perto essa joia.

Outra operação que chamou a atenção foi a loja The RealReal, cuja proposta é expandir o acesso a grandes marcas de luxo por meio do modelo de economia circular. Chamados de “preloved”, esses produtos que já foram “amados” por alguém ganham um novo ciclo de uso nas mãos de um novo dono. O ambiente da loja evoca uma atmosfera de galeria de arte — minimalista, com organização e exposição impecáveis. A experiência de compra é compatível com as marcas ultradesejadas expostas e, somada à credibilidade na autenticidade dos produtos, configura um modelo que conquista cada vez mais espaço no mercado.

O mercado de luxo está em plena revolução. Segundo o relatório The State of Fashion: Luxury, o setor global de luxo alcançou uma receita recorde de € 353 bilhões em 2023, impulsionado por uma recuperação robusta pós-pandemia e pela entrada de novos consumidores, especialmente das gerações mais jovens. Contudo, a necessidade de reinvenção das grandes marcas para se reconectarem com essas gerações exige mais do que criatividade ou qualidade da matéria-prima. Impõe uma revisão de valores, sustentabilidade, design e, principalmente, propósito.

No primeiro dia de congresso da NRF, o CEO da Burberry, Joshua Schulman, participou de um painel conduzido por Pete Nordstrom. Trata-se de uma marca centenária e icônica que enfrenta desafios financeiros importantes. Com a chegada do novo CEO em julho de 2024, a empresa deu início ao plano chamado Burberry Forward, cujo objetivo é revitalizar a essência da marca, sem perder sua autenticidade.

As estratégias de reconexão com as novas gerações são cruciais. De acordo com a Bain&Company, até 2030, a Geração Z deverá representar entre 25% e 30% das compras no mercado de luxo. Essa mudança no perfil dos consumidores exige das marcas não apenas produtos diferenciados, mas também um diálogo transparente e autêntico com seus valores e expectativas.

A estratificação do luxo, portanto, reflete um momento de transição: de um mercado historicamente associado à exclusividade e inacessibilidade para um que busca equilibrar tradição e inovação com  exclusividade e inclusão. A fórmula que possibilitou o crescimento desse mercado nos últimos 5 anos não se aplica aos tempos atuais.

Se faz necessário uma virada de jogo para os players do setor, em que as marcas precisam não apenas atender aos desejos dos consumidores, mas também responder às suas demandas éticas e ambientais. A capacidade de unir experiências personalizadas, inovação tecnológica e valores compartilhados será determinante para o sucesso das marcas em um mercado de luxo cada vez mais dinâmico e conectado com as transformações sociais e culturais do nosso tempo.

Cecília Rapassi é sócia-diretora da Gouvêa Fashion Business.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.

Imagens: Shutterstock e Cecília Rapassi

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