Crise no varejo: há luz no fim do túnel?

Os acontecimentos recentes em grandes varejistas brasileiras – Americanas, Tok&Stok, Camicado, Marisa, Renner – acenderam o alerta para uma crise no setor. Tratando-se de grandes players, os desdobramentos destes fatos podem ser cruciais para a economia como um todo.

O setor varejista, devido à sua proximidade com o consumidor, pode ser considerado um termômetro do consumo, da demanda e da economia como um todo. Neste contexto, compreender os ingredientes desta crise nos auxilia a vislumbrar o cenário futuro da economia brasileira e entender rumos e decisões a serem tomadas.

Sabe-se que há anos a economia brasileira sofre com crises diversas. Entende-se que o comportamento da economia é cíclico, mas parece que, para a realidade brasileira, os momentos de dificuldade têm sido mais frequentes do que os de aceleração e crescimento.

Se analisarmos a última década, de 2012 a 2022, o crescimento médio nominal do PIB nacional foi de 0,4%. Considerando crescimento populacional, inflação e a piora em indicadores sociais – como o índice de Gini, que mede desigualdade social –, pode-se dizer que a vida do brasileiro médio não ficou mais fácil e que houve redução de qualidade de vida.

Desde a crise fiscal e política pré-pandemia – que estende seus efeitos aos dias atuais –, e sofrendo os efeitos globais e nacionais da própria crise da pandemia, que tem como principais resultados aceleração inflacionária, aumento da taxa de juros e arrefecimento do crescimento econômico, a economia brasileira parece não ter encontrado o caminho do crescimento sustentável.

Atribui-se a crise das grandes varejistas principalmente ao estrangulamento da demanda, por conta da aceleração inflacionária recente, que influencia o poder de compra da população e tira do orçamento itens que não são considerados essenciais, além da elevada taxa de juros, que se mantém em dois dígitos desde o início de 2022, inibindo o consumo, o investimento e as negociações de recuperação judicial devido ao crédito escasso.

Apesar do cenário de inflação e da elevação da taxa de juros, em relação ao primeiro trimestre de 2022 a taxa de desocupação brasileira caiu 2,4 pontos percentuais. O rendimento médio real do trabalho teve elevação de 7,4%, assim como o Índice Cielo de Varejo Ampliado de abril apresentou crescimento das vendas do varejo de 1,7%, em relação ao mesmo mês de 2022, um crescimento real de 1,1%.

Pode-se dizer que há elementos que nos colocam em situação de análise contraditória, pois os indicadores econômicos de médio prazo apontam na direção de persistência da crise econômica e até a expansão e os de curto prazo, de forma tímida, nos levam a acreditar que há luz no fim do túnel.

É importante ter indicadores conjunturais que sinalizem na direção de uma recuperação econômica, como a melhora do emprego e do rendimento do trabalho. Porém, eles são suficientes para acreditarmos que a crise das grandes varejistas é pontual e não terá efeitos mais duradouros e prejudiciais à economia como um todo?

Na última edição do World Competitiveness Index, divulgado pelo Fórum Econômico Mundial, o Brasil perdeu duas posições, ocupando o posto de 59º de país mais competitivo do mundo entre os 63 analisados, ficando atrás de países como Malásia, Peru e Botswana. Este é um indicador que deve ser levado em conta.

A crise dos grandes varejistas parece ser apenas um dos sintomas da condução pouco pró-oferta das escolhas de políticas públicas brasileiras. O País há anos está ficando para trás em relação às tecnologias que compõem a 4ª Revolução Industrial e tem sofrido com esta perda internacional de competitividade, ampliando sua vulnerabilidade externa e dependência tecnológica.

Se há luz no fim do túnel? Há anos os países se organizam em direção a uma verdadeira revolução em suas economias, divulgando seus planos de transformação de suas matrizes econômicas, coordenados por políticas públicas a favor da competitividade e protagonizados pelo setor privado.

Os indicadores conjunturais respondem a incentivos e acontecimentos também conjunturais, ou seja, de curto prazo. No pano de fundo, há a decadência estrutural da economia brasileira que ocorre há mais de 40 anos, quando o País dança conforme a música e não assume um direcionamento mais estratégico de seu desenvolvimento.

Espera-se um projeto mais estruturado de País, compreendendo o protagonismo do setor empresarial, a necessidade deste de ingressar de uma vez por todas na 4ª Revolução Industrial e que este projeto dê tração ao crescimento sustentável e ao desenvolvimento social. Esta é a luz no fim do túnel.

Carolina Cândido é consultora na Gouvêa Consulting.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.

Imagem: Shutterstock

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