“Para começar, é importante destacar que como o consumidor está no centro de tudo. A promoção Black Friday é interessante para o omniconsumidor e se torna cada vez mais global, na esteira do crescimento da participação das plataformas como Amazon em diferentes mercados.
Para o varejo em si, existem mais prós do que contras, mas no estágio atual tornou-se obrigatório o engajamento geral sob pena de se ficar à margem do mercado.
Os resultados recentes em diversos países e no Brasil mostra a força da promoção às vésperas do Natal, que sempre foi a mais importante data promocional do comércio e varejo e que, cada vez mais, sofre a concorrência focada apenas em preço da Black Friday.
Para o omniconsumidor cada vez focado em preço e valor, a Black Friday tem um apelo irresistível às vésperas do Natal, permitindo que ele antecipe compras aproveitando as ofertas e promoções.
A questão, sob o ponto de vista do comércio e do varejo, é até que ponto essa antecipação de vendas com maior sacrifício de preços e margens compensa de fato.
Mas não dá para negar. Da forma como está, não dá para ficar de fora.”
Importante recordar que a Black Friday nasceu nos Estados Unidos para gerar uma promoção especial no meio do feriado de Thanksgiving – que, na cultura norte-americana, tem enorme simbolismo e concorre com o próprio Natal em apelo emocional.
O nome evocava a transição dos resultados em vermelho, prejuízo, para preto, com as vendas especiais nessa oportunidade e em seguida Natal “salvando” o resultado do ano. Nasceu focada no varejo de lojas.
Para criar algo orientado para o e-commerce, foi lançada em seguida a Cyber Monday, e ambas se integraram com o avanço dos multicanalidade.
Os resultados deste ano em alguns mercados mostram a força da promoção.
Nos Estados Unidos os resultados da Black Friday de 2024 segundo a Mastercard indicam um aumento nas vendas online de 14,6% em relação ao ano anterior, enquanto as vendas em lojas físicas tiveram um incremento mais modesto, de 0,7%.
Na Inglaterra, de forma surpreendente, o varejo físico, segundo a VoucherCodes, teria tido crescimento de 9,1% em relação ao ano anterior para uma média geral de 4,5%.
Na Coreia do Sul, apesar do adverso clima político, o crescimento este ano foi de 15% no e-commerce e de 8% nas lojas físicas.
Índia, Austrália, França, Espanha, Itália, Chile e muitos outros países se incorporaram ao apelo representado pela Black Friday, em especial pela comunicação gerada pelas plataformas globais como Amazon e outras, e têm acompanhado a evolução da promoção nascida nos Estados Unidos.
No México, numa tentativa de evitar o conflito, mas não perder o apelo promocional, criou-se a “El Buen Fin”, que acontece na semana anterior ao feriado do Dia da Revolução Mexicana, que neste ano ocorreu entre 15 e 18 de novembro e é algo similar à Semana Brasil por aqui, que aconteceu entre 2019 e 2022.
Na prática, no México, aconteceram as promoções da El Buen Fin e em seguida o Black Friday.
No Brasil, este ano pelo Índice Cielo de Varejo Ampliado (ICVA) as vendas cresceram 16,1% em comparação com o mesmo período do ano passado. No comércio de lojas, a alta teria sido de 17,1% e, no e-commerce, 8,9%.
No indicador deste ano estão consideradas as vendas do dia 29 de novembro apenas e no ano passado desde o dia 24 de novembro, o que pode ter influenciado o desempenho.
E sempre lembrando que as campanhas e promoções deixaram de se concentrar apenas no dia e se estendem em alguns casos para o todo o mês e para muitas empresas ao menos toda a semana.
Por segmentos, pelo mesmo indicador, os destaques foram Super e Hipermercados com 26,2%, Drogarias e Farmácias, com 21,7%, e Vestuário, com 18,2%.
Mas para cada empresa, categoria, canal ou modelo de negócio é uma realidade distinta.
É relevante notar a evolução do uso do Pix como sistema de pagamento no Brasil. Durante a Black Friday, ele teve expansão de 120,7%, sinalizando sua crescente participação em relação a alternativas, o que pode distorcer alguns outros indicadores.
Para o omniconsumidor, já se tornou uma data aguardada e para a qual muitos se planejam para aproveitar e antecipam compras de Natal.
Tem um efeito quase que similar ao Single’s Day da China, que acontece no dia 11/11 e que se torna também cada vez mais global.
E não tem como escapar, como comentou a CEO do McDonald’s em encontro que tivemos por lá.
Ela nos relatou que no começo a rede procurava evitar para não ser envolvida em mais uma data promocional de mercado e preferindo manter sua própria estratégia. Mas a partir de um determinado ano começaram a participar e tornou-se de fato uma das principais promoções para a rede na China.
Dá para mudar?
No Brasil já se discutiu muito a conveniência de manter a data ou ao menos tentar mudar o período da promoção.
Em 2019, a Secom do Governo Federal coordenou a Semana Brasil, que seria uma alternativa nacional para a criação de uma data promocional no mês de setembro. Nos primeiros anos, com o engajamento das principais entidades de comércio e varejo do País, a data decolou e vinha se firmando como alternativa nesse período em que nada existia como apelo de vendas.
Com a mudança de governo a iniciativa oficial foi desmobilizada e deixou de ser articulada.
O X da questão
O ponto central e sobre o qual parece haver consenso do comércio e do varejo é sobre a inadequação de uma mega promoção às vésperas do Natal vendendo com preço promocional e depreciando margens e rentabilidade o que poderia ser vendido com preço cheio.
A realidade é que a inflação mais alta e crescente, o nível de endividamento e a pressão sobre a renda têm feito crescer o foco do omniconsumidor no valor e promoções, ofertas, vendas especiais e outras alternativas que só fazem reduzir a parcela das vendas totais baseadas em preço cheio.
Estima-se que nos Estados Unidos menos de 20% das vendas totais do varejo são feitas com preço cheio. É um processo evolutivo que aparenta não ter retorno, pois tudo indica que esse é o tipo de “vício” do qual não se tem muita recuperação.
Tem alternativa?
Já se cogitou – e não passou disso – uma articulação ampla para rever ao menos a data de uma ampla campanha promocional que mobilizasse o maior número possível de marcas, categorias, canais e segmentos para gerar uma alternativa um pouco mais apropriada à Black Friday considerando o período em que acontece. E muito ainda se tem falado sobre essa possibilidade.
Tudo que exija ampla mobilização, investimento e comunicação visando mudar hábitos instalados de comportamento de consumidores enfrentará uma natural resistência, pois definitivamente é melhor se adaptar, sorrir e aderir do que tentar nadar contra a correnteza. Mesmo que o custo em termos de rentabilidade e estresse operacional e logístico seja muito alto.
Muito para refletir. E sabe-se lá se vale a pena, de alguma forma, agir.
Nota: De 8 a 15 de Janeiro de 2025 estaremos em nossa 36ª missão da NRF Retail’s Big Show. O atual Ecossistema Gouvêa foi a primeira delegação estruturada a participar do evento, sendo também a primeira a organizar uma apresentação sobre o varejo brasileiro no evento com a participação de Frederico Trajano do Magazine Luiza e Artur Grynbaum do Boticário.
Nesse período, mais de 3.800 executivos, dirigentes e profissionais dos setores de varejo, consumo e serviços participaram em nossas delegações para o NRF Show e muitos outros em nossas Trade Missions para Europa, EUA, Israel, China, Coréia, Singapura e Índia.
Para conhecer mais da programação 2025 da NRF Show, acesse aqui. Os aprendizados sobre tudo que será visto e discutido nessa missão, traduzidos, aprofundados e comparados com a realidade brasileira, poderão ser vistos e acompanhados no Retail Trends – Pós NRF no dia 28 de Janeiro de 2025 em São Paulo, nas versões presencial e virtual e pela cobertura especial que será feita pela plataforma Mercado&Consumo. Conheça mais por aqui.
Marcos Gouvêa de Souza é fundador e diretor-geral da Gouvêa Ecosystem e publisher da plataforma Mercado&Consumo.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
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