A combinação de fatores no Brasil e no mundo contribui para a valorização das marcas próprias no mercado. O cenário futuro parece convergir para o aumento de participação desse setor no conjunto dos negócios no varejo e no consumo.
Do lado da demanda, o fato de a pandemia fez emergir um consumidor ainda mais racional no seu comportamento. O cenário macroeconômico mundial e local, contaminado pelas questões que envolvem inflação, tornou o comportamento de compras mais orientado para valor, reforçando a preferência para alternativas que ofereçam mais por menos, que é a base da proposta das marcas próprias nas mais diversas categorias de produtos.
Do lado da oferta, o varejo e a indústria dedicada à produção de marcas próprias, em busca de melhor rentabilidade, tem investido mais na criação e no aperfeiçoamento de alternativas para dar ao consumidor mais opções, com maior qualidade e preços competitivos. Em todos os setores e segmentos.
Quando se pensa na participação de marcas próprias no segmento de supermercados no Brasil, os números oficiais giram em torno de 7% do total das vendas, com tendência de aumento. Mas todas as principais redes trabalham na reconfiguração de sua oferta para aumentar a participação das suas marcas próprias.
Deve ser incluída nessa análise aquelas que como a rede espanhola Dia têm no seu modelo de negócio a decisiva participação em suas vendas das marcas próprias, que gira em torno de 40% das vendas totais.
Para outros segmentos e setores, os números estão crescendo ainda mais fortemente. Isso é real para as categorias de vestuário, onde os líderes de mercado – Renner, Riachuelo e C&A, ou mais Zara, Hering, Reserva e outras – têm absoluto predomínio das marcas próprias, sendo essa a estratégia básica de seu modelo de negócios.
Mas as marcas próprias estão também avançando no setor farmacêutico, com a líder RD (Raia Drogasil) expandindo a oferta e participação de sua marca Needs de forma relevante, seguida por outras redes com a mesma estratégia. Em especial, em produtos ligados a cuidados pessoais.
Igualmente, no setor de material de construção, as líderes de mercado no segmento home center também avançam com suas marcas próprias.
Em todos os casos, elas seguem a mesma lógica dos movimentos nos maiores mercados globais, onde o avanço da procura por valor faz crescer a oferta e o interesse pelas marcas próprias.
Nos Estados Unidos, no ano passado, as marcas próprias alcançaram vendas de US$ 199 bilhões com crescimento de US$ 1,9 bilhão sobre o ano anterior, representando uma participação de 17,7% em valor e 19,6% em volume físico do total das vendas no varejo.
Para redes como Costco, com sua marca própria Kirkland, transversal para todas as categorias de produtos, de uísque a camisas, de alimentos a artigos para o lar, as marcas próprias já superam os 30% das vendas totais.
Como um dos modelos de negócios mais beneficiados pelo quadro econômico e social atual, os clubes de compra Whareshouse Clubs, do qual faz parte a Costco, versão inspiradora de nossos atacarejos, têm nas marcas próprias um de seus principais pilares estratégicos. E pode-se discutir quanto tempo irá demandar para que também por aqui passem a ser ofertadas por esse formato de varejo, que é hoje o que mais cresce em termos de volume de vendas e participação de mercado.
Da mesma forma como redes como Whole Foods, por sua opção pelo natural e orgânico, têm nas marcas próprias, em produtos para todas as categorias, incluindo o foodservice, um elemento estratégico crítico em sua proposta de diferenciação.
Mesmo no canal digital, as marcas próprias vêm crescendo em participação e a Amazon é um bom exemplo dessa estratégia.
Na realidade europeia, as marcas próprias têm as maiores participações nas vendas de varejo em todas as categorias, em especial nos supermercados, chegando a representar mais do que 40% na Suíça e entre 30 e 40% na maioria dos países. Em alguns casos, os varejistas podem oferecer até cinco alternativas diferentes de marcas próprias para uma mesma categoria, como ocorre com a Tesco na Inglaterra.
E lembrando que os formatos hard discount, como a Lidl e a Aldi, conceitos que mais se expandem na Europa, as marcas próprias representam um pilar estratégico fundamental de sua atuação.
E se pensarmos em outros segmentos, como vestuário, artigos para o lar, medicamentos e outros, o processo de educação do consumidor que estimula a opção pelas mascas próprias também é um indutor importante do aumento da oferta e crescimento da participação das marcas próprias para os mais diversos segmentos e categorias.
Na China, os líderes de mercado também atuam fortemente com marcas próprias. Favorecidos pelo volume e pela qualidade de informação sobre hábitos e atitudes de consumidores, eles têm a visão plena e correta da demanda presente e futura e usam essas informações para direcionar suas compras e a oferta nas lojas.
Wrap Up
O aumento das vendas e participação das marcas próprias no varejo é certo e seguro nos próximos anos pela combinação de maior quantidade e qualidade de informações sobre hábitos, atitudes e desejos dos consumidores proporcionadas pelo avanço dos processos de monitoramento de comportamentos de consumo.
Tudo isso aliado com os desejos de um consumidor cada vez mais racional em seu processo de compras, como resultado de um cenário econômico mais complexo e pela constante melhoria da oferta de produtos de marca própria nos mercados.
Tão simples assim.
Marcos Gouvêa de Souza é fundador e diretor-geral da Gouvêa Ecosystem e publisher da plataforma Mercado&Consumo.
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