1º dia do Digitail sentencia: digitalização humanizada é a próxima etapa do varejo

Para especialistas, o consumidor atual quer a conveniência do digital somada à experiência humana do físico

Charles Schweitzer, diretor-superintendente de Inovação do Banco Carrefour

Garantir processos de digitalização humanizada aos seus clientes é a próxima etapa da evolução do varejo. Este foi o recado deixado pelos especialistas no primeiro dia do Digitail, evento realizado pela Gouvêa Experience, em São Paulo, com a temática “O mundo físico está on”. A programação completa de dois dias reúne mais de 40 palestrantes de grandes empresas do varejo, consumo e foodservice.

Ao contrário das previsões apocalípticas da época da pandemia sobre o fechamento das lojas físicas, os palestrantes garantiram que o consumidor atual não abre mão da conveniência do digital, mas também busca a experiência de compra presencialmente.

A aposta é investir na multicanalidade – tendo o seu consumidor como referência – sem abandonar a conexão e o vínculo do atendimento que somente as pessoas podem oferecer, na outra ponta, de forma individual e personalizada.

Ao longo desta terça-feira, 18, os convidados compartilharam caminhos de soluções e iniciativas de sucesso que levam ao melhor atendimento de seus clientes e, consequentemente, ao aumento do faturamento.

Inovação humanizada

Na palestra “Ambidestria corporativa como resposta para o futuro do seu negócio”, o diretor-superintendente de Inovação do Banco Carrefour, Charles Schweitzer, revelou que a inovação é a chave para conquistar e fidelizar os consumidores. No entanto, questionou o público sobre o entendimento do que é inovar. “Inovação é sobre resolver problemas reais de pessoas reais. Não é tecnologia”, afirmou Schweitzer.

Para ele, a jornada de inovação, dentro das organizações, deve seguir um ritmo mais conservador de um lado, garantindo, assim, as melhorias e a expansão dos portfólios que geram resultados; e, de outro, deve também abrir espaço para os modelos de negócios disruptivos, que são aqueles que impactam o setor, mudam a forma de consumir e têm possibilidades exponenciais de crescimento.

Segundo Schweitzer, este caminho é análogo ao estímulo dos lados direito e esquerdo do cérebro. O ambidestro utiliza os dois de acordo com a conveniência, e as empresas devem buscar essa junção. Ele alerta, no entanto, que quanto mais avançada for a corporação do ponto de vista digital, mais espaço ela terá para inovar.

O superintendente destacou a importância de estimular novos modelos mentais dentro das organizações de varejo, incluir todos os colaboradores como parceiros, abrir espaço para que eles mostrem suas ideias, que são novas perspectivas, e financiá-las quando as equipes estratégicas para tomada de decisões enxergarem viabilidade comercial e financeira – como, segundo ele, faz o Banco Carrefour.

Para provocar a plateia, Charles Schweitzer lembrou da Renova, uma empresa que ganhou o mercado inovando com papel higiênico. O primeiro lançamento foi o de cor preta e, depois do sucesso, ela ampliou a paleta de cores e a oferta dos produtos. Enquanto os comuns custam em média R$ 1,50, o rolo da Renova custa cerca de R$ 97. Ele é utilizado no Museu do Louvre, na França, como decoração. “Se é possível inovar em papel higiênico, é possível inovar em qualquer setor”, decretou Schweitzer.

E quanto aos modelos de sucesso disruptivos? Não se poderia usar melhor exemplo, disse o executivo, do que o do iPhone, que revolucionou o uso do celular e deu a ele novas funções e aplicabilidades. O mundo foi outro depois da invenção de Steve Jobs.

As expectativas do público, porém, focaram na próxima geração de iPhones e uma grande frustração tomou conta do mercado. Melhorias foram feitas, mas nada que alterasse radicalmente o rumo das coisas. É que a inovação não virá daí, disse Schweitzer. A empresa inovou, por outro lado, criando o Apple Watch, por exemplo.

De acordo com ele, antes o relógio tinha quatro características conforme o interesse do consumidor: modelos convencionais para mostrar as horas; modelos digitais e mais esportivos; modelos que incluíam GPS, utilizados por quem pratica esporte; e joias, como os da Rolex. O Apple Watch reuniu os quatro itens, entrou em todos os nichos com um único produto e transformou o mercado. “Este é o segredo [da disrupção]”, afirmou Schweitzer.

1º dia do Digitail sentencia: digitalização humanizada é a próxima etapa do varejo
Luiza Helena Trajano, presidente do Conselho Administrativo do Magazine Luiza, e Marcos Gouvêa de Souza, fundador e CEO da Gouvêa Ecosystem

O cliente é o centro de tudo

Luiza Helena Trajano, presidente do Conselho Administrativo do Magazine Luiza, foi a segunda convidada a falar na Digitail e seu painel, mediado pelo fundador e CEO da Gouvêa Ecosystem e publisher da Mercado&Consumo, Marcos Gouvêa de Souza, incluiu interação com o auditório.

A empresária responsável por levar o Magazine Luiza de Franca para todo o Brasil contou que o sucesso do Magalu é consequência de “colocar o cliente no centro de tudo e, a partir desta conexão, atender as suas necessidades”.

A marca nasceu no físico, como varejo tradicional, no interior de São Paulo, e migrou para o online quando chegou a onda do e-commerce. Hoje, é uma empresa de capital aberto e multicanal, isto é, oferece ao seu cliente os produtos que ele deseja, do seu próprio estoque, de parceiros, do marketplace, a qualquer hora, e como ele quiser.

O resultado foi um faturamento de R$ 60 bilhões em 2022, mesmo com a alta de juros e a ressaca da crise de consumo que afeta o varejo na fase pós-pandemia.

Luiza Helena Trajano destacou algumas estratégias e inovações do Magazine Luiza, como fazer da assistente virtual Lu a porta-voz da marca à medida que sua influência cresceu. Hoje, ela é a maior influenciadora digital do mundo, com 31,2 milhões de seguidores nas redes sociais, à frente da boneca Barbie. A assistente foi sendo humanizada, gerando vínculo com os consumidores e impacto positivo nas vendas.

Porém, estratégia nenhuma funciona se a organização perder de vista o consumidor, e Luiza foi incisiva sobre essa questão. “O que vai ficar [para o cliente] é atendimento e inovação, o resto é commodity”, disse ela. “A venda é o combustível da empresa e ela só continua acontecendo se o atendimento for bom”, completou.

A empresária compartilhou sua visão de negócio, mostrando os principais pontos que sustentam o Magazine Luiza como fenômeno do varejo: valores inegociáveis, como respeito ao consumidor e ética corporativa, valorização dos colaboradores e clareza do propósito da empresa, que é atender ao consumidor e tê-lo no centro de suas decisões.

Ela contou que mantém contato direto com clientes do Magalu por meio de suas redes sociais, canais por onde chegam algumas das reclamações dos compradores. Esse contato, além de colocar pressão sobre o time na solução dos problemas, também permite constante sintonia com este público em constante mudança.

Para garantir sua relevância, o grupo mantém diversos laboratórios de pesquisa, inclusive no exterior, para entender o comportamento e o perfil do consumidor e propor inovações. Chegou a adquirir empresas alimentícias para entender como funcionava o sistema de compra e entrega rápida.

O case C&A

Fernando Brossi, vice-diretor de Operações da C&A no Brasil, apresentou no Digitail o mapa que a empresa seguiu para ampliar o percentual de vendas no digital.

Fundada há 180 anos e presente no Brasil há 46, a C&A passou quatro décadas e meia de sua existência como empresa de capital fechado e focada na venda das lojas físicas. Segundo Brossi, menos de 2% das vendas saíam do digital e o desafio da empresa era crescer 2% em quatro anos.

Em 2019, a C&A se tornou uma empresa de capital aberto e, logo em seguida, com a pandemia da covid-19, acelerou as iniciativas voltadas para a digitalização das vendas. Entre erros e acertos, a varejista fechou 2022 com 17% das vendas oriundas das transações online – e pretende continuar a crescer.

A empresa investiu na tecnologia para transformar dados em resultados, melhorando a compra dos seus clientes, e na facilidade de entrega, que pode ser em domicílio e por meio de retirada na loja.

Um dos seus principais recursos foi o programa de relacionamento que promove benefícios na loja física para o cliente vip. Com 24 milhões de pessoas cadastradas, o contato via WhatsApp, feito por vendedores orientados pelas informações do perfil do consumidor, resulta em vendas na loja física em 80% das vezes. “O WhatsApp é uma importante ferramenta de recompra”, contou.

Para ele, as lojas físicas permanecem relevantes e ganham mais destaque com a possibilidade de oferecerem uma experiência de compra diferenciada do online. Este também é o meio pelo qual se pode atrair novos clientes, sobretudo no caso da C&A que, de acordo com Brossi, possui lojas em pontos estratégicos e de grande movimentação.

Isis Brum, em colaboração para Mercado&Consumo.
Imagens: André Ribeiro

Sair da versão mobile