Os 6 fatores que NÃO vão mudar no varejo e no consumo

Momentum nº 995

Eis a síntese do que entendemos que NÃO irá se alterar no varejo e no consumo nos próximos anos.

Este é aquele período do ano em que muitas previsões e análises são feitas abordando o que pode mudar e as tendências para um novo ciclo. Especialmente às vésperas da posse de um novo governo no Brasil, opositor ao anterior, é de fato relevante rever o que pode mudar nesse novo período. E isso talvez mereça um novo artigo proximamente.

Mas algumas coisas não irão se alterar e sua avaliação ajuda a entender o processo de evolução do próprio mercado e devem ser consideradas quando são repensados investimentos, prioridades, ameaças e oportunidades.

Eis a síntese do que entendemos que NÃO irá se alterar no varejo e no consumo nos próximos anos.

1. Aumento da participação do varejo de valor no total dos setores

É o resultado direto de uma conjugação de fatores que inclui um consumidor mais racional e ainda mais bem informado, pressionado por um quadro com baixo crescimento da renda real e um ambiente econômico global e local pressionado pelas circunstâncias que estimulam uma visão cautelosa da realidade de curto, médio e longo prazos. Para a maioria absoluta da população, o real mercado, esse quadro impõe um comportamento mais comedido de compras e consumo com escolhas de produtos, marcas, canais, formatos de lojas e negócios que ofereçam mais por menos. Até onde é possível prever, esse é um comportamento que não irá se alterar proximamente;

2. Aumento da concentração no varejo

O cenário mais competitivo gerado por um consumidor mais orientado para valor e as transformações precipitadas pela tecnologia e o digital levam a um processo natural de aumento do nível de concentração no varejo local e também nos mercados mais desenvolvidos. Com isso deve aumentar a participação dos cinco maiores operadores no conjunto dos negócios de cada setor, que é a medida de concentração de mercado usualmente usada. Isso ocorrerá em especial nos segmentos de alimentos, moda, eletrônicos, material de construção, artigos esportivos e alimentação fora do lar. Com algumas eventuais poucas exceções envolvendo novas categorias e segmentos, como os ligados ao digital e tecnologia;

3. Elevado nível de Informalidade

A conjugação perversa da alta carga tributária com sistemas burocráticos anacrônicos e mais a ausência de controle efetivo das importações subtaxadas contribuíram para o aumento do nível de informalidade no varejo brasileiro nos últimos anos, apesar do trabalho do próprio governo e dos segmentos formais de mercado para sua inibição. A perspectiva de uma reforma tributária com previsto aumento da carga de impostos incidentes no consumo deverá estimular alternativas de burla que devem manter elevado o nível de informalidade, ao menos no curto e médio prazos;

4. Aumento da participação dos alimentos prontos no conjunto das despesas com alimentação

É um movimento global que também ocorre no Brasil e tenderá a persistir. As mudanças dos hábitos das famílias envolvendo trabalho e alimentação levaram à expansão do percentual dos dispêndios com alimentos prontos ou semiprontos no total dos gastos com alimentação. No Brasil esse percentual está num patamar de 36% e com clara tendência de crescimento pela conjugação de uma demanda crescente pelo lado consumo e o aumento da oferta por pelo setor de foodservice com novas alternativas e níveis de serviço;

5. Alto nível competitividade no mercado

É o resultado direto de um cenário com consumidores ainda mais informados e conectados, vale dizer empoderados, mais focados em valor, com tendência de aumento da concentração de mercado e a importância de aumento de investimentos em tecnologia e digital para atender às demandas emergentes. Sem falar na informalidade, que permite operações com preços mais baixos concorrendo com o varejo formal. Esses elementos pressionam as margens brutas do varejo e os custos operacionais, gerando maiores pressões na rentabilidade líquida dos negócios que ainda são obrigados a continuarem investindo em novas plataformas de tecnologia em busca de racionalização de custos e melhoria da experiência dos consumidores. Como resultado temos um quadro de aumento da competitividade que também acelera a concentração;

6. Importância estratégica do varejo

A conexão direta com consumidores e a capacidade de monitorar, criar e desenvolver novos negócios e atividades usando o conhecimento atualizado sobre hábitos, desejos e comportamentos do mercado, segmentado, individualizado e preditivo, geraram para o setor de varejo um protagonismo natural. Esse processo se acelerou quando diversas organizações globais e locais se reestruturaram e se assumiram como Ecossistemas de Negócios, como foi o caso de Amazon e Walmart. Esse caminho foi seguido no Brasil por Magalu, Via, O Boticário e Americanas. O movimento estratégico estimulou que outros negócios e organizações também se reorganizassem com a mesma lógica, assumindo uma vertente varejista, como foi o caso de Ambev, Porto Seguro, Portobello, JBS e Vivo. Esse reposicionamento ampliou e continuará a ampliar a importância estratégica do setor, “anabolizado” pela crescente e decisiva incorporação dos canais e recursos digitais que permitem expandir as áreas, setores, segmentos e geografias de atuação, potencializando ainda mais seus ativos tangíveis e intangíveis.

Sem dúvida existiriam outros fatores que não se alterarão nos próximos tempos para o conjunto das atividades do varejo e do consumo, com potenciais variações geográficas e por segmentos. Essas seis nos parecem aquelas mais relevantes para serem consideradas quando se fizer uma análise mais abrangente do cenário e deveriam ser consideradas quando se pensa o presente e o futuro próximo desses setores.

Marcos Gouvêa de Souza é fundador e diretor-geral da Gouvêa Ecosystem e publisher da plataforma Mercado&Consumo.
Imagem: Shutterstock

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