A gestão de marca volta com força às tarefas dos executivos de vendas e marketing

A gestão de marca volta com força às tarefas dos executivos de vendas e marketing

Esse é um artigo de “wake up call”. No português claro, um “chacoalhão” (ou pegando mais leve, um sinal de alerta) para os gestores de marketing e vendas. Nos últimos anos, especialmente com a devastação dos negócios durante a pandemia e no período pós-pandemia, o esforço e a iniciativa dos executivos de empresas de médio e pequeno porte para fortalecer o valor de sua marca atingiram níveis alarmantemente baixos. E isso não é por acaso.

A palavra de ordem no período pandêmico era “sobrevivência” e todos na empresa estavam no “modo pânico” ou em crise. Um estado que coloca em alerta os sentidos mais primitivos nos negócios: incentivo ao fluxo rápido de vendas e faturamento a qualquer custo no curto prazo, especialmente através de promoções e vendas casadas.

Ninguém pode dizer que adotar esse modo pânico naquele período foi um erro estratégico dos executivos – inclusive nas grandes multinacionais – mas, acontece que o furacão Covid-19 se foi há pelo menos 24 meses e ainda testemunho uma parte considerável dessas empresas se movendo na direção mais tática das promoções.

A percepção atual é que o trauma causado aos negócios naquele período ainda permanece e que as empresas estejam precisando de uma espécie de terapia corporativa para se ver livre do mal da “tática de crise nos negócios” para se mover ao que chamo de “estratégia de valor agregado nos negócios”.

Infelizmente, nota-se um enorme contingente de empresas, incluo aqui muitas de grande porte também, que têm como modus operandi o “curto-prazismo” como modelo de atuação. E, essas, dificilmente sairão do modo crise mencionado. Ao contrário, aproveitaram a pandemia para justificar as atitudes táticas da operação e afastar de uma vez por todas um trabalho mais sustentável.

Sair do modo pânico e entrar na centralidade do usuário

Se você se sente um pouco ali, enclausurado neste território tático ou ainda no modo pânico, faço aqui uma proposta que pode começar a te fazer pensar mais a longo prazo.

Um bom começo para saltar do mundo tático para o estratégico é o de deslocar a perspectiva do olhar dos negócios: coloque-se no lugar de quem compra seus produtos ou serviços. Pergunte a si mesmo: qual é o atributo único de valor que, como consumidor de sua própria marca, seria suficientemente persuasivo para fazê-lo escolher e comprar seu produto ou serviço?

Se, ao refletir sobre a resposta, você só consegue identificar atributos que também estão presentes nos concorrentes — ou seja, características que toda a categoria utiliza como alavancas de venda —, você está preso a uma visão de curto prazo em seu modelo de negócios.

Provavelmente, isso significa que você depende de estratégias que não envolvem diferenciação de marca, mas compreendem as promoções, que ao contrário reduzem a margem, negociações com fornecedores, ou a busca incessante por novas fórmulas de distribuição.

Essas são soluções táticas e de sustentação limitada. Na verdade, elas corroem o valor e a margem do seu negócio, pois não oferecem valor agregado ao usuário em um mercado competitivo onde é fácil replicar fórmulas que entregam apenas o produto, sem um diferencial real.

Esse é um pensamento do marketing deste século. Ele se alinha com o que há de mais moderno no marketing atual, conhecido como “customer centricity”. Em português, poderíamos traduzir essa expressão como ‘centralizar a visão da sua marca nas necessidades e dores do usuário.’

Implicada nessa abordagem está a ideia de que produtos, por si só, são commodities. A verdadeira diferenciação está vinculada a um conjunto de valores que transcendem o tangível e se consolidam no campo do intangível, criando uma oferta completa e única para o usuário — exatamente aquilo que ele espera e valoriza.

O influenciador digital não é uma resposta estratégica para sua marca

Antes da pandemia, gestores de marketing e vendas estavam — e ainda estão — fascinados pela ‘cauda longa’ das redes sociais e pelos influenciadores que, de certa forma, facilitam a sustentação da imagem de marca.

No entanto, a realidade é clara: esses influenciadores ocupam um espaço intermediário entre o tático e o estratégico. Por quê? Porque eles estão no negócio de emprestar visibilidade às marcas e raramente contribuem para a construção de valor de marca que vai além disso.

Embora a visibilidade seja um atributo desejável e possa gerar desejo de consumo e até conversão em vendas, um influenciador tem o poder de aumentar a exposição e endossar sua marca, mas raramente consegue moldar a verdadeira identidade do que ela é para torná-la única.

E é exatamente sobre essa construção que estamos falando neste artigo: sobre o que sua marca realmente é e o que ela representa, como se comporta junto aos seus usuários e stakeholders, o que ela oferece de racional e subjetivo, e qual é o impacto que ela gera na sociedade onde atua. Nada disso se constrói por meio de um simples merchandising com influenciadores.

Releia o parágrafo anterior. Identifique cada elemento mencionado e conecte-os à sua marca. Consegue obter boas respostas?

O deslocamento das responsabilidades de construção do “equity” de sua marca para um influenciador é um passo perigoso para a sua sustentabilidade. E esse é um movimento de gestão de marca que estou vendo com bastante frequência no Brasil, uma vez que temos números olímpicos nesse território.

De acordo com os últimos relatórios da Nielsen e da We Are Social, o Brasil tem mais de 500.000 influenciadores considerando 10.000 o número de seguidores, superando o número de engenheiros civil (455.000), dentistas (374.000) e arquitetos (212.000). E empata com o número de médicos, hoje estimado em 522.000 profissionais.

Esse enorme número de influenciadores pode inebriar o gestor e fazê-lo confundir quantidade e qualidade (eficácia) da ação no que diz respeito à construção de valor de marca.

Lustrar a marca e gerar valor para o negócio e para sociedade

Retorna às mãos do gestor de marketing e vendas a responsabilidade de assegurar que os valores de marca estejam claramente definidos e compreendidos tanto internamente, quanto externamente à companhia para que todos os stakeholders, inclusive os influenciadores, entrem em cena para se relacionar com seu produto ou serviço.

“Lustrar” uma marca nos dias de hoje significa muito mais do que simplesmente melhorar sua visibilidade através de influenciadores; trata-se de enriquecer seu valor intrínseco para ela poder construir vínculos fortes com seus consumidores, tendo em mente que vínculos fortes levam à lealdade que por sua vez leva ao aumento de margem.

Uma marca bem trabalhada é mais do que apenas um nome ou um logotipo. Ela passa a representar uma promessa clara e confiável na mente dos consumidores. Esse alinhamento entre a percepção da marca e os desejos e necessidades dos consumidores facilita a decisão de compra, pois ela se destaca de forma nítida em meio à concorrência. A clareza na proposta de valor reduz a incerteza do consumidor, simplifica o processo de escolha e, consequentemente, aumenta as taxas de conversão.

Confiem em seus fornecedores de comunicação. Compartilhem seus objetivos e sua perspectiva concorrencial atual e estabeleçam juntos (e estrategicamente) o papel de sua marca e seu impacto na sociedade. Lembre-se que saímos do “modo pânico” e estamos alcançando voo de cruzeiro.

As promoções foram vitais e te trouxeram até aqui. Mas trago aqui um ditado de um general e estrategista de guerra chines, Sun Tzu, que diz que “a estratégia sem tática é o caminho mais lento para a vitória. Tática sem estratégia é o ruído antes da derrota”.

Seja feliz.

Ulisses Zamboni é chairman e sócio-fundador da Agência Santa Clara.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.

Imagem: Shutterstock

Sair da versão mobile