Os shopping centers brasileiros caminham a passos largos na evolução do seu modelo de negócio. Aos poucos, deixam de ser somente locadores de espaços comerciais para abraçar a ideia, mais abrangente, de conectar compradores e vendedores – e não apenas dentro do mall.
Movimentos recentes de duas das maiores administradoras do País comprovam que essa estratégia tende a ganhar mais espaço na agenda dos shoppings nacionais. A brMalls, que em 2019 abriu a mídiaMALLS para explorar publicidade em empreendimentos da companhia e de terceiros, anunciou na semana passada a compra da Helloo, empresa de mídia out of home (OOH) especializada em telas em edifícios residenciais. Antes disso, em setembro, a Aliansce Sonae (ALSO) criou uma Diretoria de Mídia, trazendo para o cargo Jued Andari, ex-executivo da Eletromidia, empresa com a qual a ALSO já havia estabelecido, antes da pandemia, uma joint venture para comercializar em conjunto publicidade em shopping centers e outros locais.
O que está por trás dessas movimentações?
Ambas as companhias estão de olho em um mercado crescente, que é o da mídia exterior. Para dar uma ideia da importância desse filão, vale dizer que a TV aberta concentra ainda cerca de 52% dos nossos investimentos publicitários. Em segundo lugar vem a internet, com quase 27% das verbas. Na sequência aparece a mídia OOH, com 8,6%. No entanto, a venda de publicidade em shoppings representa apenas 5% dessa fatia do OOH.
O resultado ainda tímido da mídia em malls está relacionado à necessidade dos anunciantes nacionais, donos das verbas mais gordas, de contar com uma rede que permita ampla exposição. Portanto, também aqui, escala e penetração fazem diferença. Nesse cenário, quem tentar vender publicidade isoladamente poderá enfrentar dificuldades em ampliar negócios para além dos anunciantes locais ou, no máximo, regionais.
Isso explica por que empresas como Gazit, Almeida Junior, Paulo Octavio, Tacla e Terral, entre outras, decidiram integrar a rede formada pela midiaMALLS, que hoje soma 71 shoppings em todo o País, dos quais a brMalls é dona de apenas 31. Com a Helloo, a mídiaMALLS passará ainda a oferecer mais 4.300 telas em prédios residenciais, capazes de alcançar mais de 190 mil famílias que vivem no entorno dos seus shoppings. Dessa forma, lojistas e anunciantes poderão acessar os consumidores em outro momento da sua jornada, ainda nos condomínios onde moram.
A aposta da Aliansce Sonae é ainda mais ambiciosa. Para entrar de vez no radar dos grandes anunciantes, firmou parceria com a Eletromidia, que possui 60 mil telas em aeroportos, prédios residenciais e comerciais, mobiliário urbano, ruas e shoppings. No momento, 9 empreendimentos da ALSO fazem parte do acordo, quantidade que deverá chegar a 12 até março do próximo ano. Parte dos espaços continua sob responsabilidade da Aliansce Sonae, que pode dispor deles para anunciar seus eventos, vender publicidade localmente ou promover parcerias com marcas, ou lojistas. Os demais estão compondo pacotes diversificados, oferecidos às agências e áreas de marketing de importantes empresas.
A digitalização dos equipamentos, em acelerada expansão nos shoppings da rede, é etapa essencial nesse processo. Afinal, um banner estático abriga uma única mensagem, enquanto o digital permite múltiplas exibições, aumentando a quantidade de espaços comercializáveis. A digitalização também agrega versatilidade para anunciantes, que podem ajustar à distância as mensagens segundo suas necessidades e características de cada centro comercial.
As estratégias desses dois gigantes para explorar receitas de publicidade, embora parecidas, guardam uma diferença fundamental. A brMalls tenta construir um ecossistema próprio, comprando empresas como a Led Channel, em 2019, e agora a Helloo. Já a ALSO escolheu fazer parte de um ecossistema poderoso já existente, liderado pela Eletromidia. Não existe caminho certo ou errado, mas será interessante acompanhar os resultados de ambas. Na brMalls, por exemplo, as receitas de mídia já representam 4% das receitas líquidas. Para Ruy Kameyama, CEO da companhia, esse índice pode chegar em breve a 20%, superando até mesmo a contribuição dos estacionamentos.
Ao expandir o conceito do shopping center para um lugar onde as pessoas se divertem, socializam, fazem descobertas, solucionam problemas e até compram, os shoppings podem atrair mais público. Porém, ao mesmo tempo, precisam criar oportunidades para monetizar esse tráfego de clientes qualificados. Uma das maneiras de alcançar isso é desenvolvendo uma rede para venda de publicidade e experiências de marca. Faz todo o sentido.
O desafio, mais uma vez, é cultural. Porque esse é um jogo que, para fazer diferença na última linha, precisa ser jogado em conjunto. Tudo indica que, para obter a atenção dos grandes anunciantes, será preciso renunciar a parte do controle (e das receitas) e integrar um dos ecossistemas estabelecidos. Ou investir pesado para criar o seu.
As cartas estão na mesa.
Luiz Alberto Marinho é sócio-diretor da Gouvêa Malls.
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