NRF 2024: Os desafios para o varejo no Brasil e no mundo além da Inteligência Artificial

A NRF 2024 mostrou a força da inteligência artificial para impulsionar os negócios de varejo, seja para encontrar o consumidor onde ele estiver, seja para oferecer algo que ele não sabia que precisava, seja para empoderar o vendedor, seja na retaguarda dos negócios, agindo para diminuir as rupturas, repor estoques, etc.

O que não faltou na NRF foram exemplos de usos de tecnologia, especialmente a IA, para impulsionar negócios. Muitas dessas iniciativas ainda estão na fase de teste e por isso não foram dados muitos detalhes pelos líderes de empresas que palestraram na feira.

O que me chamou a atenção, por outro lado, foram as muitas palestras que trataram do momento ainda incerto que vive o mundo. O conceito de “permacrisis” ou crise permanente trazido pela Kantar foi um dos muitos termos que ilustram o que está por vir em 2024 em um cenário ainda muito incerto.

São muitos os conflitos em andamento no mundo, com destaque para a guerra Rússia x Ucrânia, entrando em um momento crucial, o conflito entre palestinos e israelenses, que parece longe de uma resolução e pode escalar para um conflito regional de grandes proporções. A tensão EUA versus China também pode escalar, principalmente em um ano de eleições nos EUA, onde o clima entre os candidatos tende a subir e o tema China deve ser muito tratado nos debates.

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Entrando no tema eleições, este ano, nós teremos eleições em mais de 50 países, incluindo eleições presidenciais em grandes democracias como EUA, Índia, Reino Unido, México e outras eleições que são mais encenações do que pleitos reais como na Rússia e Venezuela. Nenhuma delas tem o peso da eleição em Taiwan, que pode acirrar ainda mais as tensões entre EUA e China, dependendo do candidato vencedor.

Em um mundo polarizado ao extremo, eleições tendem a tornar a discussões ainda mais intensas. No Brasil, teremos as eleições municipais, menos intensas que as majoritárias, mas ainda assim inspiram cuidados pelo poder mobilizador que tem nas pessoas, suas crenças e preferências por marcas e produtos.

A polarização mexe com a cabeça das pessoas e as doenças emocionais são um fator importante a ser levado em conta por marcas e produtos. Na palestra de Kate Ancketill, da GDR, ela falou sobre a crise de ansiedade e solidão que ainda afeta muito as pessoas e principalmente os mais jovens.

As marcas terão um papel importante para abraçar e criar vínculos verdadeiros com estes consumidores. Não se trata de uma estratégia de marketing para vender ou ganhar participação de mercado, mas, sim, entender as dores efetivas desses consumidores e ajudá-los a passar por este ciclo que ganhou peso na pandemia e segue forte.

Outra forma de polarização pautada na NRF 2024 é a econômica, que foi tratada na palestra de Andréa Bell, da WGSN, e em outras palestras mais focadas em economia. O mundo continua desigual, com os mais ricos acumulando mais riqueza enquanto as parcelas mais pobres da população ficam ainda mais miseráveis. Este não deve ser tratado apenas como um problema de governos.

As marcas têm um papel importante de inclusão, e há iniciativas, ainda que incipientes, para tornar o consumo menos discrepante. A inflação, embora mais controlada no Brasil do que em outros mercados, permanece um problema, pois corrói o poder de compra da população, diminuindo a renda disponível para o consumo, além dos itens mais essenciais. Este ainda é um desafio que só deve ser minimizado em 2025.

Por fim e não menos importante, em várias das palestras e nas visitas técnicas que fizemos, nós vimos uma preocupação crescente com a sustentabilidade e o uso correto de matérias-primas, embalagens, com as pessoas e o meio ambiente. O consumidor passou a ter um papel fundamental para zelar pelo uso correto de produtos e sua destinação. Ele será menos consumidor e mais guardião das marcas.

Kate Ancketill trouxe o tema dizendo que estamos chegando ao fim da era do desperdício e que a economia circular deve ganhar tração nos próximos anos. Foram muitos os exemplos de iniciativas e negócios que trataram do tema e o impacto na cadeia de varejo e consumo será enorme. Uma das operações que visitamos foi a The RealReal, que é uma marca que vende produtos de luxo de segunda mão ou “pre loved” (pré-amados) como a marca intitula seus produtos.

A dinâmica de funcionamento deste tipo de varejo é bem distinta do que estamos acostumados a ver. Ao invés de fornecedores pessoa jurídica, são as pessoas que fornecem os produtos que serão vendidos nas lojas.

Há um time de profissionais que autenticam a procedência e veracidade destes produtos, o que é diferente do que existe atualmente. E há toda a questão de precificação e fiscal, igualmente distinta e complexa. A loja é um grande sucesso de público e está próxima de ser uma operação lucrativa, que já é modelo para muitas outras que existem e que virão por aí.

A Inteligência Artificial pode ter sido a protagonista da feira este ano, mas as “pulsões” que vão nortear o consumo e as operações de varejo vão muito além da tecnologia. Vamos acompanhar o desenrolar deste ano e suas implicações nos negócios.

Ricardo Contrera é sócio-diretor da Mosaiclab.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
Imagens: Mercado&Consumo e Reprodução

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