5 reflexões sobre foco, segmentação e diversificação no varejo

Foco no varejo

O dilema é clássico. Quando é tempo de focar ou segmentar e diversificar? Quando uma empresa está madura para avançar do foco em sua operação tradicional e avançar estrategicamente para segmentar ou diversificar?

No mercado brasileiro, a Renner, criada em 1981, evoluiu e consolidou seu modelo de loja de departamentos focada em moda, com majoritária participação de marcas próprias antes de considerar outros formatos, canais e marcas, mas hoje opera Camicado, Youcom e Ashua no Brasil e, mais recentemente, passou a operar também no Uruguai e Argentina, em sua primeira incursão internacional.

O espanhol Grupo Inditex, controlador da Zara, evoluiu rapidamente em sua proposta de diversificação de formatos, canais e marcas e opera também Massimo Dutti, Stradivarius, Zara Home, Pull and Bear, Oysho, Bershka, entre outras em mais de 7 mil lojas em 96 países, numa proposta de segmentar conceitos, marcas e formatos, totalmente baseado num modelo de negócio próprio com 100% das vendas em marcas próprias.

Também da Espanha, fundada em 1940, o El Corte Inglés, concentrou em seu formato original de lojas tradicionais de departamentos e expandiu conceitos dentro da Espanha incluindo formatos, marcas, canais, como supermercados, conveniência, artigos para o lar, moda e negócios, envolvendo também serviços como telefonia, informática e agência de viagens, tornando-se líder inconteste em seu país antes de expandir para fora, em Portugal.

Mesmo caminho das chilenas Falabella e Cencosud, que ampliaram e diversificaram seus formatos, marcas e negócios de varejo e serviços financeiros, incluindo marcas próprias liderando sua atuação naquele país, antes de expandirem na América do Sul.

Em Portugal, o Sonae tornou-se líder com os super e hipermercados Continente e evoluiu para incorporar formatos, marcas, canais e negócios diversos como foodservice, pet, farmácias, serviços médicos e odontológicos, atividades financeiras, papelaria, eletroeletrônicos, artigos esportivos e serviços automotivos. Além de ampla atuação com marcas próprias.

No Brasil, o grupo Guararapes,controlador da Riachuelo, desenvolveu seu modelo quase único no mundo de integração vertical do fio ao carnê, como gosta de enfatizar, das lojas focadas em moda, com dominância de marcas, cartão e produção próprios antes de considerar qualquer diversificação ou segmentação.

E, aparentemente, agora irá operar um novo negócio com lojas exclusivas da Carter’s, quando também seu banco, evolução da operação financeira Midway está prestes a ser aprovado pelas autoridades.

A Tesco, na Inglaterra diversificou formatos e negócios, incluindo super, hipermercados e conveniência e mais serviços de telefonia, viagens e financeiros, sempre com variantes de sua marca Tesco, também apoiada em forte presença de sua marca própria que em algumas categorias chega a ter até cinco variantes de produtos, embalagens e marcas.

Na Coreia, o grupo Shinsegae, um dos principais operadores do varejo local, a partir de suas operações de alimentos, evoluiu para diferentes formatos, canais, conceitos e marcas numa estratégia muito peculiar de buscar formatos que deram certo, especialmente nos Estados Unidos, e reproduzi-los adaptados no país.

Assim Costco, Container Store e muitos outros conceitos, em varejo e foodservice, têm seus equivalentes locais. E só recentemente decidiram avançar para outros mercados, através de aquisições de três redes de supermercados nos Estados Unidos.

Walmart, ainda maior varejista do mundo, concentrou-se durante muito tempo num só formato de loja, o de loja de departamentos com alimentos de descontos, cresceu, expandiu e se consolidou, inclusive com forte de diversificar formatos, canais e áreas de atuação. O grupo tem hoje valor de mercado próximo a US$ 335 bilhões.

Quando perdeu eficiência, preferiu recuar e se concentrar, vendendo ou fechando no Chile, no Brasil e outras operações, concentrando seus negócios nos formatos mais tradicionais e no forte investimento no digital, para enfrentar o desafio, principalmente vindo da Amazon.

Esta, por sua vez, iniciou seu negócio como plataforma de venda digital e expandiu rapidamente, dentro da lógica da nova economia tendo prejuízos por muitos anos, incorporando serviços, cloud e pessoais, marcas próprias, incorporou outros negócios (Zappos, Whole Foods e outros), expandiu globalmente e em 26 anos, alcançou valor de mercado atual próximo a US$ 940 bilhões.

Já a Costco, segundo maior varejista do mundo, baseado exclusivamente em seu conceito/formato Wharehouse Club, incorporou categorias, negócios, serviços e o e-commerce, com crescente participação de marcas próprias e tem valor de mercado atual de US$ 142 bilhões.

Na China, o Alibaba concentrou-se numa fase inicial em seu modelo de e-commerce Market Place para produtores locais vendendo na China inicialmente e depois em todo o mundo e  expandiu exponencialmente, multiplicou, diversificou, segmentou e cresceu de forma tentacular com seu modelo de Ecossistema de Negócios e em pouco mais de 20 anos se tornou um conglomerado global com valor de mercado próximo a US$ 560 bilhões.

Tão espetacular quanto Alibaba é o caso da também chinesa Tencent, um modelo igualmente organizado como Ecossistema, que começou como empresa de games em Shenzhen e também se expandiu de forma impressionante, diversificando, incorporando negócios e evoluindo até atingir em apenas 22 anos o valor de mercado atual de US$ 470 bilhões.

Dá para concluir algo?

A resposta clássica, especialmente de consultores, é que cada caso é um caso.

Mas talvez alguns pontos merecem reflexão:

1 – É simples e talvez perigoso demais buscar inspiração nos movimentos estratégicos dos maiores players ignorando a análise acurada da realidade de mercado e da concorrência em cada momento e as alternativas que se apresentavam. E nesse conceito os consultores estão certos;

2 – O foco foi importante para muitas empresas criarem uma base sólida antes de avançarem para diversificação ou segmentação dentro dos modelos clássicos de organização e gestão de negócios;

3 – A nova economia digital transforma dramaticamente a realidade e os parâmetros tradicionais de avaliação do momento certo para os movimentos corretos e tudo isso precisa ser revisto dentro de uma nova lógica que muitas vezes afronta nossa visão tradicional;

4 – Novos modelos de organização e gestão de negócios podem, eventualmente, antecipar movimentos estratégicos que no passado seriam considerados temerários. Mas também toda simplificação embute enormes riscos;

5 – Num cenário de metavolatilidade, como o atual, o momento certo e a oportunidade correta para a diversificação e segmentação de negócios no varejo acontece de forma muito mais rápida do que imaginávamos no passado e o tempo para as iniciativas, janelas de oportunidades, ou reações, se tornaram muito mais curtos.

NOTA: algumas dessas reflexões foram atualizadas nas discussões e apresentações feitas durante o Retail Trends – Pós NRF 2020 realizado em São Paulo no dia 6 de fevereiro e que agora são apresentadas em importantes cidades no Brasil. Veja abaixo a agenda completa:

Agenda Retail Trends Pós NRF 2020
05/03 – Rio de Janeiro
11/03 – Recife
18/03 – Porto Alegre
24/03 – Salvador
02/04 – Belo Horizonte
07/04 – Florianópolis

* Imagem reprodução

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