Sempre ouvi a frase “vista a camisa do outro para entender o que ele sente”. Empaticamente, eu procurava fazer isso, mas me perguntava se era mesmo possível. Era como tentar fazer leituras telepáticas para captar o pensamento do outro. Acho que ainda não tenho esse poder, no entanto, confesso fazer isso muitas vezes. Tenho certeza de que todos nós fazemos.
O importante é reconhecer que estamos em profunda transformação e que podemos aprender sempre. Para mim, a questão de vestir a camisa, ficou bem mais clara quando uma amiga negra me contou que sempre ensinou seus filhos a guardarem as notas fiscais depois de comprarem algo num shopping, por exemplo, pois se alguém abordá-los insinuando roubo, eles têm como provar a compra.
Ela se cansou de ver o filho mais velho sendo parado em blitze policiais para revistar o carro. As minhas filhas nunca passaram. Por isso, nunca tive de ensiná-las como minha amiga faz. Nem faço ideia de quantos detalhes ela e seus filhos passam no dia a dia, então, não adianta vestir a camisa para entender.
Por isso, a diversidade é importante. Damos um salto quântico quando saímos da zona de conforto para ter discussões saudáveis com pessoas fora da nossa bolha. E como passamos nosso maior tempo dentro das empresas (mesmo depois da pandemia em que muitos estão in home), as estruturas corporativas têm de provocar essas mudanças internas em cada indivíduo.
No entanto, o que mais tenho visto são ações marketeiras que promovem a representatividade, trazendo mais mulheres, negros, trans para mostrar que promovem a equidade. No ano passado, a consultoria de gestão organizacional Korn Ferry fez um estudo e mostrou que um principais erros das empresas é utilizar estratégias de contratação para atingir os 50/50 de colaboradores homens e mulheres. Porém, muitas vezes não identificaram a real causa de ter uma lacuna em diversidade e inclusão.
De nada adianta proporcionar políticas relacionadas à maternidade, se seus líderes continuam fazendo piadas sexistas entre outros itens que envolvem discussões profundas. Não é intenção fazer parar o ponteiro com as ações de diversidade, mas promovê-las de forma genuína.
Outro questionamento que faço é: se estudos mostram que diversidade traz lucro, por que é tão difícil promover essa mudança?
Mais do que o lucro, há uma questão de segurança mental que nos protege para não sermos devorados. Ainda com pensamentos pré-históricos de homens da caverna, isso envolve privilégios e poder que não queremos perder. Tudo que é diferente e provoca ameaça, eu excluo. Não é assim?
Por isso, a discussão é mais profunda. E nosso ponteiro não se mexe tão rápido como queremos. Mas o que podemos fazer? Confira algumas sugestões que têm feito a diferença em empresas que promoveram uma expansão de consciência, engajam colaboradores e transformam a comunidade onde atuam:
– Veja quais são as dores de sua empresa: Seus líderes são capacitados para lidar com as próprias dores? Se não estiverem, como vão liderar pessoas? Uma boa parte dos líderes acredita que todos a sua volta precisam mudar, menos eles.
– Promova rodas de conversas entre os colaboradores com temas diversos: Há empresas promovendo leitura de livros e discussões críticas em cima deles.
– Saia da sua bolha: Frequente eventos de outros setores para ter mais insights.
– Procure empresas que são cases para trocar ideias: Um livro que li recentemente “Pedaços de Brasil que dão certo”, de Roberto Tranjan, mostra vários exemplos de companhias que promovem a economia ao natural, ou seja, vida e trabalho com o mesmo propósito.
– Compartilhe conhecimento. Guardar para você, não transforma a sua vida e nem das outras pessoas.
Sandra Takata é presidente do Instituto Mulheres do Varejo.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
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