Acompanhar as transformações do varejo sempre foi fascinante. Durante anos, as mudanças eram facilmente percebidas a olho nu — bastava entrar em uma loja para notar as novidades. Mas depois de assistir a dezenas de apresentações na NRF e explorar o varejo de Nova York, ficou claro para mim que a revolução do setor vai muito além do que se vê.
Sim, há inovações impactantes, chamativas e até instagramáveis que capturam a atenção do público. Mas também mudanças profundas — aquelas que redefinem a relação entre marcas e consumidores — que são invisíveis para quem apenas passa por uma loja. Elas acontecem nos bastidores, silenciosamente moldando o futuro do varejo.
Desenvolver a habilidade em balancear a transformação visível e invisível é o que diferencia empresas que apenas seguem tendências daquelas que constroem o futuro.
Transformações visíveis – “Aquilo que só o ambiente físico pode oferecer”
Experiências de varejo: conexões imersivas e sensoriais
Os espaços de varejo estão cada vez mais projetados para estimular experiências multissensoriais e conexões mais fortes. Ao visitar a American Girl essa transformação fica evidente quando a loja oferece um salão de beleza para bonecas, em que as donas podem participar de experiências práticas, estilizando o cabelo de suas bonecas e até mesmo perfurando suas orelhas. Esse ambiente não apenas promove uma conexão profunda entre as meninas e suas bonecas, mas também aprofunda a experiência em uma atmosfera rica em sensações.
Ao criar experiências tão memoráveis e personalizadas, a American Girl reforça a relação com sua marca, em um ambiente que cria momentos memoráveis que cativam os sentidos dos clientes, tornando o varejo físico um destino por si só.
A profundidade do design da loja e merchandising visual
Os varejistas estão constantemente repensando seus layouts de loja e estratégias de merchandising visual para criar ambientes envolventes e visualmente para se diferenciares dos seus concorrentes e do online.
A flagship da Petco na Union Square, representa uma enorme transformação no varejo de produtos para animais de estimação, oferecendo uma experiência única refletindo a cultura e o design de Nova York. O ambiente da loja é formado por tijolos expostos e iluminação inovadora, incluindo 75.000 luzes de LED que mudam de cor em suas árvores cenográficas.
A loja foi projetada para criar um ambiente acolhedor e comunitário. Destaco um salão de estética para pets, uma cozinha que prepara diariamente alimentos frescos para cães e uma marca própria super fashion de roupas e acessórios. O layout da loja proporciona uma experiência de compra imersiva que celebra a conexão entre os pets e seus tutores, ao mesmo tempo em que promove um espaço em que os clientes podem relaxar e se envolver com a comunidade pet.
Parcerias e colaborações exclusivas para as lojas
O que mais me chamou a atenção na visita à Target foi a maneira inteligente como a marca usa parcerias exclusivas para diferenciar sua oferta e elevar a experiência de compra. Em vez de simplesmente vender produtos, a Target cria conexões únicas com seus consumidores, tornando cada visita à loja uma descoberta.
Um ótimo exemplo disso é a colaboração com a Pepsi para lançar uma edição limitada de um novo sabor da água Bubly — algo que só pode ser encontrado lá. Ou a parceria com o musical Wicked, que resultou em mais de 100 produtos exclusivos para os fãs. E ainda há o Furry Friends, uma coleção criada com pet influencers (sim, animais de estimação que fazem sucesso nas redes!), que souberam surfar na tendência do mercado pet de forma inovadora e proprietária.
Esses casos mostram como a Target transforma parcerias em diferenciais estratégicos, oferecendo produtos inovadores e desejados que simplesmente não existem em nenhum outro lugar. Mais do que vender, a marca cria histórias, experiências e motivos para os clientes voltarem.
Integração omnicanal
A fusão dos canais físicos e digitais está mais fluida e os varejistas estão focando na criação de uma presença de marca coesa em múltiplos pontos de contato, melhorando a conveniência e a satisfação do cliente.
Na NRF, a Foot Locker mostrou como seu app tem se tornado um ponto central na experiência de compra nas lojas físicas, permitindo que seus clientes acessem suas recompensas de fidelidade, informações sobre produtos e ofertas personalizadas, criando uma experiência omnichannel perfeita. Ao unificar os ambientes de compra digital e físico, a Foot Locker não apenas melhora a satisfação do cliente, mas também ajuda a se posicionar na evolução das experiências de varejo.
Transformações Invisíveis – “Dados e tecnologia a favor do negócio do varejo”
Gêmeos digitais
A Inteligência Artificial já provou que pode transformar os negócios em várias frentes: aumentando a eficiência operacional, elevando a experiência do cliente, dando mais autonomia aos colaboradores e acelerando a tomada de decisões. Mas ver isso na prática é outra história. A apresentação da NVIDIA foi de tirar o fôlego ao mostrar seus agentes de IA — sistemas treinados com conteúdo e dados específicos que conseguem perceber, analisar e tomar decisões sozinhos. Sim, de forma totalmente autônoma!
O case da Lowe’s, gigante do varejo com quase 2.000 lojas, levou essa revolução para outro nível. A empresa implementou os Gêmeos Digitais, solução da NVIDIA que criou versões digitais de 1.700 lojas para simular o comportamento dos clientes em diferentes cenários.
Tudo é testado no ambiente virtual: precificação, disposição dos produtos, otimização do trajeto dos colaboradores, localização ideal de estoques e muito mais. Depois de validar os melhores formatos no mundo digital, a Lowe’s implementa as mudanças no mundo físico com segurança e eficiência.
Isso não é mais uma visão de futuro — é o presente sendo redesenhado pela IA. E estamos só no começo.
Assistentes de compras pessoais movidos por IA
Já nos bastidores, a tecnologia de IA está capacitando os consumidores por meio de assistentes de compras pessoais criando uma experiência de compra mais personalizada. O Walmart está testando um assistente de compras com IA em seu app, que ajuda clientes a encontrarem produtos de forma muito personalizada.
Com interações em linguagem natural, como “Qual TV é melhor para assistir futebol?”, a assistente oferece recomendações sob medida. Essa iniciativa integra IA para tornar a experiência de compra mais prática e hiperpersonalizada.
Agilidade operacional do foodservice
O foodservice traz diferentes exemplos de transformação de seus modelos operacionais para responder rapidamente aos pedidos dos consumidores. Essa é uma mudança invisível, mas melhora a experiência de compra por meio da disponibilidade ágil dos pedidos mais populares.
A Starbucks foi um ótimo exemplo do uso inovador da Inteligência Artificial, a IA Deep Brew. Ao implementar a IA, a Starbucks capacita seus baristas a gerenciarem e atenderem com agilidade os pedidos feitos na loja ou pelo app, otimizando todo o processo com base em dados em tempo real, como pedidos de bebidas personalizadas em períodos de pico.
Essa integração não apenas garante que os clientes recebam seu café personalizado dentro de 4 minutos, mas também permite que os baristas se concentrem em oferecer um atendimento mais personalizado, promovendo uma atmosfera calorosa e acolhedora.
Para concluir: indo além do óbvio…
Precisamos ir além do óbvio e desenvolver um olhar mais profundo sobre as transformações do varejo. Apenas visitar uma loja e tirar conclusões já não é suficiente. O setor está passando por mudanças radicais que impactam tanto a experiência do consumidor quanto as engrenagens que mantêm tudo funcionando nos bastidores.
E é justamente nos bastidores que a verdadeira revolução acontece — exigindo esforço, adaptação e até novos indicadores para medir o impacto real no negócio. Enquanto as mudanças visíveis, como experiências imersivas e inovações voltadas ao cliente, chamam atenção e geram engajamento, são as transformações invisíveis — impulsionadas por tecnologia, flexibilidade operacional e evolução contínua — que criam um impacto mais profundo, consistente e duradouro.
O futuro do varejo não será definido apenas pelo que vemos, mas também pela combinação do que está sendo construído por trás das cortinas. E quem entender isso primeiro, sai na frente.
Alexandre van Beeck é executivo de CX, Inovação, Estratégia e Negócios.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
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