As eleições passaram, a fervura começa baixar, a renovação do Congresso é uma realidade, os nomes que comporão a cúpula do novo governo têm confirmado a proposta mais estrutural, o mercado financeiro mostra-se positivo e o mercado consumidor continua em banho maria.
E assim o país caminha para a perspectiva de um período de moderada recuperação.
Parece haver um claro consenso de que o conjunto dos estragos promovidos que trouxe o recorde de desemprego, brutal desequilíbrio fiscal, estagnação econômica e perda de capacidade competitiva global do Brasil não será revertido, nem fácil e muito menos rapidamente.
Até porque sua reversão depende de reformas estruturais que poderão afetar pretensos direitos e causar incômodos que precisam ser negociados num regime democrático.
Na questão do consumo, e consequentemente do comportamento do varejo, o Brasil está pronto para um ciclo de retomada balizado por uma leve recuperação da massa salarial real, inflação baixa e sob controle, pelo aumento do índice de confiança do consumidor e pela redução consistente da inadimplência, endividamento das famílias e comprometimento de renda futura com débitos do passado.
Porém, ainda com taxas de juros muito altas com crédito restrito e concentrado, resultados de um modelo financeiro que precisa ser aperfeiçoado.
Há muito por ser revisto, re-enquadrado, repensado, modificado, implementado e monitorado, promovendo os ajustes que sejam necessários.
Manda o bom senso que não se criem ilusões sobre o quanto há para ser alterado num prazo relativamente curto de tempo e tendo contra si um enorme arcabouço de complicações gestadas nos períodos passados.
Vai precisar haver muito trabalho e muita determinação para enfrentar o que precisa ser enfrentado.
Mas pelo menos dois pontos deve-se ter em conta nesse momento de construir um projeto de futuro.
- O Brasil perdeu competitividade global nos últimos 20 anos por conta exclusivamente de seus equívocos e apesar de todos os seus recursos naturais, estruturais e humanos;
- O mundo está rodando muito mais rápido privilegiando a expansão em todas as regiões e países que têm pensado o longo prazo de forma estruturada. E nós não podemos ignorar. Não existe um projeto de Brasil para o longo prazo.
O que passou, passou. Agora é construir o futuro!
Este é momento onde a conciliação e a colaboração deveriam ser as palavras de ordem, até porque a oposição rancorosa se fará presente de todas as formas.
Deveríamos repensar nossa maior inserção na economia global, considerando com extrema cautela as posições antiglobalistas, até porque suas consequências têm sido elevadas quando a visão de longo prazo fica comprometida pelo imediatismo. O Reino Unido que o diga.
A visão macro deve se impor ao micro de curto prazo. Só como exemplo. As exportações brasileiras para os Estados Unidos representam perto de 8% do total de nossas exportações e estão declinantes, enquanto que o saldo comercial, que foi positivo no período 2001-2007, esteve negativo de 2008 a 2016, e ficou equilibrado em 2017.
Enquanto isso a China, como destino de nossas exportações, tem tido participação crescente e hoje já representa perto de 13% do total de nossas exportações.
Devemos nos inspirar muito mais em países como Coreia do Sul, Israel e China, criando acordos bilaterais onde for possível e buscarmos recompor a proposta travada do Mercosul que tem gerado atraso substantivo em nossa inserção global.
Temos que assumir que nosso propósito de curto prazo deveria ser recuperar a posição de 5ª economia global, apenas como uma referência internacional, e desenvolvermos um projeto que nos permita esse salto no menor tempo possível. Sem mágicas ou pirotecnia, mas com projetos estruturados e consistentes.
E é nesse aspecto que conciliação e colaboração se tornam fundamentais, especialmente envolvendo o setor empresarial que deve se estruturar e organizar para ser elemento protagonista na construção desse futuro.
Não estamos entre aqueles que acreditam que a função do empresário é só gerar emprego, renda e pagar impostos. Acreditamos que cabe ao setor empresarial assumir também responsabilidade política, ainda que não partidária, atuando decisivamente na elaboração e implantação de projetos estratégicos para o país. Sua visão privilegiada, integrada e global deve estar também a serviço da sociedade.
Como estruturar para que isso aconteça é um tema que merece imediata discussão e proposição, especialmente num país que tem cinco mil sindicatos patronais e um número despropositado de entidades, associações, institutos e outras formas de organização privada, fragmentando e pulverizando a representação mais geral, aquela necessária para tratar dos grandes temas nacionais.
Aos setores empresariais mais abertos e centrados na economia de mercado cabe a discussão no âmbito de suas próprias representações propondo novos modelos de organização e atuação, especialmente num cenário mais volátil e digital, para que possam trazer sua decisiva contribuição para a transformação estrutural do Brasil.
Não acreditamos que teremos outra oportunidade como essa nos próximos 20 anos.