O quão vulnerável estamos?

O ano de 2014 começou como esperado, com indicadores para todos os gostos – positivos e negativos, no âmbito nacional e internacional. E esta gangorra de indicadores deverá prevalecer ao longo de todo o ano.

Como já estão cansados da minha redundância, é no âmbito internacional e, mais precisamente, da sala de nossa querida Janet Yellen que sairão as maiores rajadas de ventos a atingir as economias emergentes. Ou seja, devemos todas as noites rezar para que Mrs. Yellen seja capaz de ir reduzindo paulatinamente as compras de títulos norte-americanos, e por consequência, reduzindo a oferta de dólares para a economia mundial, sem fazer com que os mercados mundiais se agitem muito; concretamente, sem que haja grandes choques de desvalorização nas moedas dos países emergentes.

Paradoxalmente, é deste âmbito externo, que o Brasil mostra no momento atual sua resiliência, diferentemente de outros momentos recentes da história econômica brasileira. Ao longo da Década da Bonança, nosso banco central foi acumulando um montante razoável de reservas internacionais que atualmente remontam os 376 bilhões de dólares. Não faltaram críticas em função de tal acúmulo, principalmente pelo custo do mesmo: mantendo tais reservas, lá fora, com uma rentabilidade baixíssima – vide os juros dos títulos norte-americanos, japoneses, europeus, e se financiando internamente ao custo de mais de 10% ou próximo disso. Ou seja, o custo do seguro contra tempestades financeiras foi ao longo destes anos muito alto e continua sendo.

Mais ao menos, agora, parte deste seguro está sendo utilizado. Em função deste acúmulo de reservas, o Brasil é hoje credor internacional líquido, ou seja, nossas reservas são maiores que nossa dívida pública e privada, e, mais ainda, o setor público reduz sua dívida líquida consolidada toda vez que dólar se valoriza perante o real. Neste sentido, como acaba de mencionar, o nosso presidente do BACEN, Alexandre Tombini, a desvalorização de nossa moeda, em certa medida, não implica em vulnerabilidade, mas sim no canal de reequilíbrio de nossa economia.

Obviamente que desvalorização da moeda significa perda de nosso poder aquisitivo em relação aos bens importados, ou seja, as viagens à Disney ficarão mais caras, também os ipads, ipods, iphones; também, os belos carros importados se reduzirão ao longo dos próximos trimestres e muitas das revendedoras com foco nestes importados se fecharão também num futuro não tão distante… Tudo como em outros momentos de oscilações mais fortes em nossa moeda. Em termos mais técnicos, são os reajustes nos preços relativos e, com isso, as importações tendem a diminuir e as exportações a aumentar…

Do lado do varejo, o mix de produtos ofertados, importados versus nacionais, já estão sendo ajustados;  para o produtor nacional , um alívio que ao que tudo indica deve perdurar para os próximos dois, três anos.  Como dissemos em artigos anteriores, os anos de 2013 e 2014 têm sido este período de transição, onde a economia brasileira deverá sofrer diversos ajustes nos preços relativos: importados versus nacionais, aumento paulatino no preço da gasolina, importados em relação aos preços de nossos serviços, uma redução no crescimento dos preços dos imóveis… daria para discutirmos horas  sobre todas estas potenciais mudanças.

No frigir dos ovos, o tempo do real valorizado is over e, isto significa perda de poder aquisitivo e perda de bem-estar. As manifestações sociais recentes no Brasil, na Venezuela, na Ucrânia, na Argentina e em outras regiões do globo (com todas as peculiaridades de cada país, devo, modestamente, alertar) são, em parte, o desconforto por esta perda de bem-estar com o fim da Década da Bonança.  Novos tempos nos quais devemos nos ajustar.

Ricardo Meirelles (ricardo.meirelles@gsmd.com.br), sócio-diretor e economista-chefe da GS&MD-Gouvêa de Souza.

Sair da versão mobile