Nos últimos anos, a partir do cenário de pujança do setor agropecuário no Brasil, aumento da população brasileira, crescimento da renda e exportações, a indústria de alimentos se sofisticou do ponto de vista de gestão e tem aumentado seu apetite e realizado movimentos importantes pró-crescimento.
Atuo no setor de alimentação há mais de 30 anos e tive a honra e oportunidade de trabalhar em Controle de Qualidade, P&D, Marketing & Vendas e nos últimos 11 anos ocupando cargos executivos de alta liderança.
Felizmente, pude ajudar na construção de histórias de sucesso de empresas como Unilever, Nestlé, Bunge, Dawn Foods, Vigor e Lactalis, além de ter experiências no varejo, fora do ramo de alimentos, na Philips e na Wella.
Atualmente, como consultora e conselheira, busco transformar todo esse conhecimento em caminhos para acelerar os negócios dos clientes nos quais atuo e gostaria de dividir e contextualizar este tema.
Vamos às diferentes estratégias: todos conhecemos alguns exemplos de empresas de alimentos que optam pela redução (ou, por que não, eliminação) de concorrentes.
E esta é a primeira estratégia: crescer a partir de fusões e aquisições. Este formato exige caixa e grande porte. Claro, sem ferir as premissas de monopólio, esta estratégia é bem mais profunda que simplesmente a eliminação da concorrência: em geral essas empresas ganham protagonismo na definição do preço do produto no mercado e no controle da cadeia de originação e aumentam seu controle sobre fornecedores. Normalmente são empresas focadas em eficiência operacional e produção em alta escala, aumentando ainda mais sua competitividade. Além disso, em geral, são mercados de alto giro e consumo, em que o volume de produção faz toda a diferença na escala.
No Brasil temos alguns exemplos como a JBS que se tornou a maior indústria de proteínas do mundo, fazendo movimentos nacionais e internacionais nessa direção e Ambev, aumentando sua relevância no mercado de bebidas, no Brasil e fora daqui.
São protagonistas nos mercados em que operam, seja na forma de abordagem ao mercado, seja também em iniciativas relacionadas a temas de ESG, por exemplo. Fiquei impressionada com a nova sede da Germinare, uma escola patrocinada pela JBS, integrada à sede da empresa, e que anualmente recebe cerca de 800 alunos oferecendo uma qualidade de ensino excelente, gerando oportunidades com foco na formação de novos líderes e reforçando seu papel social.
A segunda estratégia é aquela baseada em crescimento a partir do investimento em marcas e projetos de inovação. Este é um formato baseado em crescimento orgânico, alicerçado na reputação da marca refletida em sua qualidade, disponibilidade e atributos normalmente ligados a inovação, sempre combinados com forte relacionamento e estímulos na compra junto ao consumidor final.
Ótimos exemplos nessa direção são Nestlé, Bauducco e Unilever. Essas empresas construíram de forma consistente, ao longo dos anos, uma forte relação emocional e de confiança com seus clientes. Importante reforçar que esta conexão se dá junto ao consumidor final, mas também junto ao trade.
Para sublinhar iniciativas também desenvolvidas pelas empresas, cabe destacar a Nestlé e a Unilever, que, há décadas, mantêm uma cozinha experimental para atendimento aos consumidores, apoiando a aplicação dos produtos de maneira primorosa. Além disso, mantêm um centro culinário focado na formação de operadores no mercado de foodservice. Ou seja, investem fortemente na proximidade com a marca, confiança e contato com o cliente.
Por fim, a terceira estratégia é a criação e/ou o investimento em startups. Neste caso, vemos a inovação como força motriz do crescimento. É aqui que aparecem novos ensaios em produtos, acesso a novos mercados, enfim, elas movimentam o mercado a tal ponto que acabam por influenciar a reconfiguração estrutural de grandes empresas que, eventualmente, adquirem essas empresas. Vimos a Unilever adquirir a Mãe Terra, como forma de acelerar sua entrada em novos mercados.
Estas empresas que desenvolvem soluções para o setor alimentício são chamadas de foodtechs e atraem olhares, inclusive de empresas fora do segmento, como empresas de tecnologia, fundos de investimentos, entre outros. Trazem, para as indústrias de alimentos, novas metodologias e culturas diferenciadas, com um novo olhar para a produção e uso dos alimentos.
Este movimento está bastante consolidado em outros países e, no Brasil, temos visto surgir empresas que estão de olho, por exemplo, na demanda crescente por alimentos saudáveis, naturais e mais nutritivos.
É importante dizer que as indústrias flertam sempre com pelo menos dois desses modelos de crescimento, mas um sempre é definido como um caminho estratégico imperativo para que os resultados alinhados com acionistas sejam atingidos.
Qual é o melhor modelo? De que tipo de empresa o consumidor prefere comprar? Que tipo de empresa é mais fácil construir relações comerciais na cadeia distribuidores – operadores?
De qualquer maneira, o consumidor está sempre no centro das decisões: como manter a liderança no desejo do consumidor e entregar suas promessas?
Cecília Martins é CEO Hydea e Partner Consulting Gouvêa Foodservice.
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