Já não se faz marketing em shopping como antigamente

Já não se faz marketing em shopping como antigamente

Não faz muito tempo, planejar o calendário de ações de marketing em shopping centers era tarefa relativamente simples.

Os principais desafios eram definir quais prêmios seriam sorteados nas campanhas do Dia das Mães, Namorados e Natal (em geral, automóveis), encomendar campanhas publicitárias, contratar atrações infantis para as férias de janeiro e julho e escolher a decoração natalina mais adequada.

Essa é uma descrição bastante simplificada, admito. No entanto, ela reflete a abordagem tática adotada pela maior parte dos gestores de marketing em shoppings brasileiros, até pouco tempo atrás. A boa notícia é que, aos poucos, as coisas começam a mudar.

“Hoje, os profissionais de marketing precisam ser mais analíticos e especializados em dados e no comportamento do cliente. No passado, era mais difícil encontrar esse perfil, até porque não havia tanta informação disponível”, afirma Ana Paula Niemeyer, diretora de Marketing da Allos, uma das principais redes de shopping centers do País. Para ela, os dados e as novas ferramentas tecnológicas potencializaram o trabalho do marketing.

A pandemia marcou a virada no marketing dos shoppings

Na visão de Ana Paula, a pandemia foi um ponto de virada para a evolução da comunicação mercadológica nos centros comerciais brasileiros. As mensagens massificadas nos canais offline, com a evolução do digital, puderam, enfim, dar lugar a uma relação interativa, personalizada, segmentada e, mais importante, mensurável com os clientes.

Isso não significa que a publicidade em TV, rádio e outdoor tenha desaparecido do radar dos shoppings, é claro. Em praças menores, o vantajoso custo por mil contatos ainda permite a subsistência das mídias massivas.

Voltando ao marketing digital, vale destacar que a maioria dos shoppings independentes e das redes médias e pequenas ainda está no começo do processo quando o assunto é personalização da comunicação ou segmentação eficiente da audiência. Há muito caminho pela frente.

A tendência é que isso represente para eles, no curto prazo, uma importante desvantagem em relação aos shoppings que têm capacidade de conhecer seus clientes individualmente, por meio de estratégias sofisticadas de CRM, turbinadas com informações dos consumidores geradas por programas de fidelidade.

O papel estratégico dos programas de fidelidade

Falando em programas de fidelidade, o da Allos permitiu quebrar uma prática ancestral em shopping centers: os sorteios concentrados nas tradicionais datas de varejo. Para os participantes cadastrados, nos shoppings da Allos há sorteio todo mês, embora com prêmios de menor valor. Os carros ainda não saíram da lista, mas ficaram restritos a datas como o Natal.

Para o shopping, a vantagem dos sorteios contínuos não se resume à conversão nas lojas. Com trocas de notas o ano todo, o banco de dados da companhia vai ficando robusto e as análises, mais precisas. O resultado são ofertas mais relevantes para os clientes, gerando melhores oportunidades de negócios para as lojas.

“Como podemos nos destacar em um mercado tão saturado de conteúdo?”, pergunta Ana Paula. Ela mesmo responde: “Falando o que o cliente quer ouvir”. Dados produzem comunicação relevante, que gera engajamento e estimula as vendas dos lojistas. Esse é o segredo das novas estratégias de conversão no mundo dos shoppings.

A vantagem competitiva das grandes redes

Uma ameaça aos centros comerciais independentes e redes de menor porte é o poder de escala e o conhecimento acumulado que grandes companhias, como Allos, Multiplan e Iguatemi, estão desenvolvendo.

No caso da Allos, há uma agência digital nacional que transfere know-how para as agências locais, por meio de diretrizes que orientam a comunicação online. E uma equipe intalada na holding para direcionar mensagens para os diferentes grupos de participantes do programa de benefícios da companhia. Sem falar em todo o aprendizado acumulado ao longo dos anos sobre como engajar lojistas.

Uma das funções mais importantes do marketing é o posicionamento da marca. Também aqui, o poder da rede se faz presente. A Allos dividiu seus empreendimentos em clusters (agrupamentos), de acordo com as características de cada um. O processo incluiu 16 mil entrevistas com clientes e cerca de 100 profissionais da holding e dos shoppings. Ao final, todos os ativos foram classificados em um desses seis clusters: sofisticado, compacto de alto padrão, imenso, conveniente, passeio familiar e entretenimento. Isso facilita tremendamente o trabalho de cada equipe de marketing local.

“A segmentação é uma espécie de bússola para que os ativos estejam cada vez mais conectados com as demandas e expectativas dos consumidores”, explica Ana Paula.

Outra frente que continua sendo essencial para a indústria dos shopping centers é a do entretenimento, para atrair fluxo qualificado de frequentadores. Mais uma vez, fazer parte de uma rede traz vantagens, tanto em termos de captação de bons eventos quanto de patrocinadores, que viabilizam as atrações. A Allos tem explorado bem o filão dos patrocínios, muitas vezes com ajuda da helloo, empresa de mídia OOH (Out of Home, ou mídia externa, em uma tradução livre), controlada pela companhia.

O novo perfil das equipes de marketing

Com todas essas mudanças em curso, o perfil das equipes de marketing também precisou mudar. Se antes ela era composta basicamente por profissionais de publicidade, promoções e eventos, hoje elas abrigam especialistas em CRM, trade marketing, comunicação digital e entretenimento. E precisam ser lideradas por gerentes com grande poder analítico e visão estratégica.

Os objetivos do marketing em shopping centers não são tão distintos dos de antes. Ele precisa trabalhar o posicionamento da marca, a geração de fluxo, o conhecimento do consumidor e a conversão de vendas. Mas a maneira como tudo isso é feito hoje é bem diferente.

O desafio é ainda maior para quem trabalha em shoppings independentes ou em redes de pequeno porte. Para esse pessoal, é importante entender quais estratégias estão sendo exploradas pelos grandes e adaptar essas ideias, na medida do possível, à realidade local.

Uma coisa, no entanto, é certa: já não se faz marketing em shopping como antigamente. Ainda bem.

Luiz Alberto Marinho é sócio-diretor da Gouvêa Malls
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da MERCADO&CONSUMO.
Imagem: Shutterstock

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