DTC – Direct to Consumer – é muito mais do criar canal direto de venda de produtos e serviços aos consumidores finais. É uma profunda mudança estrutural e estratégica, que abre portas para expansão de atividade levando empresas e negócios a um patamar competitivo muito mais elevado.
Considere a plataforma criada por Nespresso, da Nestlé, que revolucionou o negócio de cafés no mundo a partir da revisão de todo o modelo anterior de comercialização de produtos, equipamentos e cápsulas. Avalie a transformação precipitada que é responsável pela venda direta de cápsulas nas diversas modalidades digitais, representando perto de 50% das vendas totais de cápsulas da marca no mundo pelas diversas alternativas criadas, incluindo os membros dos clubes de relacionamento com a marca.
Para ser mais agressivo no raciocínio pense no que a Apple criou usando o digital e os diversos canais de vendas e relacionamento em espaços físicos e digitais pelo mundo que a transformaram num ícone global por seus produtos, soluções, serviços e programas de relacionamento ao criar uma vantagem competitiva inimitável pelo conhecimento organizado sobre o consumidor, suas demandas, preferências e desejos.
Num outro plano considere também o movimento estratégico da P&G com sua rede de lavanderias e lava rápidos, com expansão por meio de franchising.
Ou o mesmo movimento desenvolvido pela Unilever com sua “solução” Omo de lavanderias, atendendo diretamente ao consumidor final. E incorporando informações sobre preferências e desejos.
Ou mesmo a estratégia da Sherwin-Williams com sua rede de mais de 3 mil lojas de revenda de tintas e serviços de pintura nos Estados Unidos. Para além da venda de suas tintas, a solução integrada de produtos e serviços oferecendo respostas com garantia de qualidade, alternativas de pagamentos e a força da marca diferenciando o serviço final.
Ou considere tudo aquilo que as marcas do segmento luxo, Louis Vuitton, Gucci, Prada, Yves Saint Laurent, Burberry e muitas outras têm feito, oferecendo, além de suas lojas e serviços exclusivos, a oportunidade de conexões diretas e diferenciadas que permitem conhecer e atender seu consumidor e criar um canal direto de relacionamento, conhecimento e conexão da marca.
Ou se quiser pensar na realidade aqui no Brasil, a transformação estratégica da Todeschini quando, em vez de apenas vender móveis tradicionais, fez um movimento disruptivo e passou a vender alternativas customizados, desenvolvidas para atender a cada necessidade de seus consumidores e integrou tudo oferecendo o projeto, o produto produzido de acordo com cada necessidade, a instalação, o crédito e a garantia. Tudo com o aval da marca e do sistema.
Da mesma forma como Portobello, ao criar a Portobello Shop, passou a oferecer projetos, produtos, soluções, relacionamento e opções de customização que tornaram a empresa um benchmarking global na venda de revestimentos cerâmicos.
No plano local, ainda considere o exemplo da Swift, do grupo JBS, que oferece soluções em alimentação, especialmente trabalhadas no universo de proteína animal, mas com ampliação de escopo para entender e atender demandas de consumidores nas maiores cidades do País, para além das alternativas oferecidas pelos tradicionais canais de distribuição de seus produtos.
Wrap up
O DTC pode e deve ser muito mais ambicioso estrategicamente do que a venda e a conexão direta com os consumidores e pode ser um elemento fundamental de transformação do negócio ao incorporar conhecimento, promoção, relacionamento e a capacidade de antecipar desejos e preferências e transformar tudo isso em um diferencial competitivo para uma empresa de bens de consumo.
Parece sutil, mas é muito mais disruptivo do que a melhoria da rentabilidade das alternativas de distribuição existentes.
E é por isso que nenhuma empresa que migrou para o DTC como alternativa estratégica retornou para o modelo tradicional.
Vale a pena refletir.
Marcos Gouvêa de Souza é fundador e diretor-geral da Gouvêa Ecosystem e publisher da plataforma Mercado&Consumo.
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