Mudanças climáticas afetam a produção, encarecem os alimentos e obrigam a indústria a se reformular

Mudanças climáticas afetam a produção, encarecem os alimentos e obrigam a indústria a se reformular

O preço do cacau disparou. O do café também. Os cítricos estão ameaçados. O azeite de oliva virou artigo de luxo. Os aumentos de preços desses itens não são apenas reflexo da economia global. As mudanças no clima estão afetando a oferta de alimentos no mundo e, com isso, impactando diretamente a indústria de alimentos e os preços desses produtos.

A produção de cacau na África Ocidental, por exemplo, sofreu com secas intensas, chuvas fora de época e doenças. O resultado? Escassez e preços recordes. O café, que depende de temperaturas estáveis, enfrenta desafios semelhantes no Brasil, onde o preço já subiu bastante, e na Colômbia. O azeite, produzido em grande parte no Mediterrâneo, viu sua colheita encolher drasticamente devido a ondas de calor e secas prolongadas. No México e na Flórida, as produções de cítricos sofrem com o avanço de pragas impulsionadas pelo clima mais quente. Recentemente, Oliver Camp, assessor de Meio Ambiente e Sistemas Alimentares na Global Alliance for Improved Nutrition (Gain), destacou que “o aumento das temperaturas e a variabilidade climática afetam a qualidade dos solos e a produtividade das colheitas, resultando em alimentos de menor valor nutricional e aumento dos preços”.

A indústria de alimentos não pode mais ignorar essa nova realidade. Como equilibrar a oferta diante das oscilações climáticas e manter a sustentabilidade sem perder qualidade? A resposta está na inovação e na utilização de ingredientes alternativos que mantêm a qualidade. A adoção de cadeias de suprimentos mais diversificadas, investimento em pesquisa e desenvolvimento de ingredientes alternativos e ampliação do uso de matérias-primas resilientes ao clima são ações fundamentais para garantir o futuro do setor.

A crise no setor do cacau já fez o preço disparar 189% no último ano, de acordo com a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), com a tonelada do produto chegando a custar mais de US$ 11 mil na Bolsa de Valores de Nova York. Isso levou as empresas a buscarem alternativas viáveis. Um exemplo prático é o Cocoa Booster, uma tecnologia desenvolvida pela Kerry, líder global em sabor e nutrição sustentável, para enfrentar a crise de oferta e os altos preços do cacau. Essa solução inovadora permite uma redução expressiva de cacau em pó em diversas aplicações, como achocolatados, panificação e outras aplicações, sem comprometer o sabor ou a qualidade dos produtos finais.

A formulação do Cocoa Booster foi criada com base na expertise da Kerry, por meio de técnicas especializadas de extração que recuperam moléculas essenciais, permitindo recriar o sabor completo do cacau e suas principais características, como mouthfeel, amargor e adstringência. Nossa capacidade completa em extração nos apoiou no desenvolvimento de uma solução com as notas autênticas do cacau. Testes sensoriais comprovaram a similaridade entre o Cocoa Booster e o cacau em pó tradicional, garantindo uma experiência sensorial equivalente para os consumidores.

Essa inovação não apenas ajuda os fabricantes a mitigar os impactos financeiros decorrentes da volatilidade dos preços do cacau, mas também contribui para a sustentabilidade da cadeia produtiva, oferecendo uma alternativa eficiente e ambientalmente responsável. Permite uma otimização de custos nas formulações, evitando repasses e aumento de preços para os consumidores.

Outra cultura atingida foi a dos cítricos. As marcas investem em técnicas avançadas de extração e aproveitamento integral da fruta para minimizar perdas e manter a oferta estável. O impacto da doença do greening cítrico, combinado com eventos climáticos extremos, resultou em desafios de disponibilidade e custos para a cadeia de suprimentos com ingredientes cítricos, o que, por sua vez, representa desafios significativos na entrega de sabores cítricos de alta qualidade. A Kerry vem trabalhando também para apoiar este segmento de maneira sustentável, com uma solução integrada que recupera o sabor sem a necessidade de uma alta inclusão dos cítricos para obtenção de uma experiência de sabor autêntica, reduzindo a completa necessidade da disponibilidade, bem como a volatilidade dos custos, sem comprometer a entrega de sabor.

O Brasil, maior produtor mundial de café, sofre, desde 2021, as consequências dos efeitos da variação climática: secas severas e geadas que comprometeram a produção. Neste ano, o preço do café aumentou entre 20% e 25%, conforme a Associação Brasileira da Indústria do Café (Abic). Diante disso, as grandes torrefadoras já incorporam grãos de origens diversificadas e adotam blends sustentáveis. Há também pesquisas para o desenvolvimento de alternativas a partir de cereais e leguminosas que possam reproduzir o perfil sensorial da bebida, garantindo sabor e qualidade mesmo em períodos de escassez. A expertise da Kerry em café inclui a seleção de grãos de alta qualidade, perfis de torrefação personalizados e um processo proprietário de extração e concentração que proporciona experiências consistentes de café de alta qualidade em uma variedade de aplicações em alimentos e bebidas. A cultura de café ainda propicia à companhia um programa comunitário em regiões produtoras, que se dedica a acabar com o ciclo de pobreza que afeta cafeicultores do sexo feminino. O projeto comercializa o café premium e com certificação orgânica oriundo dessas produtoras, beneficiando mulheres em países como Peru, Brasil e Sumatra.

Como vemos, a indústria de alimentos tem um papel essencial nesse cenário de transformação do clima. E essa mudança já está em curso. O consumidor quer produtos acessíveis, mas também mais saudáveis e sustentáveis. Soluções apoiadas pela ciência são a resposta para desafios e instabilidades em períodos de incertezas. Empresas que se anteciparem a esse novo modelo terão a possibilidade de ajudar a oferecer produtos sustentáveis para os consumidores, liderando a mudança do mercado.

A inovação será um divisor de águas para a segurança alimentar global, através da reformulação de muitos destes produtos. Não se trata apenas de encontrar substitutos, mas de reimaginar a forma como produzimos e consumimos alimentos. A indústria e o mundo em que existimos estão em constante evolução e enfrentam desafios complexos. A maneira como produzimos, consumimos e descartamos alimentos hoje é insustentável. Por isso, a indústria de alimentos está em busca de soluções de nutrição sustentável que ofereçam alimentos e bebidas acessíveis, nutritivos, com impacto ambiental mínimo e sempre saborosos. Afinal, o futuro da alimentação depende disso, e o momento de agir é agora.

Edson Barros é vice-presidente de Marketing da Kerry para a América Latina.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
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