De volta de Chicago, a NRA Show 2025 mais uma vez se provou um caldeirão de inovações e insights, reafirmando a dinâmica e a resiliência do setor de foodservice. Para nós, que anualmente lideramos a delegação Gouvêa Foodservice, a experiência foi ainda mais rica, revelando um cenário em que a tecnologia avança a passos largos, mas a essência humana da hospitalidade se torna um diferencial inegociável.
Este artigo propõe uma reflexão sobre como o setor pode navegar por essas águas, equilibrando a Inteligência Artificial líquida com a cultura da experiência para construir negócios verdadeiramente à prova do futuro.
O novo consumidor: qualidade, saúde e dopamina gastronômica
Houve queda no otimismo do consumidor americano, conforme o Índice de Confiança do Consumidor, que atingiu números abaixo aos do período de pandemia. Esse cenário exige uma resposta estratégica de redes e dos operadores independentes.
A mudança de consumo de “só preço” para “qualidade” é evidente, com o fast casual restaurants superando o quick service restaurants em ticket e tráfego, impulsionados pela qualidade dos alimentos, opções saudáveis e programas de fidelidade e benefícios bem executados.
A alimentação regulada a partir de medicamentos GLP-1 traz à tona a demanda por opções com alto teor de proteína, ricas em nutrientes, ricas em fibras, baixo teor de açúcar e preparadas com alimentos integrais, visando à funcionalidade e ao bem-estar.
Os consumidores estão open to flavor, ou seja, buscam fusões criativas, ingredientes menos convencionais, o resgate de receitas tradicionais com um toque contemporâneo, com foco em qualidade e autenticidade. Os molhos são destacados como elementos-chave para entregar microtendências, intersecções de sabores e acidez.
A busca por dopamina no consumo deve ser traduzida no foodservice em experiências que gerem bem-estar e prazer, indo além do alimento.
A Inteligência Artificial líquida: eficiência sem perder a essência humana
Segundo a Circana, o crescimento do tráfego digital em restaurantes (totem, app e delivery) já representa mais de 17% de todos os pedidos. Isso demonstra a inevitabilidade da digitalização.
A IA na prática no foodservice abrange desde a automação básica e chatbots até a precificação dinâmica, equipamentos inteligentes, robôs de cozinha, gerenciamento inteligente de estoque e análise de dados para insights do cliente.
A tecnologia deve ser uma ferramenta para simplificar as tarefas administrativas da equipe, permitindo que os funcionários se concentrem na entrega de hospitalidade genuína e conexão humana com os clientes.
Contudo, a IA em P&D nos mostra um paradoxo: o caso da chef Renee Howarth versus as IAs (ChatGPT e Meta) na criação de uma receita de bolo de chocolate, em que a IA não conseguiu substituir a experiência culinária.
Novos modelos de negócio e a reconfiguração da distribuição
No conceito de Kitchen Life Machine, máquinas comerciais passam a fazer parte da vida do consumidor, apontando para uma menor barreira a produtos que são somente finalizados. Do ponto de visita comercial, esses equipamentos asseguram padronização de qualidade e sabor, além de agilidade e conveniência, desafiando modelos tradicionais de operações de foodservice.
A ascensão de operações de grocerant (grocery + restaurant), como alternativa para quem deseja refeições de qualidade, porém sem o custo da gorjeta, passa a ser uma realidade cada vez mais importante no mercado americano.
Para a rede The Fresh Market, existem lojas em que essa oferta representa 25% do faturamento total do negócio, enquanto, no Brasil, quem executa muito bem atinge pargos 8%. Para o sucesso do modelo, ele deve estar integrado à estratégia omnichannel dos supermercados, demonstrando que a convergência de canais e a necessidade é o caminho para realmente estar conectado com os consumidores.
Ser omniservice é um caminho a ser considerado na jornada de digitalização dos negócios de alimentação. A interação humana, adicional aos canais digitais, evolui uma boa experiência para uma experiência excelente.
A distribuição estratégica é um pilar estratégico no foodservice, com foco em fracionamento, mix e tecnologia para otimizar a gestão de estoque e logística, pedidos em plataformas e personalização da oferta.
A distribuição é um pilar estratégico do foodservice. Por meio da tecnologia, garante a velocidade e a customização necessárias à nova realidade do mercado.
Liderança transformadora: honrando o legado e abraçando o futuro
O principal desafio da indústria é honrar o legado de experiências especiais, enquanto integra a inovação e novas ferramentas.
A cultura de experiência é a verdadeira diferenciação, em que a qualidade básica e a ambientação são o mínimo esperado; a distinção reside na sensação de ser um cliente valorizado.
Liderança não é apenas sobre gerenciar, mas sobre inspirar, inovar, defender e moldar o futuro do foodservice, garantindo que a indústria continue a prosperar e a oferecer experiências memoráveis.
A NRA Show 2025 nos deixou uma mensagem clara: o futuro do foodservice não está apenas na tecnologia mais avançada ou nos sabores mais exóticos, mas na capacidade de integrar esses elementos com uma profunda compreensão do consumidor e um compromisso inabalável com a hospitalidade genuína.
É um convite para que líderes e empreendedores do setor invistam na verdade,na premiunização, na hospitalidade escalável e na Inteligência Artificial, sempre com o foco em construir negócios que não apenas prosperem, mas que também enriqueçam a vida de seus clientes e equipes.
O desafio é grande, mas as oportunidades são ainda maiores para aqueles que souberem equilibrar a inovação com a alma do nosso negócio.
Cristina Souza é CEO da Gouvêa Foodservice.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
Imagens: Envato