Acostumada a gordos índices de crescimento desde a virada do século XXI, a indústria de shopping centers está pronta para encarar novos desafios. Eles são muitos. Persistir em rota de expansão. Reduzir os riscos do negócio investindo na revitalização e aumento da rentabilidade dos malls já existentes. Aproveitar a adversa conjuntura econômica para se debruçar sobre projetos novos e sustentáveis, capazes de agradar os consumidores e reduzir o custo da operação para os lojistas.
Prospectar novas oportunidades. Capacitar funcionários e comerciantes. Repensar o mix. Transformar os shoppings em empreendimentos multiuso para elevar o fluxo de pessoas. Investir em novos serviços e opções de entretenimento. Descobrir e comprar terrenos e – por que não? -, até mesmo estabelecimentos da concorrência.
Curiosamente, BR Malls, Sonae Sierra Brasil, Multiplan e Iguatemi Empresa de Shopping Centers estão de olho em eventuais aquisições. É o caso da Multiplan, que desenvolveu 16 dos 18 shoppings existentes em seu portfólio. A BR Malls e Sonae estudam propostas, enquanto a Iguatemi segue a estratégia de aumentar a participação nos estabelecimentos dos quais já é sócia.
Os novos desafios são uma forma de as empresas enfrentarem uma conjuntura econômica que se deteriorou. No final da primeira década do século XXI, tudo conspirava a favor da indústria: estabilidade econômica, juros em queda, crédito farto, inflação sob controle, crescimento de empregos com carteira assinada, aumento da renda da população e a chegada de milhões de pessoas à classe média. Atuando de olho no longo prazo, o setor investiu pesado.
Os frutos começaram a ser colhidos principalmente a partir de 2010, quando a indústria de shoppings iniciou um período de expansão sem precedentes. Naquele ano, o PIB cresceu 7,53%, a melhor performance desde 1985. Não à toa, o setor chegou ao auge: o faturamento aumentou 23%, somando R$ 91 bilhões. Sem registrar perdas em nenhum momento neste século, a indústria cresceu a taxas de dois dígitos de 2007 a 2012. No ano passado, o aumento foi de 8,6%. Mesmo assim, bem superior ao do PIB, de 2,3%.
Deve acontecer o mesmo em 2014. O governo acaba de anunciar a sua nova previsão do PIB, de apenas 0,5%. A expectativa da Associação Brasileira de Shopping Centers (Abrasce) era crescer entre 8% e 8,5%. “Até setembro, chegamos a 7,3%, um excelente resultado na atual conjuntura. Mas o desempenho destes últimos meses nos permite acreditar que a previsão poderá ser superada”, comenta o presidente da Abrasce, Luiz Fernando Veiga.
Mesmo com a marcha mais lenta, os empresários estão otimistas. Apesar da alta da inflação e dos juros, da pesada carga tributária e de o consumo das famílias ter perdido fôlego.
“Você não faz grandes investimentos de longo prazo apenas em função do cenário econômico. A decisão é pautada em cima de bons projetos”, explica o diretor vice-presidente e de relações com investidores da Multiplan, Armando d’Almeida Neto. “É preciso buscar o crescimento, novas oportunidades, independentemente da economia”, diz o diretor de operações da Sonae Sierra, Walter Chao.
“Estamos fazendo tudo o que foi programado, com a cautela exigida pelo momento. Temos metas concretas de crescimento e estamos investindo também para ganhar escala e aumentar a eficiência interna”, diz a vice-presidente de finanças e diretora de relações com os investidores da Iguatemi, Cristina Belts. “Mantemos os investimentos apesar do cenário desafiador, que exige maior seletividade do mercado”, diz o diretor-executivo de operações da BR Malls, Ruy Kameyama.
O setor vai continuar crescendo, mas em outro patamar. E em outra direção. “O mercado vai se ajustar com expansões, aquisições e projetos de shoppings menores para o interior ou periferias das grandes cidades, usando a experiência adquirida ao longo dos anos”, comenta Marcelo Sallum, sócio fundador da Lumine Soluções em Shoppings Centers. “Vai haver uma desaceleração no número de lançamentos a partir de 2015”, explica o consultor Luiz Marinho, sócio-diretor da GS&BW. Em 2011, foram inaugurados 22 empreendimentos. Em 2012, foram 27, um recorde. Facilmente superado no ano passado, quando 38 empreendimentos abriram as portas.
Estes malls foram projetados há cerca de quatro anos, quando as perspectivas da economia e do setor eram mais promissoras. “Não há como suspender projetos já colocados na rua”, explica Marinho. No máximo, há um alongamento nos prazos de entrega, como acontece agora. No fim do ano passado, a lista de inaugurações para 2014 relacionava 41 empreendimentos. Em junho de 2014, eram 35. Se todas as aberturas se concretizarem, 24 novos malls estarão em funcionamento – o adiamento é normal, mas não em um volume tão significativo. Para 2015, estão previstos 38 novos centros de compras.
Além disso, grandes empresas do setor estão mais parcimoniosas nos investimentos em 2014. Os relatórios de atividades da BR Malls, Multiplan e Iguatemi mostram que eles passaram de R$ 1,4 bilhão nos nove primeiros meses de 2013 para R$ 693 milhões neste ano, queda de 49,4%. Neste momento, os olhos estão voltados para as ampliações, em função dos riscos menores.
Além de exigir menos investimento, as obras vão oferecer espaços em empreendimentos já consolidados, onde a procura por parte dos lojistas é grande e os aluguéis, mais altos. Com mais uma vantagem: a inadimplência nestas empresas não chega a 2%.
A BR Malls acaba de entregar o Shopping Vila Velha, no Espírito Santo, o maior empreendimento do seu portfólio, com 72 mil m2 de Área Bruta Locável (ABL). Para o próximo ano, vai investir na expansão de dois outros em São Paulo e no Maranhão. A Iguatemi inaugurou o Rio Preto (SP) no início deste ano, desenvolve dois outlets em Santa Catarina e Minas Gerais, a serem entregues em 2016, e investe na expansão de dois malls em São Paulo e outro no Rio Grande do Sul. A Multiplan realiza a pré-locação do Park Shopping Canoas (RS), a sétima expansão do Barra Shopping (RJ), a oitava do Ribeirão Shopping (SP) e a construção de torres comerciais no Morumbi Shopping (SP) e no Parque Shopping Maceió (Al). Já a Sonae Sierra inicia a expansão de dois shoppings em São Paulo.
Outro consenso une empresários e consultores. O setor ainda tem espaço para crescer, mesmo nas capitais e cidades de grande porte do interior. Hoje, existem no Brasil 70 m2 de ABL para cada 1.000 habitantes. No México são 110 m2 e no Chile, 177 m2.
(Fonte: Valor Econômico)