A “milenização” como fenômeno de mercado – Parte 1

Por Marcos Gouvêa de Souza*

O impacto econômico e social, derivado da crescente influência dos chamados “Millennials”, que envolve a geração nascida entre 1982 e 2000, transcende em muito àquele observado por conta de sua presença na sociedade, no mercado e no consumo. É esse processo e abrangência que nomeamos como “milenização”.

Esse quadro tem muito a ver como o comportamento dessa geração tem influenciado as gerações antecedentes, especialmente os da geração “X”(nascidos entre 1961 e 1981) e até mesmo os “Boomers (1943-1960) e, principalmente os que estarão deixando legado para a próxima geração, os chamados, por enquanto, de “Z”, que incorpora os nascidos de 2000 a 2018 ou 2020.

Existe uma tendência de que sejam reduzidos os períodos estabelecidos para as gerações próximas, como parte desse processo de aceleração e incorporação de comportamentos e, por conta disso, essa indefinição sobre até quando considerar a Geração Z.

Mas vamos por partes. Primeiro um pouco de números.

Os Millennials são hoje dois bilhões de pessoas no mundo, metade deles com origem na China. Em 2025 representarão 75% da força de trabalho global.

Em média, participam entre 20 e 30% da população dos países, sendo que nos emergentes essa proporção é maior e nos mais maduros tende a ser menor, como reflexo de um processo de redução da natalidade nas décadas recentes. No Brasil eles representam 31% da população.

Nos Estados Unidos, sua renda anual média é de US 34 100 e, entre a população adulta empregada, sua renda consolidada representa 21% da renda total. Mas em ambos os casos a tendência é de crescimento tanto da renda quanto de sua participação no total.

Uma das características mais marcantes do comportamento dessa geração é sua preferência por dispêndios com serviços, especialmente tudo que signifique experiência, aprendizado e viagens. Esse talvez seja um dos traços mais relevantes desse novo jeito de ser.

Para eles é mais importante participar e viver algo sobre o que possam falar, discutir, trocar ideias e “curtir” do que comprar algo, como mostrou amplo estudo feito pela Forbes.

E isso faz uma enorme diferença no futuro do consumo, com a continuidade do processo de transferência de parcela dos dispêndios da compra de produtos para o pagamento por serviços.

No cenário atual, já temos uma clara migração da parcela de serviços no PIB desses países, ainda que o item serviços inclua todas as atividades comerciais do varejo também.

Na média dos países que compõe os Brics, em 2005 a parcela de serviços no PIB médio ponderado era de 49,9% e em 2014 havia crescido significativamente para 53,0%, parte do processo de amadurecimento desses países acelerado pelo comportamento emergente dos Millennials.

Entre as economias mais maduras, esse crescimento também ocorre, porém em menor proporção, considerando que já estão num patamar bastante alto. Como amostra, selecionados Estados Unidos, Reino Unido, França e Japão, no mesmo período 2005-2014, esse crescimento variou de 75,6% para 77,4%.

Esses números e preferências podem explicar em parte porque a indústria do entretenimento tem crescido da forma como evoluiu nos últimos anos e explica o sucesso de iniciativas como o Rock in Rio, que no ano passado reuniu perto de 600 mil pessoas nos sete dias do festival, com amplo apoio de mídia e patrocinadores.

Ou porque a Ambev está concentrando fortes investimentos em circuitos de festivais e shows em todo o Brasil, realocando despesas e investimentos para falar diretamente com essa geração em empreendimentos como o Corona Sunset, ou como tem investido no Carnaval em todo o País.

E se formos adiante nessa análise, pode explicar e entender o crescimento dos “rolezinhos”, movimentos nascidos de forma espontânea e reunindo jovens de classes emergentes que se reúnem para viver experiências e criar relacionamentos. E que, neste caso, podem ir para os shoppings e centros comerciais, não para comprar, mas em busca de diversão e “curtição”.

Diversos estudos têm mostrado que entre uma experiência marcante e um produto legal, os Millennials tendem a preferir a vivência à compra, parecendo confirmar a ideia que o ser é e será mais importante na sociedade que o ter, ao menos para a maioria desses jovens.

Por conta desse crescimento dos serviços nos dispêndios, em todas as gerações, empresas, varejistas ou não, tem desenvolvido novas estratégias e negócios, focando essa nova realidade.

A Amazon, de forma precursora, criou a Amazon Home Services, já operando em 25 cidades nos Estados Unidos, onde oferece por CEP, uma variedade de prestadores de serviços, recrutados, selecionados e validados pela empresa, com seguro de seus serviços, para instalação, manutenção e conservação no domicílio ou escritório, com mecânico, eletricista, encanador, pintor, jardineiros, tratador e cuidador de pets e até professores e instrutores em atividades que vão da música e arte até questões escolares e saúde e bem estar.

De forma similar, ampliando seu escopo e modelo de negócio, a Porto Seguro no Brasil criou a Porto Seguro Mais, que também oferece uma série de serviços domiciliares para não clientes de seus seguros, por onde começou essa atividade.

Mas o que talvez seja mais marcante e relevante no comportamento de consumo dos Millennials, seja sua crescente demanda por conceitos, marcas, sites e lojas que ofereçam, mais do que um produto, que lhes deem razões para preferir e comprar, o que tem justificado o surgimento de novos conceitos construídos para atender essa demanda.

Mas isso é uma outra história que fica para o próximo capítulo.

Nota. Os dados e análises apresentados neste artigo e no que se seguirá, foram desenvolvidos e apresentados em palestra que teve a presença de Rony Meisler, CEO e fundador da Reserva, durante a NRF Big Show 2016 com o título “Millennials want more”.

Leia a segunda parte deste artigo, clicando aqui.

*Marcos Gouvêa de Souza (mgsouza@gsmd.com.br) é diretor-geral da GS&MD – Gouvêa de Souza. Siga-o no Twitter: @marcosgouveaGS

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