“O sol nas bancas de revistas me enche de alegria e preguiça. Quem lê tanta notícia?”.
A pergunta do genial Caetano Veloso em ‘Alegria, Alegria’ sempre esteve presente em minha mente. Desde menino, sou fascinado por bancas de revistas. E por notícias.
Natural que, por hábito e convicção, eu seja viciado na leitura diária de jornais e sites de informação. É a partir dessas notícias que produzo comentários nas redes sociais e contextualizo parte das recomendações para nossos clientes.
Sei que nem todos têm tempo para acompanhar os movimentos do consumo e analisar seus impactos para o mix dos shopping centers. Por isso decidi fazer um resumo comentado do que rolou nas últimas semanas. Vamos nessa?
Nunca é demais repetir: food is the new fashion
Em 2014 a maior parte das marcas com franquias em shoppings era de moda. Hoje, dez anos depois, a primeira posição é ocupada pelo setor de alimentação, seguido por serviços e conveniência. Moda vem apenas no terceiro lugar.
A conclusão é do levantamento sobre a presença das franquias no mix dos shopping centers, realizado pela AGP Pesquisas, a pedido da Associação Brasileira de Shopping Centers. O mesmo estudo estima que 27% das lojas em shoppings brasileiros são franquias.
Os dados permitem algumas reflexões importantes. A primeira é a confirmação do aumento das operações de alimentos e bebidas, como consequência da evolução do conceito do shopping, que deixou de ser um destino exclusivamente de compras para converter-se em um local de encontros, diversão, descobertas. Enganam-se, porém, os que pensam que a moda abandonará os shoppings. O que acontece é um reequilíbrio entre os setores.
A segunda refere-se ao percentual ainda relativamente pequeno de franquias no mix dos shopping centers. Nossa aposta é que esse índice aumentará, em função da complexidade do mercado. Operadores menos estruturados enfrentarão muitas dificuldades para competir com as grandes redes.
Foodservice será, cada vez mais, ‘briga de cachorro grande’
O Grupo Trigo, que controla marcas como Spoleto e Gendai, possui hoje cerca de 7 milhões de participantes em seu programa de fidelidade. Com isso, não apenas estimula a concentração de compras em suas franquias, como viabiliza recomendações e personalização do atendimento.
No McDonald’s, o futuro passa por 3Ds: Digital, Delivery e Drive-thru. Por isso, totens de autoatendimento se multiplicam em seus restaurantes, agilizando os pedidos. Clientes que são membros dos programas de fidelidade recebem recomendações baseadas no gosto pessoal, o que aumenta o ticket médio. Somam 10 milhões os membros do programa ‘Meu Méqui’. Hoje, no McDonald’s, 65% das vendas são feitas por telas, não apenas as dos totens, mas principalmente as dos celulares.
Falando em delivery, o aplicativo da Pizza Hut já representa 15% das vendas digitais, reduzindo a dependência da marca ao iFood e suas taxas. No La Guapa, da chef Paola Carosella, as vendas pelo app chegam a 20% da receita total do negócio. Os totens de autoatendimento contribuíram com 42% das vendas do KFC, no primeiro trimestre do ano. Seguindo a tendência, Giraffas pretende estender o processo de digitalização, que acabou de testar em 10 restaurantes, a mais 100 lojas, até dezembro.
Como enfrentar esses gigantes, com suas ferramentas, recursos e estratégias digitais? É difícil ser otimista sobre o futuro dos pequenos lojistas, seja em alimentação ou em outros segmentos.
Para piorar, os pequenos têm poucos aliados na luta pela atualização dos seus negócios. Os shoppings deveriam, urgentemente, desenvolver programas de apoio aos lojistas locais, independentes e menos estruturados. Ao mesmo tempo, precisam se preparar para a substituição de parte deles, o que parece inevitável.
A gente não quer só comida. Quer também doce, sorvete, cerveja…
Os brasileiros estão gastando mais com comida e bebida fora de casa. No primeiro trimestre do ano, os gastos subiram 34% e a quantidade de produtos consumidos cresceu 14%, em comparação com o mesmo período do ano passado. A quantidade de ocasiões de consumo foi 31% maior.
O canal que registrou o maior aumento de faturamento foi o do fast food (9,7%). Logo em seguida aparece, veja você, a balada (4%), que voltou com tudo.
Os dados são da Kantar, que observou ainda um aumento no consumo de itens de indulgência, como doces, cervejas, refrigerantes e sorvetes.
Não é à toa que a Cacau Show, que tinha 4.274 lojas no final de 2023, estabeleceu a meta de chegar a 4.700 até o final do ano. Na Casa Bauducco, que também está com o pé no acelerador e deve abrir 30 lojas em 2024, as vendas cresceram 30,5% entre janeiro e abril de 2024, puxadas pelo aumento de clientes nas lojas. Em tempo: sabe qual marca que mais abre lojas nos shoppings brasileiros atualmente? É a Milky Moo, com seus milkshakes turbinados.
Esses são apenas alguns exemplos de como o consumo de indulgências vai modificando aos poucos o mix dos shoppings. O estresse da vida moderna, de um lado, favorece a demanda por esses produtos. De outro, eles se encaixam como uma luva na ideia de shopping como local de prazer, complementando a experiência dos clientes.
Bem-estar se une ao tripé gastronomia, entretenimento e serviços
Falamos até agora de fast food, doces e cerveja. Mas existe uma parcela importante da população pensando em saúde.
O mercado de wellness no país faturou, em 2023, cerca de R$ 500 bilhões. Isso significa duas vezes e meia a venda de todos os shoppings brasileiros no ano passado. Nosso país é o 12º maior mercado de bem-estar do mundo, de acordo com o Global Wellness Institute.
Um levantamento do instituto de pesquisa Ponto Map, mostrou ainda que estilo de vida fitness e alimentação de qualidade são assuntos em alta nas discussões que aquecem as redes sociais.
Esses dados confirmam as conclusões de um estudo recente, realizado pela Mosaiclab, empresa de inteligência de mercado da Gouvêa Ecosystem. O Food Compass mostrou que 55% dos brasileiros têm interesse em reduzir consumo de açúcares e gorduras e 80% querem aumentar o consumo de hortaliças, frutas e verduras. Outros 37% pretendem consumir mais bebidas não alcoólicas naturais, como água, suco, água de coco e café.
O tripé formado pelos segmentos de alimentação, serviços e entretenimento ganhou espaço no mix dos shoppings, ocupando áreas de expansão e substituindo operadores que não estavam conseguindo se adequar aos novos tempos. Tudo indica que, daqui para a frente, falaremos não de um trio e sim de um quarteto, incluindo bem-estar nesse time.
Essas foram as novidades do momento. Voltamos daqui 15 dias. Ou a qualquer momento, em edição extraordinária. 😉
Luiz Alberto Marinho é sócio-diretor da Gouvêa Malls.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da MERCADO&CONSUMO.
Imagem: Shutterstock