Estamos vivendo um momento único na história do consumo. De um lado, temos um mundo multigeracional, onde diferentes gerações não apenas coexistem, mas definem juntas as tendências do mercado. De outro, enfrentamos uma multipolarização, com consumidores cada vez mais divididos em suas prioridades, valores e comportamentos. Mas é justamente nesse cenário de contrastes que surge algo fascinante: a conexão entre opostos. Marcas que conseguem unir, por exemplo, tradição e inovação, luxo e acessibilidade, digital e físico têm mais condições de liderar o jogo. O varejo está passando por uma profunda transformação, impulsionada pelas mudanças nos comportamentos dos consumidores.
Com a evolução tecnológica e a busca constante por conveniência, as marcas precisam se reinventar para atender a um público cada vez mais exigente e diversificado. A NRF 2025 trouxe insights valiosos sobre esse cenário, destacando que as conexões humanas, a personalização e a experiência do cliente são os pilares fundamentais para o futuro do setor.
O consumo deixou de ser apenas transacional para se tornar emocional, um reflexo direto da busca por identificação, propósito e bem-estar. A “epidemia da solidão”, apontada pela Gallup, e a valorização do brincar como ferramenta de equilíbrio emocional, conforme estudos da WGSN, reforçam essa mudança de perspectiva. Emoções impulsionam decisões de compra e criam laços mais profundos entre consumidores e marcas.
As principais tendências para o varejo
Destacamos 5 importantes movimentos que devem ter maior força nos próximos anos:
Hiperconveniência
O tempo tornou-se um dos ativos mais valiosos dos dias atuais. Com rotinas cada vez mais aceleradas, os consumidores buscam agilidade e eficiência nas compras. Modelos como o Just Walk Out, da Amazon Go, que elimina fricções nas filas e nos pagamentos tradicionais, exemplificam como a tecnologia pode simplificar o processo de compra. No entanto, a hiperconveniência não se limita apenas à rapidez, mas também envolve acessibilidade, otimização de entregas e múltiplos canais de interação com a marca.
O fenômeno da fadiga de decisão, apontado pela WGSN, evidencia a necessidade de uma curadoria mais assertiva, reduzindo a sobrecarga de informações e opções disponíveis. O CEO da C&A Brasil, Paulo Correa, destacou na NRF as iniciativas bem-sucedidas da empresa nessa frente, impulsionadas pelo uso da Inteligência Artificial. Os consumidores não querem um excesso de escolhas, mas sim uma experiência personalizada que antecipe suas preferências.
Hiperpersonalização
A personalização de produtos, serviços e experiências se tornou essencial para a diferenciação competitiva. O paradoxo atual reside no equilíbrio entre automação e toque humano – enquanto a tecnologia proporciona escalabilidade, a intervenção humana garante autenticidade e refinamento dos algoritmos.
Marcas como a Aston Martin, que traz uma experiência de alfaiataria sob medida na criação de carros únicos, e a F.A.O Schwarz, que de forma lúdica e acessível permite que clientes criem brinquedos personalizados, demonstram como a customização pode levar o cliente para uma jornada única e de valor inestimável.
O futuro do varejo tende a se afastar das opções genéricas, buscando oferecer experiências cada vez mais personalizadas e alinhadas às expectativas dos consumidores.
Experiências imersivas
Transformar o ambiente da marca, seja físico ou digital, em um espaço que desperte os sentidos é essencial para criar conexões emocionais e proporcionar entretenimento. Os consumidores modernos não buscam apenas produtos, mas experiências memoráveis que agreguem valor à jornada de compra.
A pesquisa “Consumidor do Amanhã”, divulgada pela Mosaiclab no Latam Retail Show, destaca a tendência taste the runway, que aponta a fusão entre moda e gastronomia como uma poderosa ferramenta de experiência de marca. Exemplos como The Blue Box Café, da Tiffany, Le Café Louis Vuitton e a Gucci Osteria demonstram como a integração de novos formatos pode fortalecer o relacionamento com o consumidor.
A Coach, por sua vez, apresentou na NRF suas apostas em experiências inovadoras, como cafés, beach clubs e pop-ups inusitadas, incluindo um avião desativado e um passeio de balão dentro de uma bolsa gigante. Essas estratégias reforçam o potencial do varejo experiencial na construção de uma identidade de marca forte e envolvente.
Sustentabilidade e economia circular
A emergência climática colocou a sustentabilidade no topo da agenda global, acima de qualquer governo ou opinião partidária. Cada vez mais, consumidores exigem transparência e compromisso real das marcas em relação ao impacto ambiental e social. Modelos de negócios baseados no reaproveitamento de materiais e no reúso estão conquistando maior adesão e credibilidade.
A economia circular, em especial, vem ganhando tração, e o case da marca Rent the Runway trouxe aspectos importantes sobre esse modelo de negócio. A CEO da empresa, Jennifer Hyman, defende o conceito de “roupas como um ativo financeiro”, no qual a decisão de compra pode ser influenciada pela revenda futura da peça – uma lógica similar à compra de automóveis. Além disso, a plataforma, que já funciona há 15 anos nos EUA, tem se consolidado como um importante canal de abertura de novos clientes para as marcas premium e de luxo.
Economia do bem-estar
O mercado de wellness está em ascensão, movimentando trilhões de dólares globalmente. No Brasil, essa tendência já representa um setor significativo, com consumidores buscando produtos e serviços que promovam saúde, equilíbrio e bem-estar.
Outros movimentos que refletem essa mudança de comportamento incluem a redução do número de casas noturnas no mundo e a menor adesão das novas gerações ao consumo de bebidas alcoólicas. A plataforma Strava, que reúne mais de 135 milhões de usuários em 190 países, publicou no seu report de dezembro de 2024 uma constatação de que os run clubs são os novos night clubs.
É no senso de comunidade, de estar próximo de pessoas com os mesmos valores, preferências e propósitos, que essa tendência se potencializa para o consumo.
Marcas que incorporam essa perspectiva em suas estratégias, seja por meio de produtos funcionais, iniciativas de autocuidado ou ambientes que favoreçam o bem-estar, conquistam uma vantagem competitiva significativa.
E agora, qual será o seu papel nessa transformação?
Em um mundo em que as distâncias entre gerações e entre marcas e consumidores estão cada vez menores, emergem movimentos que redefinem o papel do varejo na vida das pessoas. Para se destacar nesse cenário dinâmico, não basta apenas seguir tendências – é fundamental conhecer a essência do seu negócio, entender profundamente o seu público e criar estratégias sustentáveis de diferenciação.
A combinação entre tecnologia e conexões humanas será o elemento-chave para o sucesso dos negócios no futuro do varejo.
Usando o tema da NRF deste ano, convido à reflexão: Qual será o seu game changer?
Será uma nova experiência para o consumidor? Uma reconfiguração dos canais de venda? O desenvolvimento das pessoas que fazem seu negócio acontecer? O que você fará para não apenas se adaptar, mas para liderar a mudança?
2025 já começou, e o futuro do varejo depende das escolhas que fazemos hoje.
Cecília Rapassi é sócia-diretora da Gouvêa Fashion Business.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
Imagem gerada por IA