Os 8 insights do negócio Nestlé-CRM/Kopenhagen

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O recente negócio envolvendo a Nestlé, com faturamento de US$ 98 bilhões em 2022 e maior corporação global do setor de alimentação, e o grupo CRM, controlador de Kopenhagen, Cacau Brasil e Kop Koffe, já teve muitas análises, mas, pelo seu impacto, merece que seja ainda mais explorado.

São muitos aspectos envolvidos, mas vale destacar alguns deles que merecem reflexões adicionais:

Como destacado pelo CEO Nestlé Brasil, Marcelo Melchior, com essa aquisição, a Nestlé entra no varejo com um “apetite” digno de conglomerado global do setor de alimentação, ao passar a operar as mais de mil lojas das marcas, entre corporativas e franqueadas, físicas e virtuais. 

Talvez a primeira experiência do grupo Nestlé, que pode ter aberto esse “apetite”, tenha sido com a Nespresso, projeto desenvolvido greenfield, que envolveu a transformação do modelo de negócio de café, com o lançamento das cápsulas e todo o processo de venda de máquinas e equipamentos em canais físicos e digitais, próprios e de terceiros. As vendas diretas de cápsulas pelos diversos canais da Nespresso, incluindo seu clube de relacionamento, representam mais do que 50% das vendas desse produto;

Importante que uma outra iniciativa precursora e nessa mesma direção pela Nestlé envolveu a compra do controle da rede de cafeterias Blue Bottle, em 2017, nos Estados Unidos, com modesto crescimento no período, somando um total de 100 lojas no momento, além do e-commerce.

Também interessante lembrar que desde 2018 a Nestlé se tornou distribuidora dos cafés Starbucks nos canais tradicionais de varejo, mas as icônicas lojas Starbucks Reserve seguem sob controle da própria Starbucks

É um movimento similar em muitos aspectos ao da JBS, outro conglomerado global de origem brasileira do setor de alimentação, com sua operação Swift hoje com mais de 600 unidades entre lojas próprias exclusivas, lojas dentro de supermercados e outros canais de vendas diretas, físicas e virtuais, porém tudo sob controle corporativo;

Os múltiplos de Ebtida envolvidos na negociação, se confirmados os números anunciados, entre 15 e 18 vezes, são surpreendentes, méritos do Grupo CRM, alavancando receitas e resultados desde que teve seu controle adquirido pela Advent e o trabalho coordenado pela CEO, Renata Moraes Vichi, que deverá permanecer à frente do negócio, também como acionista e agora sob controle da Nestlé.

Outra leitura interessante é a redução da exposição da Advent no setor de varejo e o avanço do conglomerado suíço, incorporando mais negócios no setor de chocolates ao seu portfólio, três meses após o Cade ter aprovado a aquisição da Garoto, depois de 21 anos de análise e julgamento

Na continuidade da escalada relevante de crescimento e expansão da CRM/Kopenhagen, com a proposta de triplicar o número de unidades, o maior desafio deverá ser o convívio da cultura empreendedora, ágil e pragmática que a trouxe até aqui com tudo que envolve essa atuação dentro de uma corporação global, com regras, conceitos, práticas e cultura próprios. 

A manutenção da liderança, com participação acionária, que a trouxe até aqui é, sem dúvida, um ponto de partida importante, mas não se pode minimizar os desafios que envolverão a integração ou convívio com uma outra cultura muito distinta em vários aspectos.

Ressalte-se que a Nestlé Brasil já vinha num processo acelerado de transformação em muitos aspectos, liderada pelo atual CEO, Marcelo Melchor, o que pode e deverá facilitar todo esse processo. Mas não se deve subestimar os potenciais desafios.

Outro aspecto relevante que deve ser considerado é o potencial do setor de chocolates, pois os números do setor em termos de crescimento têm sido expressivos. 

No ano passado, o crescimento de volume físico foi de 8,3%, em relação ao ano anterior, número que evoluiu ainda mais neste ano. O brasileiro, pelos dados da Abicab, consumiu 3,6 quilos de chocolate em 2022, uma expansão sobre os 3,2 quilos do ano anterior. 

Mas é importante lembrar que em alguns países europeus, maiores consumidores mundiais, por questões econômicas, geográficas e sazonais, esse consumo supera os 8 quilos por ano.

E o potencial do varejo de chocolates no Brasil pode também ser avaliado pelo crescimento da Cacau Show, maior rede franqueada de pontos de venda de chocolates, com mais de 4.000 unidades, em forte expansão, com seus diferentes formatos e mais o e-commerce.

A Nestlé já opera um número significativo de marcas no setor de cafés, com Nespresso, Nescafé, Dolce Gusto, Starbucks, em canais próprios ou revendas, em ambiente físico ou digital e poderá aportar esse conhecimento somando Kopenhagen e Brasil Cacau no setor de chocolates. 

Mas deverá ser um interessante aprendizado a incorporação do modelo de negócios franquia, além de importante pelo potencial de expansão e crescimento que esse modelo tem, especialmente no Brasil pelas nossas peculiaridades tributárias, operacionais, logísticas e de mercado, integrando o ambiente físico e virtual.

O ciclo da evolução do controle no caso CRM/Kopenhagen, da família fundadora, Goldfinger Kopenhagen, ao investidor individual, Celso Ricardo de Moraes, ao investidor financeiro, Advent, e depois para o investimento estratégico de uma corporação global, a Nestlé, mostra um processo quase natural que, cada vez mais, deveremos assistir. 

No presente caso teve o mérito de alcançar um resultado surpreendente, no momento morno de comportamento dos mercados financeiro e de consumo. E só reafirma os méritos dos que visualizaram, desenvolveram, geriram e se envolveram com todo o processo.

O Brasil é um dos grandes produtores mundiais de café e Nestlé é um dos players dominantes do setor no mundo. E tem investido para ampliar sua dominância. 

Mas o Brasil é também um dos maiores produtores e exportadores de cacau do mundo. Com a incorporação da CRM/Kopenhagen, com suas marcas, produtos, modelo de negócio em diferentes canais, pode ser considerada uma oportunidade interessante para, após a aceleração da expansão no mercado interno, considerar sua exportação para outros mercados.

Um negócio desse porte, com os múltiplos divulgados, mas ainda não confirmados, pela maior corporação global de alimentos do mundo, num setor não essencial é um atestado relevante do potencial do mercado brasileiro, apesar do ceticismo de parte do setor empresarial com o momento brasileiro.

O ceticismo atual tem explicação lógica para existir, mas é inegável que o potencial do consumo e do varejo do país estão e estarão em crescimento pelos próximos anos por todos aqueles elementos já conhecidos.  

Nota: Nestlé, JBS e Swift estarão no Latam Retail Show. Esses novos e importantes elementos que impactam a transformação do varejo e do consumo também serão apresentados e debatidos com 225 palestrantes para os mais diferentes canais, categorias, formatos e modelos de negócios do varejo e do consumo no Latam Retail Show e mais as 10 pesquisas e estudos inéditos que serão apresentados e que têm como tema central “Back to the Future”, de 19 a 21 de setembro, em São Paulo. Conheça mais clicando aqui.

Marcos Gouvêa de Souza é fundador e diretor-geral da Gouvêa Ecosystem e publisher da plataforma Mercado&Consumo.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.

Imagem: Shutterstock

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