O isolamento social imposto pela pandemia, com fechamento de boa parte das lojas físicas e o e-commerce ainda pequeno, derrubou as vendas no varejo e fez o estoque encalhado no comércio e na indústria dar um salto.
Em abril, a fatia de indústrias e varejistas com volumes excessivos de estoque atingiu 24,9% e 20%, respectivamente. São níveis próximos de recordes históricos atingidos em outros períodos de recessão, aponta estudo do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre/FGV).
“Com uma parcela muito elevada de empresas com estoques indesejados fica difícil saber quando as coisas voltarão à normalidade, mesmo que haja flexibilização do isolamento social”, afirma o economista responsável pelo estudo, Rodopho Tobler. O estudo, obtido com exclusividade pelo Estadão, consultou 1.900 empresas da indústria e do comércio.
A freada provocada pela pandemia pegou em cheio os fabricantes e os varejistas de veículos, eletrônicos e móveis. Nas fábricas, o encalhe desses produtos se aproximou a níveis atingidos na época da crise do subprime, nos anos 2008 e 2009. Como esses são itens de alto valor e não estão na lista de artigos de primeira necessidade, o consumidor parou de comprá-los. Esse movimento ganhou força por conta do medo do desemprego e da perda de renda, explica Tobler.
De março para abril, o primeiro mês completo de quarentena, a fatia das montadoras de veículos que informou ter estoques excessivos saltou 1,5% para 41,2%. “O resultado de abril foi praticamente o mesmo alcançado na crise de 2008”, observa o economista. Em dezembro daquele ano, 42,5% dos fabricantes de veículos tinham produtos encalhados.
Na indústria de eletroeletrônicos e informática o quadro foi ainda pior. O resultado de abril superou o atingido na crise do subprime. Em março, 6,2% das fabricantes informaram acumular estoques excessivos. Em abril, essa marca tinha subido para 38,5% e ultrapassado a alcançada em janeiro de 2009, de 24,9%.
Sem escoamento
“Subiram os estoques na indústria, porque não está havendo escoamento da produção”, afirma José Jorge do Nascimento, presidente da Eletros, que reúne os fabricantes de eletroeletrônicos. Ele não tem dados do tamanho de encalhe nas fábricas do setor. Mas relatos de associados dizem que o volume de produtos nos depósitos das indústrias cresceu.
Logo quando foi decretado o isolamento social em grandes centros consumidores, muitas carretas estavam transportando produtos das fábricas para os centros de distribuição das lojas.
“Mas quando chegaram lá não puderam descarregar e tiveram de voltar”, conta Nascimento. O passo seguinte foi se ajustar à nova realidade. Deram férias coletivas, usaram banco de horas, entre outras formas de cortar a produção. Segundo ele, grandes redes de varejo pararam ou diminuíram as compras, prorrogaram pagamentos e renegociaram os preços.
Esse movimento se refletiu no avanço dos estoques no comércio, concentrado nos bens duráveis. No mês passado, estudo da FGV aponta que 30% das varejistas informaram que estavam com volumes excessivos desses produtos, quase o dobro do registrado em março (16,5%) e muito próximo do recorde histórico de 31% atingido em outubro de 2015.
A situação mais crítica ocorreu nas lojas de eletroeletrônicos e móveis. Nesse segmento, a fatia de empresas super estocadas mais que dobrou de março para abril, de 12,1% para 27,4%.
Além dos eletroeletrônicos e móveis, o varejo de veículos, motos e peças é outro setor onde o encalhe de produtos é grande.
De março para abril, a parcela de empresas com estoques excessivos quase dobrou, de 18% para 33,5%, mostra a pesquisa. A sobra de produtos é reflexo da queda 66% nas vendas no mesmo período. No mês passado, foram comercializados apenas 55,7 mil veículos novos no varejo, o pior mês para as concessionárias em mais de 21 anos.
Com os pátios cheios, as duas lojas do Grupo Amazon, revenda da Volkswagen, estão fechadas e as vendas são apenas remotas. Marcos Leite, gerente de vendas, conta que o volume de negócios caiu 85% ante um mês normal.
“Conseguimos fazer algumas vendas pautadas pelas promoções”, diz. Entre elas, estão a carência de um ano para começar a pagar o financiamento e também a troca com troco. Neste caso, o objetivo, além de vender, é dar um fôlego para quem perdeu renda.
Com informações do jornal O Estado de SP.
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