Por Marcos Gouvêa de Souza*
A história é real e ilustrativa. Como marcas globais investem em produtos, design, inovação, comunicação, experiência, lojas e serviços e, apesar de tudo, perdem clientes pelo mais sensível de todos os elementos que envolvem essa cadeia: o ser humano.
O Cooper, com seus minis, hoje controlada pela BMW, é meio sonho de consumo de muita gente por seu design diferenciado, motor potente e estilo marcante. E também foi para mim.
Numa viagem a San Barth (Caribe) tive a oportunidade de alugar um e fiquei impressionado e inspirado para manter o clima da viagem, como se isso fosse possível, de volta a São Paulo. Numa primeira oportunidade em que me dei o direito de alguma forma de auto-gratificação (literalmente), acabei comprando um modelo S com todos os charmes que a marca propõe, com sua pintura diferenciada, porém na medida adequada que a minha idade impõe. Ou seja, ousada pero no mucho.
Os primeiros tempos foram de pura emoção proporcionada pela potência do carrinho, seu estilo e suspensão, que mais lembram o de um kart do que um carro para a cidade. Mas vai lá, tudo era parte do pacote da proposta esportiva e quase radical.
As coisas começaram a complicar quando a moderna tecnologia embarcada e de ponta fez acender uma luz no painel indicando problemas com pneus. O manual indicava algum problema que poderia ser de pressão dos mesmos. Calibrados e re-calibrados a luz continuava lá.
A solução foi a autorizada, das mais tradicionais, onde tínhamos comprado. E aí começou o processo de destruição das propostas da marca.
O primeiro diagnóstico indicou desalinhamento das rodas e um prego numa das rodas que, na recomendação do representante da autorizada, exigia trocar o pneu!!! Discutido o assunto e mostrada nossa insatisfação, mudou o diagnóstico o que mostrou claramente a insegurança, ou despreparo, dos funcionários envolvidos.
Como havia também problema com uma palheta de limpeza do parabrisa que, com menos de mil quilômetros já apresentava desgaste, e inconformado com o preço do alinhamento e o diagnóstico de troca do pneu, autorizamos, apenas a troca da tal palheta.
Mandamos fazer o alinhamento e o conserto do pneu numa rede especializada. E pode ser que estejamos correndo perigo de morte por não termos feito a troca do pneu! Logicamente a tal luz permaneceu, pois somente uma autorizada poderia rever e corrigir o sinal de alerta.
Tivemos oportunidade de mostrar nossa insatisfação com o atendimento diretamente à diretoria da autorizada e as explicações, gentis e rápidas, definitivamente não convenceram, especialmente porque o diagnóstico havia mudado duas vezes quando o contestamos.
Como já estava no momento da revisão de mil quilômetros, enviamos para outra autorizada, na esperança de outro padrão de serviço.
Além da revisão prevista, o orçamento apresentado propunha novo alinhamento das rodas, limpeza dos filtro de ar, reparo e pintura das rodas que estariam raspadas e mais alguns itens, incluindo Oxi-sanitização e Tuffu Stuff. Pelo nome do procedimento foi fácil imaginar o sentimento. Em tese, esse nome complexo envolvia limpeza do carro e dos bancos. Tudo no pacote da revisão dos mil quilômetros e tendo o carro passado pelo alinhamento de rodas menos de um mês antes!
Autorizamos apenas os itens-padrão da revisão de mil quilômetros e a luz voltou apagada, mágica da moderna tecnologia global embarcada, sem que tivesse sido trocado o pneu ou feito novo alinhamento de rodas!
Ficam algumas conclusões, talvez até precipitadas, mas óbvias:
De forma geral e com raríssimas exceções, o padrão de serviços e atendimento das oficinas autorizadas está muito aquém, quando não conflitante, com os propostas de valor das marcas de veículos que investem muito para criar uma imagem que é destruída, pouco a pouco, a cada contato pessoal. E cada um que lembre as suas próprias experiências;
Se piscar, cada ida a uma loja de rede de serviços autorizada terá um significativo sobrepreço, justificado por ações ou manutenções extemporâneas, de nome pomposo e indutivo, justificadas, ao menos em São Paulo, pelo excesso de poluição, desníveis no asfalto ou buracos na rua. Tudo isso verdadeiro, mas chama a atenção o alinhamento do discurso entre revendas de uma mesma marca;
Pessoas preparadas, processos, atenção e atendimento honesto e transparente nas revendas podem ser mais importantes que design, potencia de motor, estilo e propaganda cool para reter clientes e torná-los fãs e advogados da marca, sem o que, como é o caso relatado, se transformam em frustrados usuários;
E por fim, não se iluda. É pouco provável que se consiga manter na vida cotidiana a ilusão de um período de férias no Caribe.
E, à propósito, estou à procura de um novo carro pequeno e fácil de manobrar para usar no trânsito de São Paulo.
E não tem que ser charmoso e cool mas precisa ser honesto nas suas propostas.
*Marcos Gouvêa de Souza (mgsouza@gsmd.com.br) é diretor-geral da GS&MD – Gouvêa de Souza.