Uma das palestras mais impactantes da NRF 2022 foi a do Lee Peterson, da WD Partners. Logo de cara, no início da sua apresentação, ele comparou o varejo com uma supernova. Para quem não sabe, supernova é a explosão de uma estrela, geralmente no fim do seu ciclo de vida, gerando como consequência uma grande quantidade de novas estrelas.
Peterson usou a metáfora da supernova para falar da fragmentação de formatos e canais. Aquilo que chamamos, quase um ano atrás, de “novos territórios do varejo”. Com a multiplicação dos pontos de venda, os consumidores não precisam mais ir até uma loja física para se abastecer de produtos. Podem fazer isso enquanto conferem as redes sociais, assistem a uma live no computador, aguardam uma reunião com o celular na mão ou se divertem com um videogame.
As perguntas logo pipocaram na cabeça de todo mundo: o que estaria explodindo? O varejo como um todo? As lojas físicas? O que explodiu de fato foi a ideia de compras como um lugar. Há pouco tempo, usávamos a expressão “vamos às compras” para definir a intenção de adquirir produtos no varejo. Hoje, ela não faz mais sentido. Compras não é um lugar aonde vamos, mas algo que fazemos, em qualquer tempo e onde estivermos.
Não é à toa que grandes redes investem em vendas por WhatsApp e aparelham suas equipes com aplicativos capazes de acessar listas de clientes, para que possam vender à distância. Hoje, se o consumidor não vem até a loja, a loja vai até o consumidor. É a hora e a vez da venda ativa.
O que isso tem a ver com os shopping centers? Bem, tem tudo a ver, não é mesmo? Afinal, se não precisamos mais ir até uma loja para comprar e se os lojistas vão até os clientes, onde quer que estejam, a função e o valor da loja mudam drasticamente.
Porém, a história pode não ser tão ruim assim. Quer saber por quê? Nem toda compra é igual. Pesquisas que fizemos aqui na Gouvêa Malls mostram que, quando falamos de shopping centers, existem três diferentes tipos de compras: a da necessidade, a da socialização e a do prazer. Compreender isso pode fazer toda a diferença.
A compra por necessidade é aquela que envolve praticidade e agilidade. Neste universo se inserem compras emergenciais e para demandas ou ocasiões inesperadas, como presentes ou roupas, sapatos e acessórios para um evento específico. Habitam este espaço ainda as aquisições do dia a dia. É aqui que o consumidor, em geral, experimenta mais desprazer e, por isso mesmo, onde a conveniência do e-commerce ganha mais força.
Vamos agora falar de socialização. É comum visitarmos uma loja com outras pessoas, como forma de tornar a experiência mais agradável. A compra vira um programa. Mulheres e pessoas mais jovens tendem a ir com amigos, homens geralmente são acompanhados pela família. Entre a garotada, o ato de compartilhar a experiência muitas vezes é feito pelo celular, onde imagens são enviadas e opiniões, recebidas. Ao estimular a compra como forma de socialização, não apenas valorizamos a loja física como reforçamos o mall como espaço de encontros. O social commerce, e mesmo o metaverso, podem ser concorrentes distantes desta modalidade.
Mas é principalmente na compra pelo prazer que se baseiam as visitas aos shoppings. Todas as etapas do processo produzem sensações positivas: olhar, pesquisar, experimentar, escolher, adquirir. Ela traz à tona um amplo universo de emoções e simbolismos, que incluem distração, satisfação, ocupação, alívio do stress, bem-estar, alegria, autoestima, conquista, acesso, poder. Essa é uma manifestação democrática: todas as classes, idades e gêneros sinalizam ter forte relação de prazer naquilo que muitos especialistas chamam de varejoterapia. Essa experiência é, acima de tudo, emocional e sensorial, o que favorece a loja física, quando bem concebida.
Como é possível concluir, de fato não precisamos ir a uma loja para fazer compras. O que não significa que todos vão preferir fazer isso. As lojas dos shopping centers podem oferecer algo que as demais não conseguem igualar: além de suprir necessidades, ainda proporcionam ocasiões sociais e produzem um prazer inigualável. Em resumo, para que sejam relevantes, elas não podem ser iguais a quaisquer outras. Precisam se diferenciar naquilo que os consumidores valorizam e não encontram no digital. E, ao mesmo tempo, devem se tornar mais versáteis, assumindo novos papéis, como mostramos no artigo “Lojas pra que te quero”.
Resumindo: além de ajustar o tenant mix e apoiar os lojistas na evolução de seus negócios, os shoppings precisarão ainda cuidar para que suas lojas sejam diferentes na arquitetura, no atendimento, nos serviços e experiências que oferecem.
As lojas físicas não vão acabar. Talvez as lojas ruins acabem. Por isso, a hora é de trabalhar em favor das ótimas. Porque são elas que vão alicerçar a reinvenção dos shoppings, redefinidos como espaços de prazer, o que incluirá, é claro, comprar coisas fabulosas em lugares incríveis.
Luiz Alberto Marinho é sócio-diretor da Gouvêa Malls.
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