Em mais uma edição, o South by Southwest (SXSW) de 2024 foi um palco vibrante para a discussão de tecnologia, inovação, tendência e criatividade. Como era de se esperar, uma das principais pautas de seus conteúdos foi a Inteligência Artificial (IA), mas através de um prisma não óbvio: o humano. Afinal, essa tecnologia está transformando a forma como nos relacionamos uns com os outros, tanto no negócio como na sociedade. E esse foi um ponto bastante discutido pelos principais palestrantes, destacando até mesmo a importância da personalização na era digital.
A futurista Amy Webb apresentou em seu relatório anual a IA como uma tecnologia transformadora que influencia economias e altera sociedades, deixando claro que vivemos uma nova era, um superciclo (como apresenta Amy), que promete remodelar toda a economia do mundo. Apesar de estarmos num momento em que se discute a necessidade de leis e órgãos reguladores para controlar novas ferramentas e conteúdos criados com IA, este assunto ainda é muito mais sobre a nossa responsabilidade de usar a ferramenta para o bem e, ainda, reforçar nossa humanidade nos relacionamentos com outras pessoas.
Vamos por partes: atualmente, existem algumas tecnologias (ainda não em larga escala) capazes de captar nossas sensações e emoções através do nosso olhar, do dilatar da nossa pupila ou do rastreamento do movimento ocular. Então, se você ficar animado, isso muda o tamanho da sua pupila e a IA pode captar isso, gerando alguma espécie de estímulo específico pra você.
Este é um ponto de grande atenção: até onde não estamos invadindo a privacidade de uma pessoa com isso? Estamos falando de uma reação incontrolável, mas a IA não consegue atingir essa camada do nosso cérebro, parando somente na etapa do “opa, isso chamou atenção? Então bora gerar mais estímulo na mesma linha”. E é quando começam os ads em redes sociais, e-mails de algo que você nem mesmo tinha cogitado procurar… porque a tecnologia entende o que faz parte do seu desejo.
Com o avanço dos wearables (tecnologias vestíveis), esse tipo de cenário tende a aumentar ainda mais. O Apple Vision Pro, por exemplo, mostra na prática a fusão entre tecnologia e personalização. Estes dispositivos estão sendo projetados para ler intenções humanas, interpretando movimentos oculares e reações pupilares antes mesmo de nos tornarmos conscientes de nossos próprios pensamentos.
Isso abre um novo horizonte para a personalização de experiências, em que a tecnologia se antecipa não para responder à sua necessidade, mas para tornar praticamente impossível resistir à sugestão que virá em seguida. Essa já é a proposta do novo Galaxy S24, que está um pouco mais próximo da realidade dos consumidores brasileiros e incorpora a IA, estreitando ainda mais a omnicanalidade, ultrapassando mais uma camada de acesso aos consumidores.
Embora seja um tema extremamente importante a ser discutido, tomando inclusive bastante tempo da agenda do SXSW, o foco deste artigo não é falar sobre regulamentações e leis, mas sim da personalização por meio de tecnologias, atuais ou novas, que podem ser trabalhadas para gerar experiências mais singulares.
Esta capacidade está diretamente ligada ao verdadeiro propósito tecnológico para a sociedade e, automaticamente, para os negócios. Com tanta tecnologia, passamos, de fato, a entender que tudo não passa de um meio para o cumprimento de um objetivo fim: estreitar as relações humanas.
Quando pensamos em mercado de consumo, todos sabemos que a personalização de experiências em uma era de muitas ofertas é um caminho inevitável para a diferenciação frente aos concorrentes. Esse é o objetivo-fim. E é aqui que entra o meio, ou seja, a IA treinada para possibilitar ao humano inúmeras formas de proporcionar uma experiência one a one.
John Maeda, executivo da Microsoft, abriu seu discurso com um paralelo claro que mostra o nível de personalização que uma IA pode chegar, ao afirmar que a tecnologia hoje é capaz de criar um algoritmo capaz de vencer todo mestre enxadrista, mas não é capaz de criar um match perfeito entre duas pessoas.
Por mais avançadas que sejam as ferramentas como ChatGPT e Midjourney, o comportamento humano, incluindo o processo de tomada de decisões, é complexo demais para ser hackeado. Ao aterrissar esse paralelo com o mercado de consumo, podemos afirmar que o match que desejamos é entre uma pessoa e uma oportunidade – quase um 0 e 1 da programação.
Para a IA, resta apenas aperfeiçoar o mapeamento das informações de bancos de dados e perfis para proporcionar a mais alta personalização e melhor experiência ao consumidor, como também afirma o executivo da OpenAI, Peter Deng. A personalização das experiências já acontece por meio da IA em chatbot, em uma rede social, em um e-commerce. A tendência é que isso deva se tornar cada vez mais normal e natural com os avanços, para que a tecnologia possa desbravar um pouco mais do cérebro humano.
O SXSW 2024 reforçou a ideia de que a tecnologia deve servir para enriquecer a experiência humana, não a substituir. A personalização por meio da tecnologia é uma ferramenta poderosa para criar experiências mais ricas e relações mais profundas, garantindo que ela complemente e amplie a nossa capacidade de interagir e sentir em um mundo cada vez mais conectado e personalizado.
Você está pronto para assumir o seu papel nesse processo de humanização das relações? Toda a humanidade só tem a ganhar.
*Rodolfo Brizoti é sócio e head de Criação, Planejamento e Content da EAÍ?! Content Experience.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
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