Por Marcos Gouvêa de Souza*
Nos últimos 15 anos, o Brasil viveu em lua de mel com o crescimento e a bonança e a liderança empresarial delegou ao Governo e ao Congresso a responsabilidade de cuidar do País. E o que estamos vivendo é o resultado dessa delegação. Nós também somos responsáveis pelo que temos assistido e vivido.
O pensar estratégico e de longo prazo é um dever inalienável de todos que têm responsabilidade para com o País e não é algo que possa ser delegado, ou postergado, enquanto se cresce e se aproveita o vento a favor. E foi exatamente isso que as lideranças empresariais fizeram, anestesiadas pelas oportunidades que eram geradas e que deveriam ter sido aproveitadas.
Transferimos integralmente o pensamento estratégico e a construção de um futuro para o Brasil a governos e ao Congresso que, por sua vez, se comprometiam com o aumento da renda, a expansão do crédito, a melhoria do consumo e o crescimento econômico. Poucas – muito poucas – foram as vozes que se levantaram para alguma forma de alerta de que estávamos entorpecidos e anestesiados com o presente e descuidando do futuro.
Pior do que isso: esse modelo, indiretamente, significava manter o País vivendo a euforia viciante do momento e sem tempo ou foco para pensar o futuro. O resultado é o que aí está.
A pulverização e fragmentação da liderança empresarial foi também efeito colateral do processo anestésico desse período.
Multiplicaram-se entidades, associações e grupos que diversificaram pautas e interesses, todos eles focados nas benesses de curto prazo e muito pouco preocupados com o que o País fazia com todos os bônus, entre eles o demográfico e a conjugação virtuosa global que o Brasil acessava.
Em nenhum momento se discutiu a integração das lideranças empresariais para coordenar e ordenar um esforço conjunto em prol de um projeto de Brasil.
Não temos, e nunca tivemos, algo similar no País a uma Keindanren, entidade criada em 1946, no Japão, após o fim da guerra que, por sua vez, se integrou com outras em seguida e hoje é conhecida como a Federação das Organizações Econômicas do Japão. Ela reúne as mais importantes associações, empresas e organizações dos diversos sistemas produtivos daquele país, numa só voz que possa negociar de igual com o próprio governo japonês, e sempre focada na visão do que é melhor para o Brasil no longo prazo.
Governos, presidentes, partidos, ministros, deputados, senadores e outros correlatos passam. Seus objetivos e visões nem sempre têm a ver com o que é melhor para o Brasil no longo prazo. Ao contrário. O momento é particularmente pródigo em mostrar o quanto a mesquinhez do curto prazo é dominante quando o assunto é poder.
O verdadeiro poder, aquele que emana da visão do país no futuro e uma proposta para a sociedade, foi convenientemente esquecido, pela omissão empresarial sobre sua responsabilidade nesse processo.
Estamos vivendo nossa guerra nesse momento, com consequências sociais e econômicas logicamente não comparáveis ao efeito devastador que tiveram no Japão na 2ª Guerra Mundial, e talvez fosse a hora de um profundo repensar sobre a inalienável responsabilidade empresarial com um projeto permanente e uma governança competente para o Brasil.
Deveriam as entidades, empresas e lideranças empresariais se debruçarem sobre propostas consistentes, viáveis, profundas, estruturais e ambiciosas para construir um outro País. Mais ético, competitivo globalmente, justo e senhor de seu próprio futuro, porém tudo dosado com o necessário senso de urgência que o momento requer. No ambiente empresarial, todos nós sabemos que responsabilidade não se delega. Especialmente quando se pensa no futuro de uma Nação.
Mas foi isso que foi feito pelo setor empresarial nos últimos anos.
É hora de sairmos da inércia, das reclamações setoriais de curto prazo e assumirmos a responsabilidade que nos cabe na reinvenção do Brasil. São mais de 200 milhões de brasileiros, nossos filhos e descendentes, que esperam isso das lideranças empresariais do País.
*Marcos Gouvêa de Souza (mgsouza@gsmd.com.br) é diretor-geral da GS&MD – Gouvêa de Souza