Uma das habilidades buscadas em um gestor é sua capacidade de pensar estrategicamente. De maneira geral, implica em um planejamento bem executado considerando oportunidades e ameaças para a execução de um plano de negócios.
“Pensar estrategicamente” é uma habilidade muito difundida atualmente e costumeiramente adicionada nos discursos corporativos. No entanto, algumas vezes observamos que de maneira equivocada existe a aplicação incorreta do termo, seja pelo uso inadequado ou pela simples dificuldade de execução.
Em várias situações, quando no desenvolvimento de plataformas de estudos de mercado, tenho perguntado aos meus clientes quais são suas necessidades de negócio ou estratégias para determinada categoria ou produto, com alguma frequência tenho obtido respostas imprecisas ou tenho notado uma grande dificuldade de alguns profissionais ao expressarem qual é a linha condutora do negócio a que se dedicam, ou seja, para onde gostariam de caminhar com o desenvolvimento de seu negócio.
Certamente este também é um tema que tratei no artigo anterior em que discorri a respeito da dificuldade no processo de tomada de decisão. Mas, deixando esta questão de lado, o que fica claro é que apesar de já ter virado um jargão corporativo, o conceito e o correto entendimento da palavra estratégia talvez ainda não esteja tão arraigado nas corporações quanto imaginamos.
Nestas situações em que pergunto a um determinado cliente qual a estratégia do negócio e ele apresenta certa dificuldade de ser assertivo, recorro a perguntas específicas para então finalmente alinhavar suas respostas e devolver a ele o que acabamos de discutir em “formato de estratégia”. A utilização de um roteiro com perguntas estruturadas pode auxiliar profissionais de Inteligência de Mercado a extraírem a fórceps a estratégia do cliente, tais como: “Quanto você pretende crescer este ano?”, “Este crescimento estará pautado em qual formato de loja, hiper/ super mercado ou mercado de vizinhança?”, “Qual marca será o seu foco?”, “Haverá lançamento de produtos para esta marca?”, “Qual será o foco de crescimento da marca: inovação ou trade-up?” e infinitas outras perguntas, dependendo do posicionamento da empresa. Quanto mais específico você for, maior a probabilidade de obter o detalhamento sobre o que você quer saber.
Mas, na contramão desta via estratégica (na realidade, nem tão contramão assim) existe o pensamento tático. Muitas pessoas se vangloriam ao dizerem o quanto são estratégicas e se referem a outras de maneira depreciativa dizendo que “fulano é muito tático”. No entanto, sabemos que uma boa estratégica para ser bem executada necessita de uma boa dose de ações táticas. Imagine que a marca X tem como objetivo ser a líder no segmento em que atua nos próximos 2 anos, adotando a estratégia de promover o trade-up entre os principais consumidores, que serão estimulados a comprarem as variantes mais sofisticadas do portfólio da marca. Inclusive, temos vários exemplos de categorias que vêm sofrendo esta movimentação, como a migração do consumo de sabão líquido para roupas em detrimento ao pó ou a busca pela “salonização” na categoria de produtos para cabelos, ou seja, consumir produtos de massa com a intenção aspiracional de vivenciar a mesma experiência que a obtida no salão de cabelereiro etc.
Pois bem, se o Gerente da Marca X não conseguir aterrissar suas ideias de crescimento baseadas em trade-up em ações táticas, sua estratégia virará uma linda história para contar sobre uma marca que um dia sonhou em ser a preferida entre os consumidores. E mais ainda, se ele não conseguir integrar as áreas operacionais da companhia a executarem de maneira correta a sinalização da marca no ponto de venda ou o melhor posicionamento na gôndola, por exemplo, sua estratégia estará tateando o fracasso.
O que quero dizer é que em face à nova forma de estrutura organizacional que muitas empresas vêm adotando, é muito importante que não ocorra uma cisão entre o estratégico, o tático e o operacional. Profissionais de diferentes níveis hierárquicos devem estar cada vez capacitados para transitar entre estes três mundos, obviamente com diferentes nuances dependendo do cargo que ocupa. É inadmissível que um diretor não saiba pensar estrategicamente bem como um operador de máquinas tenha mais habilidades conceituais que operacionais. Mas não significa que este mesmo diretor não tenha que pensar taticamente para tomar decisões rápidas e tangíveis sobre o negócio que gerencia, bem como que ele entenda o desdobramento de suas estratégias no plano operacional.
Finalmente, o executivo que não conseguir desvencilhar-se das ideias arcaicas do taylorismo e ao mesmo tempo adequar-se aos pré-requisitos básicos para a função que ocupa dentro da organização, estará fadado a virar um contador de histórias sem fatos reais que justifiquem suas ideias, ou na linha oposta, um tarefeiro que atende a uma lista de demandas sempre urgentes, mas não necessariamente prioritárias e importantes. As empresas precisam cada vez mais de planos estruturados e verossímeis e de fatos que comprovem a boa execução dos alicerces estratégicos.
Fernanda Dias (fernanda.dias@gsmd.com.br), responsável pela área de Estudos Regulares da GS&MD – Gouvêa de Souza.