Às vésperas da Páscoa, a Rede colocou o ovo em pé. Com seu movimento de isenção de taxa na antecipação de recebíveis do crédito à vista a partir de maio a empresa, ligada ao Itaú-Unibanco, alterou as condições que envolvem as transações com cartões de crédito no varejo e nos serviços e tomou a iniciativa de alterar de forma profunda, e irreversível, o negócio das credenciadoras.
Até alguns anos atrás esse era um negócio de poucos jogadores, muito concentrado e de resultados impressionantes, medido pela rentabilidade do negócio e pelo retorno sobre ativos e era dominado pelos maiores conglomerados financeiros do país.
Por conta disso – concentração e menor competição – as condições no Brasil para remuneração dos serviços, as taxas praticadas, e mais as regras de desconto eram totalmente desalinhadas com a prática internacional. Ainda que o mercado brasileiro tenha características muito particulares, envolvendo, entre outras, os “planos sem acréscimo”, uma de nossas jabuticabas setoriais.
Era uma questão de tempo para esse desalinhamento começar a acabar.
De um lado pela pressão dos clientes, o varejo de forma geral, os prestadores de serviços e mais todos aqueles que usam cartões para receber pagamentos.
De outro pela alta rentabilidade do passado que atraiu muitos mais players para esse jogo e o tornou mais competitivo.
A disputa binária Rede-Cielo do passado multiplicou-se com a participação de vários outros players como Getnet, SafraPay, PagSeguro, Stone e outras, o que precipitou uma reconfiguração do mercado, diluindo participação e tornando-o mais competitivo, ainda que ainda desalinhado com as práticas internacionais.
O inesperado e estratégico movimento da Rede balançou o setor como um todo, suscitando ações que foram da resposta de mercado do SafraPay à contestação da Stone, além da análise do Cade, através de um “procedimento preparatório de inquérito administrativo”.
Importante lembrar que a ação da Rede, ainda que com restrições na sua abrangência, dá seguimento a um processo que era irreversível de aumento da competitividade no setor e gera benefícios para os varejistas e empresas de serviços que se enquadrem nas condições e, em última análise, o próprio consumidor que indiretamente pagava parte da conta da concentração e das taxas praticadas já que tudo isso tinha que ser embutido no preço dos produtos e serviços.
Um mercado em profunda transformação
A atratividade do setor pode ser medida na movimentação financeira envolvida.
Em outubro do ano passado o IPO da Stone captou US$ 1,5 bi na NASDAQ e atraiu o próprio Alibaba para participar. Em janeiro a PagSeguro havia captado US$ 2,27 bi, que foi considerado a quarta maior da história na área de tecnologia depois de Facebook, Alibaba e Snapchat.
Outro movimento importante foi o investimento em março deste ano de US$ 750 milhões da PayPal no Mercado Livre plataforma que atua no e-commerce e quer expandir sua participação no mercado se posicionando com empresa de soluções financeiras e também pagamento com o Mercado Pago.
Sem dúvida um setor atraente e em profunda e iminente transformação já que a ascensão e participação dos pagamentos móveis, através do celular, certificados ou não com reconhecimento facial, vai trazer disrupção em larga escala, se considerarmos o que já acontece na China, onde essa modalidade de janeiro a outubro do ano passado atingiu perto de US$ 13 trilhões por ano.
Ainda que quaisquer comparações diretas com o mercado chines devam ser cautelosas e precisem considerar as particularidades do país, a eMarketer estima que em 2021, perto de 80% dos pagamentos por lá serão feitos por celular.
Em nossa realidade o movimento envolvendo o crescimento dos pagamentos móveis e mais essa maior concorrência no setor de pagamentos via cartões, reconfigura positivamente o cenário, reduzindo custos operacionais e transacionais, nos aproxima das práticas internacionais e, em última análise torna o mercado mais competitivo, saudável e desenvolvido em benefício dos negócios e dos consumidores. Saudável competição!
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