Seguindo a maioria das estimativas do mercado, o Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central decidiu subir a taxa básica de juros da economia brasileira, a Selic, em 1 ponto porcentual, de 10,75% para 11,75% ao ano.
A alta foi comentada por entidades de classe. Para a Associação Comercial de São Paulo (ACSP), os consumidores sentirão o aumento no bolso no momento em que eles forem às compras. Itens com valores mais elevados como, por exemplo, produtos da linha branca, eletrônicos, móveis, veículos e imóveis ficarão menos acessíveis para grande parcela da população brasileira. O financiamento se tornará algo pouco atrativo para o comprador.
“Os juros ficarão mais altos e o tempo para pagar o financiamento, menor”, explicou Ulisses Ruiz de Gamboa, economista da ACSP. “Além disso, também haverá retração na concessão de crédito por parte dos bancos”, emendou.
A piora das condições de crédito e a menor disponibilidade de financiamento no mercado, somada a uma taxa maior do desemprego e queda no poder aquisitivo das famílias, dificultarão ainda mais a aquisição de produtos como geladeira, fogão, máquina de lavar, TVs, computadores, celulares, carros e imóveis, segundo as previsões da Associação Comercial.
Apesar de tudo isso, a decisão do Copom de elevar a Selic em um ponto percentual está dentro das expectativas da maioria dos analistas de mercado e até diminui a intensidade das elevações anteriores.
“Isso tudo também é consequência da alta dos preços do petróleo e de vários insumos, como consequência da Guerra da Ucrânia”, disse o economista da ACSP. “Infelizmente, a atividade econômica continua mostrando sinais de desaceleração no Brasil”, complementou.
Inflação de oferta
Fernando Valente Pimentel, presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit), a inflação que se verifica no Brasil, neste momento, é de oferta e não de demanda. Portanto, juros tão elevados têm pouco efeito para contê-la. Para isso, taxa teria de ser tão alta, que jogaria a economia na lona. A escalada de preços, no País e no mundo, foi provocada pela pandemia, agravada pela invasão da Rússia à Ucrânia e pelo excesso de liquidez estabelecido globalmente no combate aos efeitos do novo coronavírus.
“Ocorrem majorações elevadíssimas do petróleo, minério de ferro, carvão e commodities agrícolas, como o trigo, que se refletem na retração do consumo, objetivo, portanto, redundante da elevação dos juros. Este remédio, além de não ser a melhor alternativa para o caso, pode acabar matando o paciente se a dose for exagerada”, alerta Pimentel. Por isso, seria razoável analisar um pouco mais o cenário antes de promover qualquer novo aumento na taxa básica de juros. “Até porque o impacto é grande também no spread bancário, que já subiu, onerando demasiadamente o crédito, seja para consumo ou investimentos.”
O presidente da Abit lembra que o Copom, antecipando-se ao que ocorreu na maioria dos países, vem promovendo há meses uma acelerada e aguda alta da Selic. De 2% ao ano, a taxa já ultrapassou a 10% e o mercado já fala em algo maior do que 12%. Muito aquém disso, o Banco Central dos Estados Unidos deverá anunciar aumento dos juros esta semana e o europeu reportou a redução de estímulos.
“Cabe reconhecer que nosso Banco Central, assim como se vê em todas as nações, enfrenta um dilema para reequilibrar a economia depois de um desbalanceamento provocado pela Covid-19 e, agora, por uma guerra. É uma situação na qual existe linha muito tênue entre o que fazer em termos de política monetária face a circunstâncias que fogem ao controle das autoridades da área. Afinal, estamos vivendo uma situação de forte disrupção”, afirma Pimentel. Algo, porém, é inequívoco: “Como percebemos na indústria têxtil e de confecção, a demanda, no Brasil não está forte.”
Ante tantas pressões, um novo aumento dos juros, mesmo com o IPCA de fevereiro ultrapassando 1%, não é a melhor forma de conter o processo inflacionário. “A economia já está andando de lado na ponta do consumo, como consequência da escalada dos preços. É preciso considerar que a Selic mais elevada também pressiona as contas públicas, criando um círculo vicioso. Por tudo isso, entendemos não haver necessidade de uma nova subida da taxa”, conclui o presidente da Abit.
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