Não tem acordo. O futuro do varejo passa pela crescente incorporação de serviços à oferta de produtos criando soluções que venham ao encontro da demanda emergente de omniconsumidores que cada vez têm mais de tudo, menos tempo. E usam de forma crescente os canais digitais, permanente pressionadores de rentabilidade, para buscar os produtos básicos que necessitam.
A equação dessa combinação de fatores é relativamente simples e lógica, porém, necessita profunda transformação estratégica, operacional e, especialmente, cultural.
Historicamente o negócio de varejo sempre envolveu comprar e vender produtos. Ao longo do tempo, serviços foram usados para diferenciar, agregar valor, atender demandas emergentes, criar novas oportunidades de faturamento ou reforçar o posicionamento.
Nesse contexto, foram identificadas oito ondas de serviços no varejo que, ao longo do tempo, foram sendo incorporadas, não necessariamente de forma sequencial, na oferta em diferentes modelos de negócios.
A transformação envolvendo o setor de alimentos, aquele que responde pela maior parcela dos gastos dos consumidores, em especial em economias em desenvolvimento, é o mais relevante exemplo da transformação do mercado e da necessidade de incorporarmos uma visão muito mais estratégica nas discussões que envolvem Serviços e Soluções.
Uma transformação estrutural no mercado de alimentos
Nas economias mais desenvolvidas, os alimentos consumidos que são preparados fora do lar respondem por parcela crescente dos dispêndios com essa categoria. E isso é irreversível à medida que os mercados amadurecem.
Nos Estados Unidos, o Food Service, que engloba todas as alternativas de alimentos preparados fora do lar, representa perto de 50% de todas as despesas com compras de alimentos. No Brasil, 35%, e é crescente.
A lógica está no fato de que no processo de amadurecimento do comportamento dos consumidores, num cenário de mudança profunda de hábitos determinada pela transformações derivadas de uma sociedade mais conectada e com crescente participação de mulheres e jovens no mercado de trabalho, muito mais tempo é dispendido fora do lar e a alimentação muda de local e de motivação.
Muda de local, pois cada vez é mais consumida em diferentes locais e menos no lar. Muda a motivação, pois tempo mais escasso gera combinação de atividades e o alimentar-se mescla com lazer, entretenimento e relacionamento, criando novas alternativas e demandas.
Por tudo isso, os supermercados, hipermercados e outros formatos tradicionais precisam se re-inventar para incorporar variantes alternativas para atender essa mudança de hábitos, sem o que perderão “share of wallet” não só nos alimentos, mas também em tudo aquilo que podia ser conjugado ou aproveitado nas visitas que aconteciam às lojas.
De certa maneira, foi isso que inspirou as transformações nas lojas mais recentes do Whole Foods, como a aberta em março, em Chicago (EUA), que oferece áreas para relacionamento, trabalho e consumo de alimentos dentro da loja, bar com ampla variedade de tipos de chopps, e um serviço de alimentos preparados “on demand”, onde o consumidor faz seu pedido a partir de um cardápio e os pratos são preparados na hora e disponibilizados para que sejam levados para consumo na própria loja, em casa, no local de trabalho, academia ou onde seja necessário.
É uma transformação estrutural fundamental no setor de alimentos, pressionado de um lado pelas transformações produzidas pelo comércio eletrônico, trazendo mais fornecedores para vender diretamente aos consumidores, envolvendo marketplaces e, de outro, pela mudança de hábitos, fazendo com que sejam mais frequentados operações de fast food, bares, restaurantes, lojas de conveniência ou formatos híbridos de restaurantes e lojas de alimentos, como são as operações do Eataly no mundo todo.
No mundo da moda também o movimento se manifesta
O mundo da moda também vem sendo afetado pela transformação de hábitos de consumidores e pela evolução dos canais digitais, porém de forma diferente.
O crescimento do varejo de valor de moda, envolvendo marcas com operações agressivas como Primark, GAP, H&M, Zara e quase todas do grupo Inditex, Forever 21 e outras mais, têm redesenhado a oferta colocando enorme pressão nos negócios de formatos e conceitos que buscam diferenciação em produto, lojas e marcas, tentando fugir da comoditização.
A possível complementação para além das lojas, dos produtos, do ambiente, dos eventos e da comunicação de forma geral, pode ocorrer através dos serviços, simplesmente como agregação de valor ou como alternativa adicional para geração de receitas e melhor rentabilidade.
Iniciativa interessante é a da Nordstrom, em West Los Angeles, que com a experiência que vem desenvolvendo a partir da aquisição das operações Trunk Club, em loja e e-commerce, lançou um novo conceito de loja sem estoque e apenas com serviços.
A Nordstrom opera mais de 590 lojas em diferentes formatos entre as operações regulares e os “racks” nos Estados Unidos, Porto Rico e Canadá, e é um desses conceitos fortemente ameaçado pelo crescimento do varejo de moda de valor.
Buscando alternativas, comprou há algum tempo a emergente operação do Trunk Club, envolvendo e-commerce e lojas com um sortimento relevante de serviços que vão de produtos sob medida a orientadores pessoais para seus consumidores, buscando alternativas para um mercado cada vez mais competitivo. E usa agora a experiência adquirida para criar novos formatos e conceitos alternativos, menores e mais focados em serviços.