Líderes dos setores de varejo e consumo do mundo se reúnem na NRF 2025 em Nova York, de 12 a 14 de janeiro no que é considerado o mais importante evento global desses setores.
No último ano antes da pandemia em 2019, foram 3400 brasileiros liderando a maior delegação internacional do evento. Neste ano foram 2400 brasileiros e tudo indica que neste próximo encontro o Brasil será mais uma vez a maior delegação internacional no evento.
Tão importante quanto tudo que será apresentado e discutido é contextualizar o que acontece no varejo no mundo e nos Estados Unidos, para que se tenha uma perspectiva correta do processo em transformação e seus potenciais impactos no setor e nos negócios no Brasil.
Em especial às vésperas da posse de Trump para mais um mandato como presidente dos Estados Unidos, no dia 20 de janeiro.
Acompanhem por aqui alguns dos temas que estão no contexto das mais importantes transformações que ocorrem no mundo, na economia, no varejo e no consumo para um melhor entendimento desse processo numa visão mais abrangente e seus potenciais impactos no Brasil.
1 – Elementos globais transformadores da realidade mais ampla
A) Conflitos políticos e militares – internos e externo
Temos um cenário de aumento do número de conflitos entre países no mundo destacando-se Rússia-Ucrania, mas também envolvendo Israel e países árabes precipitados por ações de grupos radicais. Além de outros menores em repercussão.
Para além dos conflitos entre países, temos conflitos internos como se observa na França e Alemanha.
Esse quadro é gerador de um cenário de maior instabilidade afetando confiança e perspectiva dos consumidores e redirecionamento e reduzindo investimentos;
B) Iminente posse Trump – com polarização aprofundada e ampliada e um novo equilíbrio político-econômico no mundo
Na nova gestão presidencial nos EUA existe a real possibilidade de uma ampliação da polarização política, econômica e tecnológica, redividido entre os blocos norte-americano e chinês com inegáveis consequências para o restante do mundo. E essa perspectiva ocorre tanto nas questões que envolvem atitude e comportamento dos omniconsumidores globais, quanto na expansão de negócios intra e entre blocos;
2 – O processo disruptivo de transformação do varejo
A) No epicentro o megaempoderaderado omniconsumidor global
A combinação das questões macroeconômicas globais e microeconômicas locais nos mais importantes mercados mundiais é potencializada pela disseminação do acesso à informação instantânea e explica o protagonismo da orientação para valor no comportamento de consumo.
Os formatos, conceitos, canais e modelos de negócio orientados para valor são os de maior crescimento mesmo em economias, como a norte-americana, que vive forte crescimento em seu PIB per capita.
Esse comportamento é visível nos EUA, vivendo um crescimento econômico relevante, e se torna ainda mais importante em outros mercados como o Brasil, com inflação elevada e crescente, em especial em alimentos.
B) Protagonismo do valor versus experiência e conveniência
O comportamento do varejo norte-americano no período 2000-2022 é pujante em seu desempenho recente favorecido pela rápida recuperação pós-crise da Covid-19 e mostra de forma direta o quanto os formatos e canais mais orientados para valor têm maior expansão. Enquanto outros como luxo perdem vitalidade.
É inegável que em economias asiáticas também com forte expansão nos últimos tempos, conceitos ligados ao luxo têm expansão relevante. Mas quando pensado em escala global, o valor é dominante, em especial quando combinado com conveniência como no canal e-commerce
C) Desglobalização física com aumento de alternativas integradas com locais
Esse processo de instabilidade e dificuldades globais e locais tem gerado um encolhimento das operações físicas próprias das corporações globais de varejo. Por exemplo, a saída do Carrefour da China, Walmart do Brasil e América do Sul e Casino retraindo operações. O fechamento de lojas físicas próprias de marcas é sinalização desse processo.
Em compensação crescem os modelos combinados com empreendedores locais através de franquias, licenciamentos ou outras modalidades, como no caso de Apple, Samsung e muito na moda, buscando reduzir o risco e adaptar mais rapidamente ao comportamento volátil de mercados locais;
D) Metaglobalização virtual
No outro extremo amplia-se de forma irreversível o processo de aumento de participação dos canais digitais de vendas e relacionamento direto ou através de market places.
O produtor do interior da China pode ter seu produto vendido e entregue para um consumidor no interior do Piauí numa velocidade e segurança inimagináveis no passado recente, exponenciando esse processo de metaglobalização do varejo virtual
E) Desintermediação
Esse protagonismo do omniconsumidor global combinado com a ampliação de alternativas digitais provoca um processo acelerado de desintermediação de negócios, trazendo para o ambiente de varejo muitos mais players envolvendo marcas e fabricantes, chegando diretamente no consumidor.
Comunicação, vendas, pagamentos e logística próprios ou combinados, ampliam a competição e pressionam rentabilidade em todos os segmentos e categorias.
Esse processo trouxe para o varejo corporações globais como Nestlé, P&G, Unilever, e a indústria eletroeletrônica (Apple, LG, Midea, Eletrolux), além da própria moda e em muitos setores congestionando ainda mais os segmentos tradicionais de varejo. Em especial porque integram mais serviços e soluções para diferenciar em sua ação direta com os consumidores;
F) Retail as a Service
Temos um processo acelerado de transformação do varejo integrando e migrando para uma nova lógica que pode ser caracterizada como Retail as a Service (RaaS). Essa evolução e perspectiva foi muito bem exposta em artigo na Mercado & Consumo de Eduardo Yamashita.
G) Consolidação e hiperconcorrência
A combinação de todos esses fatores gera um processo marcante envolvendo hiperconcorrência pelo aumento e qualificação dos players no varejo e a consolidação de negócios com novos e relevantes players globais.
Em especial aqueles vindos da Ásia, principalmente China, Coreia e crescendo em participação nos mais diversos mercados do mundo, concorrendo diretamente na forma de ecossistemas como Amazon, Tencent, Alibaba, Shein, Temu e Samsung.
E sem esquecer da dramática transformação precipitada no setor automobilístico pelo crescimento da participação de marcas e grupos de origem asiática e seus modelos de distribuição e negócios;
H) Metafusion como alternativa aos cenários em transformação
Essa dimensão das transformações leva à estratégia do que definimos como Metafusion, evolução natural dos processos tradicionais de M&A, quando corporações e ecossistemas de negócios combinam operações sem fusão para desenvolverem operações em diferentes mercados. O movimento feito por Magalu e Alibaba aqui no Brasil é um exemplo desse processo que estará em natural expansão.
Sobre esse tema pode ser acessado aqui artigo publicado sobre Metafusion.
I) IA como agente de transformação e parte da solução na nova realidade
É em todo esse contexto que a Inteligência Artificial domina o cenário presente e futuro do varejo em suas múltiplas alternativas como elemento de melhoria da eficiência, produtividade e rentabilidade. E ainda em busca de diferenciação da experiência, atratividade e fidelidade dos consumidores.
Por essa razão os temas envolvendo o uso precursor e em alguns casos consolidados da Inteligência Artificial combinada com outros recursos tecnológicos é e será tema predominante em todas as discussões, análises e projeções antes, durante e pós quaisquer eventos ligados a varejo onde quer que ocorram.
Mas não se pode negar que os avanços que temos visto na Ásia sobre uso da IA nos negócios do varejo em alguma medida são até maiores do que vemos no mundo ocidental por conta de maiores e mais rápidas iniciativas e menores restrições ao uso de alternativas para sua aplicação.
O cenário do recente, do presente e futuro próximo no varejo e consumo nos EUA, tema fundamental e dominante da NRF 2025, e as transformações econômicas e agora políticas e seu impacto no consumo e no varejo local e global, serão tema obrigatório nas próximas semanas. E a questão central é como tudo isso poderá impactar negócios, setores, marcas, empresas, categorias, serviços, tecnologia e desempenho no Brasil.
Para além das transformações globais e estruturais, o cenário interno conspira contra um maior foco no que é estratégico e amplo, obrigando a um convívio insano com a incerteza e os desafios locais.
Mais do que a questão e provocação, vale a reflexão de como conviver com essas realidades.
Notas
Se quiser acompanhar gratuitamente o Retail Executive Summit (RES), que será realizado no Tik Tok, em Nova York, no dia 15 de janeiro, no encerramento da NRF 2025. Cadastre-se por aqui!
De 8 a 15 de janeiro de 2025 estaremos em nossa 36ª missão da NRF Retail’s Big Show.
Mais de 3800 líderes, executivos, dirigentes e profissionais dos setores de varejo, consumo, tecnologia e serviços já participaram em nossas delegações para o NRF Show e muitos outros em nossas Trade Missions para Inglaterra, Portugal, Espanha, Itália, México, Canadá, EUA, Israel, China, Coreia, Singapura e Índia.
Para conhecer mais da programação 2025 da NRF Show acesse aqui.
Os aprendizados sobre tudo que será visto e discutido nesta missão, traduzidos, aprofundados e comparados com a realidade brasileira, poderão ser vistos e acompanhados no Retail Trends – Pós NRF, no dia 28 de janeiro de 2025, em São Paulo, nas versões presencial e virtual, e pela cobertura especial que será feita pela plataforma Mercado&Consumo. Conheça mais por aqui.
Marcos Gouvêa de Souza é fundador e diretor-geral da Gouvêa Ecosystem e publisher da plataforma Mercado&Consumo.
*Este texto reproduz a opinião do autor e não reflete necessariamente o posicionamento da Mercado&Consumo.
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