Muitos já tiveram a felicidade de poder contar estórias, se não aos seus filhos, a sobrinhos, afilhados, filhos de amigos, enfim a alguma criança. Estes sabem exatamente o poder mágico que as estórias têm sobre as crianças e a quanta coisa se prestam. Ao mesmo tempo em que acalmam a excitação e prendem a atenção, as estórias também ajudam a transmitir princípios, assim como permitem uma aproximação extremamente íntima e que facilitará todas as negociações que serão necessárias em algum momento do relacionamento com esta criança, amanhã um jovem e depois um adulto.
Pois esta ação tão simples e que já é praticada de forma recorrente há tanto tempo e por tantas pessoas, foi apropriada pelo marketing e conduzida ao universo das marcas e das relações comerciais. O chamado storytelling é um conceito recente e que vai buscar no ato de contar estórias, subsídios para programar estratégias.
O storytelling tem sido usado para fomentar e consolidar ideias desde a simples estrutura de apresentação de uma pesquisa de mercado, por exemplo, até as bases de uma campanha de comunicação com o intuito de prender a atenção e fazer com que aquele brilho mágico do olhar de uma criança que ouve sobre as aventuras de um cavaleiro medieval se reproduza nas faces de quem assiste a uma apresentação ou então de quem é atingido por uma campanha publicitária através de diversas mídias. Muitas campanhas se apoiam neste conceito, como por exemplo, as do Banco Itaú, ou então da Nike e mesmo Coca-Cola.
Da mesma forma esta técnica pode ser usada para passar ou então ajudar a construir o posicionamento de uma marca à medida que você incorpora valores da empresa que gere e desenvolve a marca efetivamente, estruturando uma estória. Algumas empresas adotam esta postura de forma consistente e fortalecem assim suas marcas. No Brasil pode-se citar, por exemplo, a marca Bauducco. No mundo, uma das marcas mais eficientes nesta composição, mesmo porque é o teor do seu próprio negócio, é Disney. A marca por si só já remete a uma estória e aos sonhos a ela acoplados.
O pensamento reflexivo de uma criança que analisa o comportamento dos personagens e com eles forma a sua maneira de lidar com o mundo a partir dos filtros e da maneira com que o contador de estória apresenta cada um, são os mesmos elementos utilizados para a construção de uma marca. Marcas são personagens com suas características próprias, algumas características das categorias a que estão associadas e outras que mostram a sua individualidade e unicidade. Todos os super-heróis são fortes, mas alguns voam enquanto outros não; alguns são elásticos, outros não e assim por diante, porém cada um possui o seu uniforme que o distingue de qualquer outro.
O storytelling também pode ser utilizado para alavancar vendas envolvendo a emoção de uma estória em sua comunicação. Um bom exemplo foi a veiculação da Chrysler durante o último Super Bowl, unindo o beatnik Bob Dylan à cidade de Detroit e exaltando que esta cidade faz carros e que carros fazem a América. Emoção pura para vender automóveis, contando estórias através da narração do próprio superstar rebelde americano.
Contar estórias é algo que fazemos até com certa naturalidade. Alguns precisam apoiar-se na leitura de um livro, enquanto outros criam ao vivo. Alguns contadores narram sagas, enquanto outros contam “causos”. Alguns são mecânicos e sem pontuação, enquanto outros interpretam quase um monólogo de forma teatral. Contar estórias não é difícil, mas exige, no mínimo, alguma técnica, pois se pode pôr tudo a perder se a mensagem não for adequadamente passada.
Uma coisa é verdade: dificilmente alguém se abstém de contar uma estória quando solicitado. Portanto, tenha sempre uma boa estória para contar a fim de encantar seus clientes e consumidores. Cuidado apenas para não fazê-los dormir.
Por Luiz Goes (lgoes@gsmd.com.br), sócio sênior de Inteligência de Mercado da GS&MD – Gouvêa de Souza.